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Hidrelétricas do Madeira

Porto Velho renasce com usinas do madeira



PORTO VELHO RENASCE COM OBRAS DAS HIDRELÉTRICAS DO COMPLEXO RIO MADEIRA

 
Mais do que qualquer outra cidade brasileira, Porto Velho respira hoje um clima de Olimpíada, tentando usar a construção das usinas hidrelétricas do rio Madeira como motor de um novo ciclo de desenvolvimento e evento transformador de sua concepção urbana.

Enquanto se prepara para receber até 150 mil migrantes ao longo das obras - a população atual é de 384 mil habitantes -, a cidade já vive os sintomas da aceleração do crescimento. Há cinco anos o PIB de Rondônia cresce acima da média nacional.

Estão previstos R$ 571 milhões em investimentos na área industrial, a serem aplicados até 2010. Terras no perímetro de expansão da capital se valorizaram 200% nos últimos 12 meses. Falta cimento para erguer novas casas, e não é para menos: até agosto, a prefeitura emitiu 30% mais alvarás de construção do que no ano passado inteiro.

O início das obras nas usinas é o principal assunto de Porto Velho, não importa a posição de quem faz os comentários. "É um novo marco zero para a cidade", reconhece o sociólogo Luiz Novoa, professor da Universidade Federal de Rondônia (Unir) e atuante opositor da construção das hidrelétricas. "Como a realização de uma Olimpíada, as usinas inauguram outra história na região e podem ter um impacto desestruturante ou reformador, o que só se saberá com o tempo."

Um dos mais evidentes sinais do boom econômico é a construção civil. Empresas como Gafisa, Direcional e JHSF chegaram ao mercado ou estão estudando sua entrada. Elas têm mais de 7 mil unidades habitacionais em obras, voltadas para a classe média (B e C), ou em fase de lançamento. "A cidade está se verticalizando", diz Fernando Casal, ex-presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci).

Um apartamento novo de três quartos está sendo vendido por R$ 280 mil, mesma faixa de preço de imóvel similar em bairros tradicionais de São Paulo, como Pompéia ou Vila Mariana.Porto Velho renasce com usinas do madeira - Gente de Opinião

Em uma cidade cuja coleta de esgoto abrange menos de 3% das residências e em que a água tratada é um serviço desfrutado por apenas metade da população, a prefeitura quer impedir que esse crescimento ocorra de modo ainda mais desordenado.

Para isso, os governos estadual e municipal contam com verbas de R$ 645 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para universalizar o saneamento básico até 2010 e ajudar no processo de reurbanização de Porto Velho.

Paralelamente, dois projetos ambiciosos são tocados pela prefeitura. O primeiro tem como desafio enfrentar o atual caos fundiário do município. Até dois ou três anos atrás, cerca de 95% dos imóveis e terrenos simplesmente não tinham escritura.

A ocupação da cidade se deu em cima da invasão de terras públicas e do loteamento de imensas propriedades dadas de presente pelo Estado ou pela União a mãos privadas, por meio de 9.426 cartas de aforamento - algumas assinadas há muitas décadas.

Essas terras viraram uma espécie de capitania hereditária e a maioria de seus detentores vendeu a terceiros partes dessas propriedades, sem registro legal e gerando um quebra-cabeça fundiário como em nenhum outro município brasileiro.

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Fernanda Kopnakis, secretária de habitação
A Secretaria Municipal de Habitação já conseguiu regularizar a situação de sete bairros inteiros, mas ainda faltam mais de 30 outros para resolver.

Porto Velho se expandiu "de costas" para o rio Madeira. Sem nenhuma ponte, a cidade cresceu só em uma das margens, espremida por duas zonas militares - do Exército e da Aeronáutica, onde fica o aeroporto. Cresceu numa faixa estreita, de poucos quilômetros, de apenas um lado e cada vez mais longe do Madeira, o rio que sempre norteou sua história - com a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (inaugurada em 1912), o auge da borracha (anos 40) e o garimpo (na década de 70). O segundo projeto da prefeitura tem a ver com isso: "virar a cidade pelo avesso" e devolver aos habitantes a visão do rio, de acordo com a secretária de Habitação, Fernanda Kopanakis.

O projeto já começou a sair da gaveta. A um custo de R$ 68 milhões, a prefeitura vai remanejar 1.200 famílias que hoje vivem em favelas de palafitas à beira do rio e igarapés (córregos) ao longo da cidade, em meio a muita pobreza e mau cheiro.

Elas serão transferidas para condomínios de baixa renda, que já estão em construção, ali perto. As primeiras 318 unidades estão quase prontas.

No lugar das palafitas, nascerá um conjunto de três parques, com área total de 650 mil metros quadrados - equivalente a meio Ibirapuera. Os parques, que receberão investimentos de R$ 185 milhões, vão ter quadras poliesportivas, observatório de pássaros e uma lagoa totalmente despoluída. O projeto de paisagismo foi desenhado pela arquiteta Rosa Kliass, conhecida por já ter mudado o cenário urbano de capitais na Amazônia, como Macapá (onde revitalizou a área ao redor da Fortaleza de São José) e Belém (com a reabilitação de toda a faixa portuária da Companhias Docas).

"Não podemos nos comportar como se o Madeira não estivesse beirando a cidade", diz Kopanakis, entusiasmada com a perspectiva de dar nova cara à capital.

Como a maior parte dos moradores não tem escritura do imóvel que habita, poucos pagam IPTU. Mas a arrecadação de impostos deve aumentar com a intensificação da atividade econômica. A massa salarial dos 20 mil trabalhadores que deverão ser contratados para erguer as usinas de Santo Antônio e de Jirau vai chegar a R$ 700 milhões ao longo dos sete anos das obras.

O Estado deve arrecadar R$ 126 milhões em ICMS e a prefeitura, R$ 168 milhões em ISS no período. A receita com royalties pelo funcionamento das hidrelétricas engordará o caixa de cada um em cerca de R$ 50 milhões anuais.

O setor privado tem esperança de que tenha se iniciado um novo ciclo de desenvolvimento, com diversificação da atividade industrial ainda fortemente concentrada no agronegócio, e não vá embora com o fim das obras de Santo Antônio e Jirau.

As usinas trouxeram, a reboque, dois outros grandes investimentos: a Alstom e a Bardella fizeram uma joint venture e vão aplicar R$ 90 milhões em uma fábrica de equipamentos, que recebeu isenção de impostos estaduais e um terreno de 235 mil metros quadrados do governo e a Votorantim investirá R$ 110 milhões em uma unidade que produzirá 750 mil toneladas de cimento por ano a partir de 2009.

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Valdemar Camata Jr., superintendente do Instituto Euvaldo Lodi e assessor econômico da Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (Fiero),
Valdemar Camata Jr., superintendente do Instituto Euvaldo Lodi e assessor econômico da Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (Fiero), acredita que esses investimentos vieram para ficar. Com a inauguração da Rodovia do Pacífico (que ligará a região amazônica à costa peruana) em 2009, a tendência é atrair outras empresas, de olho no mercado andino e até asiático. "As usinas são só uma alavanca econômica para um mercado substancial que deverá focar os países sul-americanos banhados pelo Pacífico", diz Camata. Além disso, ele acrescenta que, saindo do Peru, "qualquer produto está nove dias a menos de navegação da China do que partindo dos portos de Santos ou Paranaguá".

O comércio tenta surfar nas ondas do Madeira. Está marcada para 30 de outubro a inauguração do primeiro shopping center da capital, que terá redes nacionais, como as Lojas Marisa. O supermercado Makro e o hotel Íbis também preparam a abertura de filiais.

A prosperidade de Porto Velho e de Rondônia, no entanto, pode esbarrar em algumas barreiras. A taxa de analfabetismo na população acima de 15 anos chega a 10% e a violência é causa de 24% das mortes no Estado - em nenhuma outra parte do país o número é maior. Há escassez de mão-de-obra. Mas, pelo menos nesse aspecto, a universidade federal planeja mudar o cenário. Até 2010, abrirá 18 cursos - como engenharia elétrica, civil e florestal - e passará dos atuais 7 mil para 15 mil estudantes. Mais do que vagas nas faculdades, aumentaram as expectativas dos alunos. "Os estudantes sabiam que boa parte das chances de sucesso profissional terminava em concursos públicos do Estado. Agora existe um mercado ansioso por absorver essa mão-de-obra e isso enche os alunos de motivação", diz Marco Antônio Teixeira, pró-reitor de planejamento da Unir. Na corrida pelo desenvolvimento, o "sonho olímpico" de Porto Velho despertado pelas usinas, não basta competir: todo mundo busca o ouro.

Fonte: Valor Econômico/Daniel Rittner, de Porto Velho

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