Domingo, 23 de janeiro de 2011 - 20h51
Poucas semanas antes da tragédia na região serrana, Miguel Milano cruzou o Brasil do Sul ao Nordeste, por estradas do interior. Foi de férias. Mas para um engenheiro florestal de 30 anos de carreira, a paisagem não passa despercebida. “Vi uma seqüência de morros pelados, rios sem florestas nas margens, raros remanescentes de florestas extremamente depauperadas”, lista o doutor em ciências florestais e professor da Universidade Federal do Paraná. “A degradação é generalizada”.
Em entrevista ao Greenpeace, Milano fala de como as matas são fundamentais para a proteção dos solos, do clima e da própria população. Principalmente em margens de rios e encostas de morros. “As Áreas de Preservação Permanente (APPs) são uma questão de segurança pública”.
Qual foi o roteiro da sua viagem?
Saí de Curitiba [Paraná], passei por São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais até chegar à Bahia. Foram três dias na ida, três na volta. Rodei pouco mais de cinco mil quilômetros, pegando estradas pelo interior. Na volta, desci pelo interior do Espírito Santo mas tive que voltar pelo litoral, porque em Santa Maria de Jetibá [Espírito Santo] as chuvas já provocavam enchentes com quedas de barreiras, pontes submersas e rodovias bloqueadas.
O que você viu pelo caminho?
Fui de férias. Mas quando você sai de férias e tem 30 anos de experiência e estudo não consegue passar batido por certas coisas. Vi uma seqüência de morros pelados, rios sem florestas nas margens, muita área degradada, raros remanescentes de florestas extremamente depauperadas em fazendas de evidente baixíssima produtividade. Vi morro com tanta erosão que mais parecia bola de sorvete derretendo no sol, e isso ainda antes das chuvas, na viagem de ida. Imagine o que é agora. Onde ainda tem um pouco de floresta, de mata, ela provavelmente vai dar lugar ao gado, como é possível ver em algumas regiões da Bahia. A degradação é generalizada, e tudo resultado do uso errado, além de excessivo, ao longo do tempo. Aquilo tudo é um contrato com a desgraça, senão hoje, amanhã.
Nos municípios da região serrana do Rio onde centenas de pessoas morreram e a produção agrícola foi prejudicada, cerca de 80% da mata nativa já não existe. O que isso tem a ver com os deslizamentos e enchentes?
Tem tudo a ver. Quando chove demais, a falta de vegetação natural, ainda mais em regiões naturalmente instáveis como as encostas de serra, piora tudo e as conseqüências são mais graves. A cobertura florestal dá uma enorme proteção ao solo. Primeiramente interceptando a chuva e reduzindo seu impacto sobre o solo. Depois, reduzindo a velocidade tanto de escoamento superficial quanto de infiltração no solo, isto devido aos diferentes estratos de vegetação viva e também à camadas de folhas e galhos mortos. E por fim, tem as raízes que ajudam a estruturar e segurar o solo e também blocos de rochas em áreas de declives acentuados. A vegetação traz um equilíbrio fantástico.
Nas áreas desmatadas, há muito mais escorrimento superficial, que provoca erosão, assim como um mais rápido encharcamento do solo, que quando saturado tende a deslizar na forma de quedas de barreiras. Isso tudo leva ao assoreamento dos rios, que favorece a ocorrência das enchentes e as perdas que já conhecemos: humanas e materiais. Não tenho dúvidas de que uma avaliação criteriosa na região afetada certamente indicará que as áreas mais atingidas, mesmo que eventualmente com florestas, têm desmatamentos acima, dos lados ou danos severos na base da encosta. Isto sem mencionar que, potencialmente, parte importante do desastre está associado a áreas de preservação permanente de rios não respeitadas. É muito mais difícil esses “acidentes” acontecerem em locais com cobertura vegetal nativa, pelo menos nestas proporções.
Com as mudanças climáticas, a manutenção das florestas nessas áreas torna-se ainda mais necessário?
A tendência das mudanças climáticas é de maior ocorrência de eventos extremos, cheias mais intensas e também mais secas intensas. A combinação entre chuvas mais fortes e áreas desmatadas com certeza vai gerar mais tragédias como essa. O Código Florestal teve a felicidade de criar mecanismos como a Reserva Legal e as Áreas de Preservação Permanente (APP), ímpares no mundo, exigindo a manutenção das florestas. As APPs são uma questão de segurança pública, seja no meio rural ou no meio urbano.
Além da proteção que as matas oferecem ao solo, ainda tem a questão das emissões por desmatamento, os serviços ambientais...
As florestas proporcionam vários fatores de estabilidade para o ambiente como um todo. Uma árvore grande, por exemplo, pode transpirar até 200 ou mesmo 250 litros de água por dia. De onde vem a água? Do solo. E para onde vai? Para a atmosfera. Se começa a haver um desmatamento exagerado, o regime das chuvas é afetado. Se tem árvore, tem transpiração, e isso faz bem para o clima e para a própria agricultura, que precisa de chuva. Os ruralistas que querem mudar o Código Florestal deviam é pagar para manter a floresta de pé e assim manter regimes de chuva minimamente estáveis, que é condição essencial à viabilidade do seu próprio negócio, o agronegócio. Precisamos das florestas para ter estabilidade no ambiente. E a outra questão, da emissão, é mais óbvia ainda. Em pé, as matas capturam e estocam carbono. Derrubadas, não só deixam de prestar este serviço como emitem carbono, alimentando o ciclo das mudanças climáticas.
É necessário mudar o Código Florestal?
Muito antes de pensar em mudar o Código Florestal, penso que a sociedade tem de exigir o seu cumprimento. Não é possível perdoar o passivo ambiental criado por quem não a cumpriu e ainda flexibilizar uma lei que é fundamental para a segurança de todos. Isso não faz sentido no tempo em que estamos vivendo. Além disso, há uma outra questão: a de se apresentar e discutir a proposta de revisão do código florestal como uma questão rural, que não tem nada a ver como o meio urbano. Isso é uma falácia, que só interessa quem quer rasgar a lei. O código florestal, tal como existe hoje, respeitado no meio rural é uma segurança para o meio urbano, onde vivem mais de 80% dos brasileiros, e evitaria muita da tragédia que estamos vivenciando. Dizer o contrário é tentar rasgar e pisar na lei em benefícios de uns poucos, e prejuízo da absoluta maioria da nossa população.
Fonte: Greenpeace
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