Segunda-feira, 3 de novembro de 2008 - 00h00
Bruno Peron Loureiro
O povo brasileiro se faz do amálgama étnico. Ainda que a aparência física nem sempre o demonstre, todos temos algo de negro ou indígena, conforme apregoava o antropólogo Darcy Ribeiro, enquanto manifestação cultural, que envolve a culinária e expressões agregadas ao idioma português. Trato, nesta ocasião, de comentar alguns acontecimentos históricos, problemas e propostas com respeito aos grupos indígenas em território nacional. Desde a espoliação e a matança promovidas pela conquista portuguesa, que logo se converteu no lema crioulo, não lhes sobra outro caminho a estes grupos na atualidade que a reivindicação dos seus direitos perante o Estado brasileiro.
É difícil estimar o número de indígenas do início do século XVI no que atualmente chamamos território brasileiro porque não houve censo na época. Hoje se fala da existência de 300 mil, ou 0,2% da população, e de 215 grupos étnicos catalogados, sem contar os desconhecidos, como aquele cujas imagens apareceram recentemente na televisão brasileira enquanto atiravam arcos contra o helicóptero de onde se gravavam as cenas, e uma variedade de 180 línguas. A maioria destes grupos possui população abaixo de cinco mil habitantes; inclusive há os de menos de trinta pessoas. Alguns transcendem os limites territoriais brasileiros e ocupam também espaços em países limítrofes.
Primeiro, os europeus achavam que tivessem aportado na Índia, daí o nome de índios. Logo, os nomes que se lhes atribuíram aos grupos nem sempre correspondiam a como se conheciam entre eles, senão que foram dados pelos brancos conquistadores. Os europeus, no período da conquista, exterminaram os indígenas por armas ou doenças para as quais estes não tinham imunidade. Como se não bastasse, os meios de comunicação cotumam tratar dos indígenas e dos temas relacionados a eles, quando se discutem, como se constituíssem uma única comunidade ou dentro de um desenho homogeneizado, que desconsidera as particularidades de cada grupo.
De sangue e imposição se fez a conquista. Houve, neste ínterim, um recuo paulatino dos grupos indígenas na direção do interior do país a estados como os do Centro-Oeste, Norte e Nordeste, que são os que mais contiveram a expansão moderna, enquanto outros se afetaram menos porque já habitavam estas regiões. O conflito atual emerge do interesse de empresas mineradoras e de alguns fazendeiros, que enxergam estes grupos como empecilho à expansão territorial para os negócios agrícolas. O impasse é que a maioria dos indígenas se encontra justamente nas regiões onde o Estado é mais débil e, portanto, menos capaz de assegurar-lhes seus direitos.
A Constituição Federal de 1988, que atualiza a legislação indígena e dedica atenção maior ao tema, enfatiza a proteção territorial, no entanto, como se o problema fosse só o de garantir-lhes terras. Se pelo menos as instituições públicas assegurassem este direito, já fariam algum benefício. Contudo, os interesses latifundiários têm feito as autoridades locais de cúmplices, quando não reféns de suas intenções econômicas, como se nota em cidades de pequeno e médio porte. Nelas, até mesmo os valores básicos das sociedades modernas, como a democracia e a liberdade, titubeiam. A atuação de organismos públicos, como a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), deve intensificar-se nestas regiões para cumprir com a Lei Magna e ampliar a atenção aos indígenas.
As políticas indigenistas de criação e manutenção de reservas indígenas, que são locais de preservação destes povos e de suas culturas, iludem-se na falta de articulação com outras áreas do desenvolvimento. Persiste a crença em que a demarcação de terras é suficiente para respeitar o universo indígena. Uma proposta: ao atrelar, por exemplo, a defesa indígena à preservação ambiental, que são dois fulcros da discussão atual, seria possível associar a ligação intrínseca que os indígenas têm com a natureza ao apoio mundial ao meio ambiente, cujo tema está em alta na agenda internacional. Assim, a questão indígena deixaria de ser secundária.
Enquanto não se amplia a perspectiva desde a qual a questão indígena é interpretada e avaliada, as políticas continuarão sendo traçadas sem escutar as demandas destes povos e ponderar sobre elas, em outras palavras, o que eles querem e não o que a pretensa civilização acha que aqueles devem receber numa prática assistencialista. O ponto crucial refere-se à dinâmica cultural de cada um dos grupos indígenas, que poucas vezes desejam integrar-se ao estilo de vida moderno apesar de todo avanço técnico e do atrativo que se afigura como isca, e aos direitos de manifestarem suas tradições e sua relação secular e respeitosa com a natureza sem palpites alheios.
Bruno Peron Loureiro é bacharel em Relações Internacionais pela UNESP
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