Sexta-feira, 24 de novembro de 2017 - 07h20
A pista mais concreta sobre o submarino argentino que desapareceu na semana passada, com 44 pessoas a bordo, foi fornecida pela Organização do Tratado de Proibição Completa dos Ensaios Nucleares (OTPCE), com base em Viena, na Áustria. No dia 15 de novembro, duas estaçoes hidro-acústicas detectaram “um sinal incomum”, produzido três horas após a última comunicação da tripulação com a base e a 48 quilômetros do local onde o submarino estava.
As duas estações, que registraram um ruído “consistente com o de uma explosão debaixo da água”, ficam na ilha britânica de Ascenção, no Atlântico, e o arquipélago francês de Crozet, ao sul do Oceano Índico. Ambas formam parte de uma rede internacional, montada pelos membros da OTPCE, para monitorar a realização de testes nucleares que possam ameaçar a paz mundial.
As informações dessas estações foram cruzadas com outras, obtidas pela megaoperação de busca e resgate, da qual participam 12 países, além da Argentina. A conclusão, divulgada pela Marinha argentina ontem quinta-feira (23) de manhã, foi de que houve uma explosão no submarino. Navios e aviões foram mobilizados para buscar o ARA San Jose no local indicado pelos sensores, mas as esperanças de encontrar alguém com vida são pequenas. Um submarino só tem capacidade para armazenar oxigênio durante oito dias. Depois, precisa subir à superfície para renovar o ar – coisa que, tudo indica, não ocorreu.
"Foi uma explosão pequena. Não estou dizendo que o submarino explodiu totalmente. Mas, pela localização e a hora (da explosão), é possível que esteja relacionado ao submarino argentino", disse o secretário-geral da OTPCE, Lassina Zerbo. Em sua conta no Twitter e em entrevistas, ele respondeu às perguntas que muitos fizeram: por que tanta demora em associar um ruído, emitido no dia 15 de novembro, ao submarino, desaparecido no mesmo dia?
Zerbo explicou que, ao contrário do que muitos pensam, o fundo do mar não é silencioso, está cheio de ruídos. “Um volume enorme de dados foi examinado para obter as pistas do submarino perdido”, escreveu. “Milhares de sinais possíveis e sons tiveram que ser examinados, para descartar ruídos naturais (como os das baleias) e industriais”.
O embaixador argentino na Áustria, Rafael Grossi – que também é especialista em temas nucleares – explicou que recorreu à OTPCE porque sabia que a organização tinha os meios para detectar anomalias no fundo do mar. As estações dão sinal de alerta quando há uma atividade nuclear, mas – a pedido do governo argentino – foi realizada uma revisão dos dados coletados na semana passada. Com isso, identificou-se não apenas a explosão, mas também o local exato e a hora em que aconteceu: às 11h 51m (horário de Brasília), a 48 quilômetros ao norte do local onde o submarino estava, quando se comunicou com a base três horas antes.
Navios, aviões e até um mini-submarino norte-americano foram mobilizados para vasculhar a área, a 432 quilômetros da costa argentina, na altura do Golfo de São Jorge. Dependendo do local, a profundidade das águas pode variar entre 200 e 3 mil metros. “Estamos em uma corrida contra o tempo para salvar vidas", disse Zerbo que, a exemplo do porta-voz da Marinha argentina, Enrique Balbi, e de especialistas consultados pela imprensa argentina, não dão o episódio por encerrado até encontrar o submarino.
Algumas famílias dos 44 tripulantes ainda guardam alguma esperança e continuam na base naval de Mar del Plata, onde o submarino deveria ter chegado na segunda-feira (20). Do lado de fora, bandeiras, cartazes e correntes de orações, em solidariedade aos tripulantes desaparecidos. Afinal, ao longo dos últimos oito dias, houve vários alarmes falsos. Mas a “anomalia acústica”, detectada primeiro pelos Estados Unidos na quarta-feira (22) acabou sendo confirmada no dia seguinte pela OPTCE. Muitos reagiram com raiva e indignação à notícia, acusando o governo de ter escondido a verdade durante uma semana: nos primeiros dias, falavam em uma falha elétrica, e nunca numa explosão.
A operação de busca do submarino reuniu países que, em outros tempos, jamais fariam uma patrulha conjunta. A começar pelo Reino Unido, que derrotou a Argentina na guerra de 1982 pela posse das Ilhas Malvinas. O território, considerado “em disputa” pelas Nações Unidas, ainda é reivindicado pelo governo argentino, que até recentemente tem denunciado a presença militar britânica no Atlântico Sul. Além do Reino Unido, da França e da Noruega, vizinhos (como Brasil, Chile, Uruguai e Peru), e potências antagônicas (Estados Unidos e Rússia) estão cooperando na busca do submarino.
O caso do ARA San Juan tem sido comparado com o desaparecimento do submarino russo Kursk, há 17 anos. Ele sofreu uma explosão no compartimento de armas, quando navegava no Oceano Ártico. Alguns dos tripulantes conseguiram se refugiar em um compartimento da embarcação e emitir sinais de socorro, durante 48 horas. Mas a Rússia – ao contrário da Argentina – demorou uma semana para aceitar ajuda internacional, para não revelar “segredos militares”. Na tragédia, morreram 118 pessoas.
O submarino argentino não é nuclear – é movido por baterias elétricas e usado para patrulhar a costa e as atividades de navios de pesca piratas. O ARA San Juan foi construído nos anos 1980 na Alemanha e reformado em 2014 para ampliar sua vida útil por mais 30 anos.
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