Quarta-feira, 29 de agosto de 2007 - 20h11
São Paulo - Consumidores livres vêem no projeto de Rondônia a salvação para o problema de escassez de energia. O megaprojeto hidrelétrico do rio Madeira poderá ser a solução para grande parte do problema de escassez de energia enfrentado pelas grandes indústrias que atuam no mercado livre, um setor à beira de entrar em colapso por causa da falta de eletricidade disponível nesse ambiente de contratação. Segundo estudo divulgado pela Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), o mercado livre, representado por cerca de 700 empresas, entre elas pesos pesados como Klabin, Votorantim, Aracruz, Goodyear, Gerdau, Vale do Rio Doce e CSN, já enfrenta este ano um "apagão contratual", ou seja, em função da escassez de energia e da disparada nos preços do insumo, algumas companhias não conseguem renovar os seus contratos de longo prazo (acima de cinco anos) com fornecedores (geradoras).
No entanto, apesar das entusiasmo das empresas em relação ao projeto no rio Madeira - cuja primeira usina, a Santo Antônio, será leiloada em 30 de outubro, para entrar em operação em janeiro de 2012 -, os consumidores livres ainda dependem de mudanças nas regras atuais para ter acesso a uma parte dos 3.150 megawatts que serão gerados pela central instalada em Rondônia. Isso porque, até agora, o consumidor livre, que já responde por 25% de toda a energia consumida no País, de cerca de 50 MW médios, tem ficado de fora dos leilões de energia nova. "Uma das grandes distorções do atual modelo é a falta de um ‘vaso comunicante’ entre o ambiente livre e o regulado (mercado cativo), em relação à contratação de energia nova. Atualmente, toda a energia nova é direcionada para o ambiente regulado, uma vez que a metodologia dos leilões determina a venda da eletricidade para as distribuidoras, por 30 anos, no caso das hidrelétricas", afirma Marcelo Parodi, sócio da comercializadora Comerc.
Segundo Parodi, até hoje, consumidores livres não participaram de nenhum leilão de novos empreendimentos, "o que tem causado um "estrangulamento" da oferta de energia para este ambiente". "Uma vez que o consumo de energia dessas companhias é crescente em função do aumento da atividade econômica (o setor industrial demandará 5% a mais de energia este ano), é preciso permitir a estes consumidores acesso a pelo menos uma parcela da energia a ser gerada pelos novos empreendimentos. Caso contrário, o já existente "apagão contratual" vai se agravar, chegando ao extremo da possibilidade de fechamento de empresas, simplesmente pela impossibilidade de contratação de energia", enfatiza Parodi.
De acordo com Patricia Arce, diretora-executiva da Abrace, a associação já propôs aos responsáveis pelo setor elétrico brasileiro - Ministério de Minas e Energia e Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) - a destinação de parte da energia gerada por Santo Antônio para o mercado livre. "Pedimos que sejam feitas mudanças nas cláusulas do edital do leilão da usina do Madeira para que possa ocorrer a participação dos autoprodutores (indústrias)", diz Patricia. Segundo a executiva, o ministério, inclusive, já teria sinalizado que estaria propenso a aceitar a proposta que favorecerá os consumidores livres.
A Comerc acredita que uma alternativa prática para solucionar o problema de falta energia no mercado livre seria permitir a participação desses consumidores nos leilões de novos empreendimentos, inclusive os do Rio Madeira, até o limite da representatividade do segmento em relação ao consumo total do País. "Ou seja, até 25% da energia dos novos empreendimentos poderiam ser disputados por consumidores livres, individualmente ou em consórcio", diz Parodi. A participação dos consumidores livres, continua o empresário, poderia ocorrer de duas formas: como investidores ou como compradores. Na primeira situação, os consumidores fariam parte do consórcio de empresas que participariam do leilão, atuando como investidores na construção da usina, mas assegurando para si um pedaço da energia a ser gerada (até 25%). Na segunda situação, os consumidores atuariam apenas como compradores da energia a ser gerada, nos mesmos moldes contratuais das distribuidoras. "Nesse caso, uma questão a ser alterada é o prazo contratual (30 anos), longo demais para os consumidores livres", diz Parodi, que defende prazos até 15 anos para o setor.
Segundo estudo da Abrace, o déficit contratual de energia dos consumidores livres ligados à associação - que respondem por 75% do consumo no mercado livre - pode chegar a quase 30% até 2012. Ou seja, nesse período, o consumo estimado pelas empresas da Abrace é de 11.955 MW médios, para uma energia contratada (incluindo autoprodução) projetada em 8.453 MW médios - um déficit de 3.502 MW médios. "Caso o apagão de contratos se confirme, teremos início a uma elevação de preços para os grandes consumidores, que desencadeará um série de efeitos nocivos para o País, como a perda de competitividade das plantas industriais", afirma Patricia, em boletim informativo distribuído pela Abrace.
Paulo Mayon, diretor-presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), diz que outra distorção a ser corrigida é a impossibilidade regulatória do consumidor livre vender sua energia excedente - que foi contratada mas não foi utilizada - para terceiros. "O marco legal deveria permitir que o consumidor comercializasse seus excedentes contratuais caso o consumo não se verifique. Essa saída, já possível para as concessionárias que participam do leilão, permitiria também aos consumidores um apetite maior por contratos de energia mais longos", afirma Mayon. "Sabemos que a Aneel já está atenta a esse ponto", diz Padori. (Fonte: Gazeta Mercantil/Denis Cardoso)
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