Terça-feira, 17 de fevereiro de 2009 - 12h59
O engenheiro mecânico Gerard Moss pegou um avião há um mês em Brasília e partiu para Alta Floresta, no Mato Grosso. Subiu para Porto Velho e Vilhena, em Rondônia, passou pela capital do Mato Grosso, Cuiabá, e dali entrou em Minas via Uberlândia. Seguiu para Londrina, no Paraná e, em São Paulo, sobrevoou Ribeirão Preto e Bauru, esticou até as mineiras Poços de Caldas, Paracatu e Patos de Minas, e chegou ao destino final, Piracicaba. Saiu numa sexta-feira e voltou para casa na segunda. Moss pilotava seu monomotor e se a rota revela um trajeto pouco usual, mais estranha ainda é sua permanência no ar. O aviador voa, literalmente, nas nuvens. Ele persegue correntes de ar carregadas de umidade, os chamados "rios voadores". |
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Este é também o nome do projeto que o ex-empresário montou há dois anos, financiado pela |
O coordenador científico desta turma é um papa no assunto, o agrônomo Enéas Salati, professor de Física e Meteorologia e responsável por ter montado o laboratório do Centro de Energia Nuclear na Agricultura, o Cena, no campus de Piracicaba da Universidade de São Paulo. É ali a base científica que recebe o resultado das peripécias de Moss, algo que, a olhos leigos, parece muita aventura por quase nada: o que ele traz ao laboratório são tubos de uns 40 centímetros com uma pequena gota de água dentro. Para os especialistas, trata-se de um tesouro - é por aí que eles esperam descobrir o "DNA da chuva" brasileira e motivar mais pesquisas e políticas públicas em um tema vital. É um estudo pioneiro - não há nada igual no Brasil e no mundo, diz Salati. |
"Estamos tentando entender, porque não é uma coisa trivial, como é o balanço hídrico no Brasil", diz o professor Salati, que foi o pesquisador responsável pela descrição do ciclo da água da Amazônia brasileira, na década de 70, um estudo que é até hoje a base para o conhecimento hidrológico da região. O assunto é complexo, o território brasileiro, vasto, há diversas massas de ar circulando ao mesmo tempo e vindas de pontos distintos do continente, e poucos estudos sobre o que ocorre nos países vizinhos. "O vapor d'água primário vem sempre do oceano. Ele entra no continente por diversos caminhos e se chove ou não, depende de uma série de circunstâncias", explica Salati. "Estamos procurando saber qual é esta dinâmica e como ela pode ser modificada", continua o professor, enumerando as duas vertentes climáticas que atuam hoje na Amazônia - o desmatamento e os gases do efeito-estufa. "É claro que esta é uma pretensão muito grande e não será num projeto de um ano que vamos resolver este assunto", avisa. |
Os dados finais do estudo não estão prontos, Moss deve fazer a última campanha em breve. Salati evita colocar o dedo num vespeiro e falar da importância da Amazônia para as chuvas do Sudeste, um tema de divergência entre climatologistas. "A Amazônia deve ser preservada por causa da sua imensa biodiversidade e dos costumes das comunidades indígenas, mas também porque, desmatando, podemos mudar o clima de lá e eventualmente trazer problemas para a gente também", adianta. |
"Algumas pessoas consideram que 100% da chuva que cai em São Paulo vem da Amazônia. Mas não é assim, não toda vem de lá", diz José Marengo, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o INPE, e um dos cientistas que indica a Moss quando deve decolar e qual rio voador perseguir. "É ainda difícil dizer quanto da chuva vem do Pantanal, qual a parte do Atlântico, quanto vem da Amazônia. As respostas não são claras", continua Marengo, um dos cientistas que participaram do último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o IPCC, das Nações Unidas. |
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"Se você segue uma massa de ar de Belém a Porto Velho, vê claramente a origem amazônica. Mas de Porto Velho para Cuiabá já é uma salada russa. Ali também tem a evaporação do Pantanal, a entrada das brisas marinhas. Não é tão linear." É de Marengo a expressão "rios voadores". Ele a usou, certa vez, em uma palestra em Rio Branco, no Acre. Falava sobre o transporte de umidade pela Amazônia e, para se fazer entender, explicou que a circulação de vento funciona como se fosse um "rio voador". |
Moss a escutou de outro pesquisador do tema, Antonio Nobre, do Inpe, em um evento em Manaus. "Era uma expressão potente e fantástica", diz ele, que está no quarto projeto com viés ambiental em dez anos. O mais recente, "Brasil das Águas", recolheu 1.200 amostras em mais de 300 rios, igarapés, lagoas e represas. "Em um avião pequeno se tem uma visão privilegiada do estrago que está acontecendo no mundo e que as pessoas em terra não percebem", diz a fotógrafa Margi Moss, mulher de Gerard e co-autora dos projetos. |
Tudo começou há 20 anos, depois que Gerard Moss vendeu a empresa exportadora de soja que tinha no Brasil, comprou um avião e deu a primeira das duas voltas ao mundo do casal. "Mudou a minha cabeça, não quis mais trabalhar com negócios", conta. "A gente vê, voando, os rios secando e a enorme destruição em alguns lugares", conta Margi. "Queríamos fazer alguma coisa para mudar isso." |
No projeto "Rios Voadores", cada novo percurso - ou "campanha", como diz Moss - resulta em uns 50 tubos com gotinhas. "É um material tão precioso que não quero mandar a Piracicaba pelo correio, por isso vou sempre para lá no fim dos voos." Funciona assim: um dos pesquisadores o avisa da formação de um rio voador e planejam a rota. Ele parte para voos dentro das nuvens onde tenta mostrar a diferença de massas de ar que vêm da Amazônia, úmidas, e as que vêm do Sul, secas e frias, e que provocam chuvas. Foram seis campanhas pela Amazônia e cinco no resto do país, sendo duas no Pantanal. A última deve ser um retorno à Amazônia, mas pode incluir também a costa Atlântica. |
Gerard pilota e avisa seu assistente, o fotógrafo Tiago Iatesta, quando fazer a coleta (Margi, neste projeto, não tem voado - "É muita turbulência", diz). O monomotor tem uma entrada para coletar o ar que está fora. Uma bomba traz este ar para dentro de um tubo imerso em mistura de gelo seco e álcool e refrigerado a menos 70 graus. Depois, o tubo é entregue à equipe de Salati no Cena. |
A coleta ocorre, sempre que possível, a 100 metros, mil metros e 3 mil metros de altitude. A ideia é conseguir diferenciar a composição do ar que fica perto do chão e o de outras camadas. Quando Gerard voa perto de Belém, por exemplo, o ar lá de cima pode estar chegando direto do Atlântico, mas o de baixo pode já ter sido reciclado pelas árvores da Amazônia. "Assim espero conseguir descrever verticalmente o que está acontecendo", diz o químico Marcelo Moreira, pesquisador do projeto. Pela técnica, é possível identificar se a umidade tem origem continental ou oceânica, se veio de um oceano muito afastado ou se se trata de água de algum rio, esclarece Marengo. "Estamos procurando sinais para, baseados neles, buscar informação para um projeto maior, que envolva muito mais gente e tenha mais recursos", diz. |
Nas 11 campanhas que fez até agora, Moss perseguiu os diversos fluxos que avançam pela Amazônia, pelo Pantanal, pela Bacia do Prata ou que entram diretamente pelo litoral próximo à Bahia. Calcula ter recolhido cerca de mil amostras. No Cena, o material é analisado em um aparelho novo e raro, encomendado nos Estados Unidos e que existe em alguns poucos lugares como a sede da Agência Internacional de Energia Atômica, em Viena. É um analisador de água para isótopos. O equipamento joga um feixe de laser e observa a absorção desse laser por cada molécula de água. Para cada combinação de átomos, há um resultado específico. É assim que se tenta decifrar o DNA da chuva. |
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Os cientistas, agora, se debruçam sobre a análise dos dados. Neste trabalho pioneiro, trocam informações com Joel R. Gat, que era do Instituto Weizmann, de Israel, trabalha com esta técnica e é um antigo parceiro de Salati. "Mas para fazermos este estudo direito, de forma completa, teríamos que estudar o balanço hídrico de toda a América do Sul", registra Salati, que é diretor técnico da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS). "Trata-se de uma iniciativa nova para um problema velho, porque há muito tempo queremos saber a dependência do clima de outras regiões do Brasil em relação à Amazônia." |
A ciência consegue estimar quanto evapora de água na Amazônia, ou seja, quanto sai da floresta. "Mas não sabemos quanto do vapor d'água que chega a São Paulo passou pela floresta e quanto veio do Atlântico", diz Pedro Leite da Silva Dias, especialista em modelagem atmosférica e diretor do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), do Ministério da Ciência e Tecnologia, de Petrópolis. "Preciso de dados para validar os modelos de previsão do tempo e de cenários climáticos em que trabalho e as informações coletadas pelo projeto 'Rios voadores' podem me ajudar nisso", explica. |
Silva Dias é um dos pesquisadores a avisar Gerard Moss sobre o deslocamento de massas de ar e umidade. O matemático com pós em meteorologia interrompeu subitamente esta entrevista, por telefone, há alguns dias. "Está uma escuridão danada aqui em Petrópolis", disse. "É o rio voador que o Gerard acompanhou junto com a entrada de uma frente fria." |
Fonte: Jornal Valor
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