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MANDIOCA, O MISTÉRIO: SEBASTIÃO NERY - Quem é o chinês?


SALVADOR - Setembro de 1962, comício de encerramento da campanha de Adalardo Nogueira, candidato dos ferroviários e da oposição à prefeitura de Nazaré das Farinhas, histórica e querida cidade do Recôncavo baiano, a segunda mais antiga da Bahia, onde se faz a melhor farinha de mandioca do mundo. Adalardo, filho da terra, inteligente, rápido no gatilho, não sabia falar. Começava bem os discursos mas, cinco minutos depois, ficava sem assunto, começava a se enrolar.

Eu, candidato a deputado, comandando a campanha, me punha atrás dele, no palanque, fingia que estava conversando com o vereador Jorge Nagib e passava a ditar o resto do discurso: a necessidade da criação de um ginásio público, do hospital municipal, de uma empresa para exportação da farinha de mandioca, etc. 

Nazaré das Farinhas

No último comício, a multidão lotando a praça, eu ditando, fazendo o ponto, ele falando, falando. De repente, achei que os alto-falantes estavam fracos e, no intervalo de uma frase, enquanto o povo aplaudia, adverti:
- Fala mais alto.
Adalardo gritou a plenos pulmões:
"Fala mais alto!".
Quase tive um enfarte. Vi logo o vexame, o desastre, a gozação da cidade, a dois dias da eleição. Engatei uma primeira, arremeti:
- Fala mais alto, povo de Nazaré! Grita, reclama, protesta, exige, porque vocês estão cansados de pedir sem serem atendidos!
Adalardo, ator perfeito, não perdeu o fio da meada:

- Fala mais alto, povo de Nazaré! Grita, reclama, protesta, exige!, etc. Foi um delírio. O melhor discurso da vida dele. Ganhamos disparado.

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Em 10 de outubro, há duas semanas, o Senado aprovou o projeto 4.679, de 2001, do deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), para "a adição de no mínimo 10% de farinha de mandioca, da fécula (amido, polvilho) da mandioca, na farinha de trigo destinada à indústria de panificação". No dia seguinte, Lula vetou o projeto inteiro. É um grande mistério.

O projeto ficou sete anos (de 2001 a 2008) entre Câmara e Senado, sendo discutido, emendado, votado, aprovado por todos os partidos. O autor, Aldo Rebelo, era líder do governo na Câmara quando o apresentou e era ministro de Articulação Política de Lula quando tramitava na Câmara. No Senado, o relator foi o senador Flavio Arns, do PT do Paraná, entusiasticamente apoiado pelo também senador do Paraná, Osmar Dias, do PDT, agrônomo, professor, ex-secretário de Agricultura do Estado. 

Embrapa

E não tramitou em silêncio. A Câmara criou uma Comissão Especial para discuti-lo. No Senado, a CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) centralizou os debates. Também foi aprovado nas Comissões de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor, Fiscalização e Controle.
A pedido do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, em maio deste ano foi realizada em Brasília uma reunião dos membros das Câmaras Setoriais do Trigo e da Mandioca. Todos aprovaram.

A Embrapa, a maior empresa de pesquisa agrícola da América Latina e uma das mais conceituadas do mundo, comandou os estudos desde 1999. O técnico Joselito Motta, dirigente da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical, de Cruz das Almas, aqui na Bahia, comandou as pesquisas, escreveu livro, promoveu debates em 19 estados. Todos apoiando.

Trigo

A mandioca, a "raiz do Brasil", "planta sagrada", surgiu há 12 mil anos nas regiões onde ficam o Acre e Rondônia. É interesse nacional:
1 - O Brasil consome um mínimo de 10 milhões de toneladas de trigo por ano. Dessas, 80%, mais de 8 milhões, são importadas, sobretudo dos Estados Unidos, e também do Canadá, Rússia e Argentina. Nos últimos 10 anos, o Brasil gastou 17 bilhões de reais com a importação de trigo. A mistura pode resultar numa economia anual de 104 milhões de dólares.

2 - O projeto prevê que "a farinha de trigo e seus produtos transformados, vendidos ao governo, tenham 3% de derivados de mandioca já no primeiro ano de vigência da lei, 6% a partir de segundo ano e 10% daí em diante; os moinhos que realizarem a mistura terão incentivos fiscais".

Pão

E o pão? Como ficam o pão francês, o de sal, os biscoitos, bolachas?
1 - As pesquisas e estudos da Embrapa, nos dez últimos anos, provam que "o sabor e a textura agradam ao consumidor: o pão fica mais macio, não emborracha nem estica, é crocante e, reesquentado, continua crocante, com textura suave e agradável ao paladar; sua `vida de prateleira', sua duração, dobra em seis horas; o pão comum dura apenas seis".

2 - "Asssociada a fontes de proteínas em cada região, a mandioca já faz parte de uma dieta saudável e adequada na merenda escolar de inúmeros municípios brasileiros, sob a forma de bolachinhas de goma, pães de queijo, beijus, tapioca, com cores, cheiros e sabores ricos e atraentes".

Mistério

E por que Lula vetou um projeto de seu líder e ministro, do PC do B? É aí que está o mistério. Ninguém do governo, no Executivo e no Congresso, consegue entender. Na Embrapa, muito menos. O que se sabe é apenas que um diretor do monopolista Moinho Santista, um chinês, é amicíssimo de Lula e seus amigos. Juntos, teriam feito "a cabeça" de Lula.

Fonte: SEBASTIÃO NERY

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