Segunda-feira, 18 de agosto de 2008 - 22h05
Bruno Peron Loureiro
Não é de hoje que me pergunto por quê os livros de história geral, antes manuais para o bom desempenho no vestibular, são tão reducionistas a ponto de ignorar os acontecimentos de grande parte do mundo em prol da Europa. Exceto pelas notas de rodapé ou páginas parcimoniosas, a África, a Ásia, a Oceania e a própria América Latina praticamente passam em branco. E, quando se fala destes continentes, é quase sempre sobre o colonialismo e o imperialismo que os vitimaram, seguidos da formação de guerrilhas e pobreza generalizada.
Sabemos mais da história européia que a dos nossos próprios vizinhos. A maior referência continua sendo a Europa segundo as descrições das idades moderna e contemporânea presentes nos livros de história, que são consultados e lidos por estudantes brasileiros no ensino fundamental e médio. Além da guerra de secessão das primeiras colônias que formaram os Estados Unidos, sua independência e a marcha para o oeste. E o que é pior: crescemos com a idéia de que este país prosperou porque teve colônia de povoamento, enquanto o Brasil carregaria o fardo de ter sido colônia de exploração. Como se lá não tivesse colônia de exploração (estados que formaram o sul), nem no Brasil de povoamento.
Não vejo a mínima razão de focar tanto a história européia como fazem esses manuais antiquados. É certo que muito do que somos se deve às civilizações clássicas grega e romana, aos franceses (revolução francesa) e ingleses (revolução industrial), porém os olhos que só admiram o que provém deles sem enxergar o nosso não alcançam o desenvolvimento autônomo. Em parte, porque as condições que temos são outras e o caminho não é o de contar e recontar como a Europa dominou outros continentes com sua frieza, técnicas e valores.
Vale recordar o formato da colonização hispano-americana, em que os espanhóis esmagavam a cultura nativa (igrejas foram construídas sobre templos pré-colombianos) e arrancavam as tripas dos ameríndios para afirmar a dominação e o poderio colonial que se acercava. A atenção do Brasil, portanto, deve-se voltar aos que estão em situação semelhante de desenvolvimento econômico e humano, como Chile, México, China, Índia e África do Sul. O modelo, ainda, está entre os tigres asiáticos, como Coréia do Sul e Taiwan.
É uma lástima que desconheçamos os nossos vizinhos, suas práticas e conquistas. Somos estimulados a pensar que o nosso único modelo está fora do alcance, o que é um equívoco. Lembro que, quando prestei vestibular e faltando poucos meses para os exames, os professores apareceram com um anexo improvisado sobre as civilizações asteca, maia e inca. Único eco que nos chega da história pré-colombiana do México, Guatemala, Peru, Chile, entre outros. Enquanto isso, os educadores e educandos recitam os nomes dos imperadores romanos de cor e salteado, como se nos importassem muito.
Enfatizar a história européia é uma ação arriscada para nós diante do fortalecimento da União Européia e da xenofobia. Admiramos e logo somos desprezados (por reformas em políticas migratórias) e explorados (pela influência econômica que não pensa na cidadania). O Mercado Comum do Sul (Mercosul) cambaleia e hesita em aceitar a Venezuela no bloco, enquanto as novas edições dos manuais de história geral reservam mais espaço para as conquistas inéditas da Europa.
Essa história que nos contam, mas de um mundo velho. Que indignação.
Bruno Peron Loureiro é bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Estadual Paulista (UNESP/ Franca-SP).
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