Sexta-feira, 23 de novembro de 2007 - 19h40
Uma das principais bandeiras do ministério de Marina Silva, a criação de unidades de conservação na Amazônia, este ano não se comparou a 2006. Na época, o governo brigou para decretar gigantes como o Parque Nacional do Juruena e o Parque Nacional dos Campos Amazônicos. Juntas só essas duas áreas protegem mais de três milhões de hectares. Em 2007, a expectativa era grande pelos decretos de criação de várias unidades de conservação na área de influência da BR-319 (Porto Velho-Manaus). Estavam prometidas para sair em junho – um ano depois de terem sido encerradas as consultas públicas e todos os estudos que corroboram a necessidade de proteger essa região. Mas às portas de 2008, nenhuma saiu.
A explicação para a demora ninguém quer dar. Procurado pela reportagem desde o início da semana, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) não apresentou uma resposta. O presidente-interino do Instituto Chico Mendes, João Paulo Capobianco, foi procurado e também não retornou as ligações. Mas o que tem acontecido a uma dessas áreas revela quão prejudicial essa burocracia se torna para a gestão dos locais em que o próprio governo considera como prioritários para a conservação da natureza.
No entorno da Estação Ecológica Cuniã e da Reserva Extrativista do Lago do Cuniã, espremidas entre a BR-319 e o rio Madeira, na divisa do Amazonas com Rondônia, existe uma área de 97 mil hectares estudada e escolhida para ampliar essas duas unidades de conservação federais. Em meados do ano passado aconteceram consultas públicas e em setembro de 2006 todos os documentos foram entregues à sede do Ibama em Brasília.
Mesmo com tudo pronto, um ano depois de findos os levantamentos e consultas, a Secretaria de Biodiversidade e Florestas do MMA enviou ofícios a instituições como a Secretaria de Patrimônio da União e o Incra pedindo que emitissem seus pareceres sobre a ampliação. Segundo Carolina Carneiro, responsável pela Estação Ecológica Cuniã, alguns desses órgãos já tinham sido convidados a se manifestarem durante as consultas públicas e, na época, não disseram nada. “É como se não acreditassem no trabalho que fizemos aqui”, diz.
A gerência regional da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) em Porto Velho confirmou que recebeu o ofício do MMA, e em seguida solicitou à superintendência do Incra na capital rondoniense informações sobre a localização do imóvel, registro cartorial, memorial descritivo da área e outras informações pelo fato de a área ser considerada de fronteira. “Enviamos um ofício ao Incra no dia 1º de outubro e ainda não recebemos resposta”, afirmou Antônio Ferreira, gerente da SPU em Porto Velho. O Incra de Manaus reconhece que recebeu o documento, com pedidos reiterados no ano passado e em 2007. E, através de sua assessoria de imprensa, informou que técnicos do setor de cartografia ainda estão realizando levantamentos em campo e apenas em dezembro, quando terminarem os trabalhos, poderão se manifestar.
Contra o relógio
A estação ecológica, que passaria dos atuais 53 mil hectares para 125 mil hectares se ampliada, tem motivos de sobra para aumentar seu tamanho. “A área é importante porque protegerá as nascentes dos igarapés que abastecem a reserva extrativista. Também vai abranger uma mancha de Cerrado, ambiente extremamente frágil e será coerente com o que diz o zoneamento do estado de Rondônia, que considera aquela área própria para conservação”, explica Carolina.
Agora que a população sabe que a área deve virar unidade de conservação, mas não quando, os analistas ambientais responsáveis pela estação ecológica e pela reserva extrativista assistem, sem poder impedir, o aumento do número de invasões a partir da BR-319. “Todos andaram construindo benfeitorias e desmatando na tentativa que o Incra reconhecesse a área”, cita Carolina. “Em setembro deste ano, quando estivemos por lá, vimos um topógrafo demarcando terras que estão dentro da área para ampliação sem qualquer documentação”, relata. Segundo ela, as áreas sob maior risco de invasão pertencem ao município amazonense de Canutama, onde as casas estão sendo erguidas por pessoas que definitivamente não se enquadram no perfil de reforma agrária, como advogados e policiais de Rondônia.
Enquanto a área ainda não é protegida, o Ibama não tem muito o que fazer. “Podemos autuar por desmatamento sem autorização de órgão competente, mas não retirar as pessoas da área. O enquadramento é bem mais leve do que se isso estivesse acontecendo dentro de unidade de conservação”, explica Carolina.
Criada em 2001, a Estação Ecológica Cuniã tem hoje 53 mil hectares não contíguos. Entre eles fica a maior parte da Reserva Extrativista do Lago Cuniã, que numa área de 52 mil hectares é lar de 110 famílias de ribeirinhos extrativistas desde 1999. As unidades têm conselhos consultivos estabelecidos e plano de manejo previsto para ficar pronto em abril do ano que vem.
Fonte: O Eco
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