Segunda-feira, 11 de maio de 2009 - 07h50
Há anos, o projeto Pascua-Lama vem sendo amplamente criticado por ambientalistas e parte da comunidade no entorno da jazida. A preocupação começa pela água, diz Lucio Cuenca, diretor da Organização Latino-americana de Conflitos Ambientais (Olca), baseada em Santiago, Chile.
A mina situa-se em uma zona árida, onde se desenvolve agricultura de frutas (uva, cítricos, abacate) para exportação. Nesta região, incrustada na Cordilheira dos Andes, nascem dois rios que confluem na formação do rio Huasco, que dá nome ao vale que abriga a parte chilena do projeto Pascua-Lama. O empreendimento da Barrick está situado junto à nascente destes rios.
Para processar 300 toneladas diárias de minério contendo ouro, Pascua-Lama vai consumir 370 litros de água por segundo, o que por si só já é considerado uma ameaça ao ambiente, por estar em uma área de deserto. Mas, além disso, a mina vai movimentar mensalmente 17 caminhões com cianureto e 200 com explosivos.
Outro ponto de conflito é uma demanda da comunidade indígena Diaguita, uma etnia que habita a região há tanto tempo quanto os incas na Bolívia e no Peru, inclusive partilham os mesmos rituais sagrados. Os diaguitas alegam que já haviam obtido títulos de propriedade da terra comprada pela Barrick e moveram uma ação na Justiça contra a empresa.
No vale do Huasco vive cerca de 70 mil pessoas, a maioria ligada à atividade rural. Há muitos pequenos, mas também há grandes produtores que desenvolvem frutas irrigadas para exportação. "As associações dos grandes produtores rurais também estão preocupadas", diz Lucio Cuenca. A Olca e a União de Assembléias Cidadãs, do lado argentino na província de San Juan, estão à frente das organizações não governamentais que contestam o projeto.
A multinacional canadense teve aprovados todos os relatórios de impacto ambiental apresentados aos governos dos dois países. Mas por pressão dos ambientalistas, índios, religiosos e agricultores, a Barrick foi obrigada pelo governo chileno a assinar um documento prometendo que não tocaria nos glaciais, as formações de neve compactada sobre as montanhas da Cordilheira. A aprovação para o início das operações foi então condicionada à apresentação de um plano de manejo de glaciais.
Lucio Cuenca afirma que o plano apresentado pela empresa é "um insulto à inteligência". A Barrick teria apresentado como solução o deslocamento das geleiras, sob o argumento de que a "técnica" já havia sido testada em três outros casos de mineração em glaciais, dois no Canadá e um na Ásia.
A Olca questiona também a capacidade que o governo terá para fiscalizar a mina. É que, pelo tratado de mineração assinado em 1997, a própria empresa é quem vai custear os gastos com a infraestrutura estatal na área da mineração. É com dinheiro da companhia que se construirão, por exemplo, os postos de imigração, aduanas e fiscalização sanitária e do trabalho.
Para que fosse aprovado, a Barrick dividiu o megaprojeto em várias partes - a usina de abastecimento elétrico foi um projeto; a rede de transmissão da mesma usina, outro; uma mina de cal, outro; o aeroporto, outro. "A estratégia de mostrar o projeto em partes, impede ver o tamanho do impacto ambiental do projeto e isso contraria a nossa legislação", disse Lucio Cuenca.
Tanto a Barrick Argentina quanto os Ministérios de Mineração do Chile e da Argentina foram procurados pela reportagem do Valor para responder às críticas. A assessoria de imprensa da Barrick respondeu que não podia dar nenhuma informação adicional sobre o projeto, além do que havia sido divulgado na quinta-feira em nota à imprensa sobre o lançamento oficial na Bolsa de Valores de Nova York. Neste documento, a empresa informa que "a mina recebeu a aprovação de seus Estudos de Impacto Ambiental de parte das autoridades regulatórias do Chile e da Argentina" e que foi objeto de "extensas revisões ambientais" ao longo de muitos anos. Entre estas revisões está o limite de escavação para evitar o impacto sobre os glaciais, um programa de manejo de água com 87 pontos de monitoramento, além de programas sociais junto às comunidades da área.
A assessoria do Ministério de Mineração do Chile não respondeu e o ministro de Mineração da província de San Juan, Felipe Saavedra, pediu que ligasse mais tarde e não atendeu mais até o fechamento desta edição. (JR)
Fonte: Jornal Valor
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