Quarta-feira, 12 de dezembro de 2007 - 07h04
Por Michelle Portela, de Manaus
Agência FAPESP – Pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) conseguiram descrever como abelhas sem ferrão do gênero Melipona contribuem para a dispersão de sementes de angelim-rajado (Zygia racemosa), espécie presente na vida do ribeirinho e de alto valor comercial. Esse é o terceiro caso no mundo, comprovado cientificamente, de melitocoria, a dispersão de sementes de plantas por abelhas.
A dispersão do angelim-rajado no caso estudado foi realizada por abelhas sem ferrão. O fato surpreendeu os pesquisadores pelo grande tamanho da semente carregada com resina pelas operárias. As abelhas sem ferrão são responsáveis por 30% a 90% da polinização de plantas em diferentes biomas brasileiros.
A participação é acentuada na região amazônica. “O Amazonas concentra a maior variedade de abelhas sem ferrão do mundo. Com a maior extensão territorial e mata preservada, a principal diversidade está aqui, bem perto de nós”, disse o biólogo Alexandre Coletto da Silva, do Inpa, à Agência FAPESP.
Das cerca de 400 espécies de abelhas sem ferrão descritas na literatura científica, pelo menos 300 estão na Amazônia. “A importância da descoberta da participação das abelhas na dispersão do angelim-rajado aumenta quando se considera o valor do uso dessa espécie madeireira pelos povos tradicionais da floresta”, afirmou Coletto da Silva.
O angelim-rajado é muito usado na construção de paredes de casas ou no entalhe de móveis, como mesas e cadeiras. A descoberta foi descrita na revista Acta Amazonica.
Durante um ano, o grupo da bióloga Christinny Giselly Bacelar Lima, doutoranda em botânica pelo Inpa, acompanhou o comportamento das abelhas entre o meliponário (onde se criam abelhas sem ferrão) do Inpa e a floresta natural do campus da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Quando voltavam da floresta, algumas traziam sementes para as colméias.
Segundo Coletto da Silva, os pesquisadores se questionaram sobre a possibilidade de dispersão pelas abelhas. “Se eram abelhas mesmo que estavam levando as sementes para lá, precisávamos provar esse comportamento”, disse.
Uma câmera foi instalada na frente da colméia para registrar o momento em que as abelhas voltavam para “casa” com as sementes presas nas pernas. De modo a descobrir a semente de qual espécie de planta estava sendo transportada, os pesquisadores entraram na mata da Ufam, para onde sabiam que as abelhas voavam uma vez que haviam observado a direção e sentido que as operárias se deslocavam após sair das colméias.
“No primeiro dia de campo, após várias horas de caminhada pela mata, confirmamos a existência de inúmeras mudas como as que trazíamos conosco, obtidas a partir das sementes trazidas pelas abelhas e postas para germinar. E, mais à frente, ao olharmos para cima deparamos com um grande angelim-rajado”, disse Coletto da Silva.
Posteriormente, ele e outro membro do grupo subiram no angelim por rapel para fotografar a coleta. “No alto, fotografamos abelhas coletando sementes. Era o terceiro caso registrado no mundo”, afirmou.
O primeiro caso de melitocoria foi registrado na Austrália. Uma abelha do grupo das trigonas (Trigona carbonaria), espécie sem ferrão menor, carregava a semente de um tipo de eucalipto. O segundo caso foi no Amazonas, também com abelhas Melipona, que espalharam sementes da espécie vegetal Coussapoa asperifolia.
O artigo Melitocoria de Zygia racemosa (Ducke) Barneby & Grimes por Melipona seminigra merrillae Cockerell, 1919 y Melipona compressipes manaosensis Schwarz, 1932 (Hymenoptera, Meliponina) en la Amazonía Central, Brasil, de Christinny Giselly Bacelar-Lima e outros, publicado na Acta Amazoniza (vol. 3, 3ª edição), pode ser lido em http://acta.inpa.gov.br
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