Por Stephen Leahy, da IPS
Chicago A malária avança em regiões da África onde antes era desconhecida, devido à mudança climática. Foi o que afirmaram pesquisadores que este mês participaram da reunião anual da Associação Norte-americana para o Avanço da Ciência, em Chicago. A região ártica, onde a mudança climática avança em maior velocidade, é o melhor lugar para estudar como o aumento da temperatura afeta a transmissão de doenças infecciosas. A cada dia, as enfermidades transmitidas por insetos, principalmente a malária, matam três mil pessoas na África, disse Andy Dobson, da Universidade de Princeton (EUA).
Compreender como o aquecimento global altera as temperaturas e o meio ambiente, assim como facilita as migrações do mosquito Anopheles, transmissor da malária, é crucial para entender a dinâmica futura das doenças transmitidas por insetos, disse Dobson à IPS. Gastamos enormes quantias de dinheiro para tentar desenvolver vacinas contra a malária, mas a melhor vacina não vai durar mais que dois anos, acrescentou. O período natural de imunidade à malária é de dois anos, mas erradicar a doença usando uma vacina exige inocular toda a população em risco todos os anos, porque o parasita da malária evolui rapidamente, explicou. Não seremos capazes de fazer isso, ressaltou.
Por outro lado, os cientistas devem procurar compreender e projetar como e onde serão registrados focos de malária sob as alteradas condições da mudança climática. Entretanto, há pouquíssimos dados ou pesquisas sobre transmissão de doenças na área. Os estudos se concentram mais em desenvolver vacinas e na análise genética do parasita da malária e do genoma do mosquito. Isso não nos diz nada sobre o contágio, acrescentou Dobson. Trata-se de um triste testemunho sobre como gastam seu dinheiro os institutos nacionais de saúde dos Estados Unidos e a Fundação Bill e Melinda Gates, afirmou à IPS.
Provavelmente, a epidemia de malária será uma nova ameaça para dezenas de milhões de africanos em regiões altas de Burundi, Etiópia, Quênia, Ruanda e Tanzânia, antes livres dessa enfermidade, alertou Christopher Thomas, da Universidade de Aberystwyth, na Grã-Bretanha. Este caminho já está em curso, acrescentou perante os especialistas reunidos entre os dias 12 e 16 em Chicago, baseando-se em novos modelos informatizados de aumentos de temperatura. Espera-se que a malária responda rapidamente a um clima alterado, porque as populações de mosquito aumentarão em regiões que antes eram muito frias, afirmou Thomas, lembrando que na maioria dessas regiões há pouca imunidade natural a essa doença. Isso também significa que algumas regiões, como o Sahel, terão menos malária, pois se prevê que ficarão muito secas para os mosquitos. Porém, isso ainda não é uma boa notícia, já que as condições de seca prejudicarão a segurança alimentar local, destacou.
O aumento da temperatura pode explicar o motivo da multiplicação por oito, desde os anos 70, da incidência da malária nas terras altas do Quênia ocidental, disse Mercedes Pascual, ecologista da Universidade de Michigan. Historicamente, as populações se assentaram nestas regiões para se proteger da malária. Mas isso as torna mais sensíveis, afirmou. A falta de exposição previa à doença significa que a resistência dos residentes nessas localidades é baixa e que a mortalidade é muito maiôs do que a média. Em alguns casos, o aumento de temperatura é de apenas 0,5 graus, mas em combinação com uma maior resistência ao medicamento cloroquina, usado para combater a malária, foi eficiente para que a doença recrudescesse, ressaltou. A mudança climática é uma preocupação neste momento, concluiu Pascual.
A falta de compreensão da biologia básica de mosquitos e parasitas é um sério vazio de conhecimento na hora de determinar quando a malária atacará em novas regiões, e em quais, disse Matthew Thomas, entomologista da Universidade da Pennsylvania. A fêmea do mosquito Anopheles propaga a malária ao picar humanos infectados e ingerir os parasitas da doença junto com o sangue. Estes crescem muito lentamente em ambientes frios, e mais rapidamente nos quentes.
A mudança climática não só aumenta as temperaturas médias, mas também as temperaturas noturnas. Segundo a pesquisa de Thomas, isso pode marcar uma diferença: nas primeiras 12 horas de incubação o parasita é muito vulnerável ao frio. Como a maioria dos mosquitos pica durante a noite, as noites mais quentes são uma boa notícia para os parasitas e má notícia para os humanos. Entretanto, Thomas constatou que se os mosquitos que se alimentam pela manhã enfrentam temperaturas que sobem rapidamente durante o dia, pode-se deter o crescimento do parasita. Para projetar o que acontecerá precisamos compreender os efeitos da temperatura e da mudança ambiental através do ponto de vista do mosquito, afirmou.
O melhor lugar para compreender a biologia do mosquito é o Ártico, embora ali não exista parasita da malária, sugeriu Dobson. A razão principal é que a mudança climática já avança rapidamente ali, muito mais do que na África. Os ciclos vitais dos parasitas locais acelera-se três ou quatro vezes com as temperaturas mais quentes, ressaltou. As populações de mosquitos experimentam um auge, e os caribus (renas selvagens) estão sendo prejudicadas, acrescentou Dobson.
O Ártico também é mais simples do ponto de vista ecológico, com uma biodiversidade muito menor do que na África, o que facilita a compreensão dos detalhes da interação hóspede-parasita. É um tipo de laboratório gigante de transmissão da doença que pdoe fornecer um entendimento do que ocorrerá em regiões mediterrâneas e tropicais no futuro, explicou Dobson.
A malária é uma doença dos pobres. O sudeste dos Estados Unidos e o norte da Austrália têm condições perfeitas para o desenvolvimento da doença, mas estão livres delas, lembrou Thomas. Podemos fazer sérias incursões na compreensão da biologia no prazo de três a cinco anos, mas nos falta financiamento, lamentou o cientista. (IPS/Envolverde)
Fonte: Envolverde/IPS
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