Domingo, 31 de janeiro de 2010 - 08h05
Bruno Peron Loureiro
Reforma agrária é uma dessas questões que se reservam aos super-heróis das políticas públicas.
Ainda que dentro do desejável, possível e necessário para uma sociedade mais justa, as propostas de divisão de terras no Brasil incidem em interesses conflitantes: de um lado, os insatisfeitos com o pouco de que dispõem; de outro, os cães que rosnam com o osso na boca.
A concentração de propriedade é abusiva neste país, portanto é necessário implantar um novo modelo de apropriação agrícola e resgatar os erros do passado.
É verdade que não basta ter acesso à terra. Uma dificuldade que surge posteriormente à aquisição de propriedade rural é a de falta de treinamento dos novos proprietários e infra-estrutura para aproveitamento agrícola, como capital, irrigação, semente e vias de transporte. Toma-se em conta que a maior parte do terreno no país não é usada em cultivo ou outra atividade de fins econômicos.
Desde esta linha argumentativa, muitos sustentam que o problema seria então o de excesso de terras ociosas e a falta de investimento em produtividade com técnicas modernas na agricultura, planejamento do plantio e da colheita.
A população tupinica, segundo vozes reprovadoras da reforma agrária e longe de corresponder à minha, é majoritariamente urbana e, por isso, não faz sentido repartir terras rurais, que estão muito bem nas mãos de poucos.
Oras, como o Brasil poderá investir em tecnologia na produtividade agrícola se ainda não superou a etapa de repartição das terras? O país está atrasado em reforma agrária. Do ponto de vista de grandes proprietários rurais, é natural que se demonizem movimentos sociais e protestos que objetivam a distribuição de terras, porém falta uma consciência coletiva.
O uso da palavra “invasão” em vez de “ocupação” contribui para a tendência dessas pesquisas inúteis que reiteram a visão de latifundiários. A “imagem do MST”, que foi solicitada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) indica que a maioria dos tupinicas reprova a ocupação de propriedades. Quem é que daria uma resposta favorável a que um estranho entrasse em sua casa sem pedir licença?
Desvia-se, todavia, o foco da luta pela justiça social ao desrespeito de direitos de propriedade privada.
A defesa da reforma agrária esbarra na torcida agressiva do outro time. O caminho da repartição de terras no Brasil é fundamental para promover a redução de desigualdades. Concordo com que não basta dar terras se não houver uma continuidade da inserção no sistema produtivo das famílias beneficiadas com a reforma. Enquanto não se supera uma etapa, no entanto, não é possível impulsionar a outra.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) elabora avaliações e políticas de acesso à terra, fiscalização de imóveis rurais para averiguar se cumprem a função social, combate à grilagem (que significa a posse indevida de terras mediante expulsão de seus proprietários e apresentação de documentos falsos), e repasse de recursos a entidades de apoio à reforma agrária. A instituição fiscaliza de 6 a 7 milhões de hectares por ano.
O INCRA dispõe de R$4,6 bilhões de orçamento para 2010. O recurso destinado à reforma agrária é cada vez maior.
Este tema exige uma postura radical dos governantes e ativistas sob o risco de sucumbir às mentiras e travas lançadas pelos opositores. Uma delas é a de desmerecer movimentos sociais que lutam pelos oprimidos ou a de advogar que, em vez de repartir, a tecnologia na agricultura de latifúndios por si só geraria retorno benéfico à sociedade.
As discussões e divulgações sobre a reforma agrária têm sido monopolizadas pelos que se opõem a ela. Falta a representatividade de opiniões divergentes.
Bruno Peron Loureiro é mestre em Estudos Latino-americanos.
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