Quinta-feira, 23 de julho de 2009 - 09h39
Mudou a noção de patrimônio. Num circuito global em que imagens, mensagens e vozes atravessam o mundo em fração de segundos e quando se apela cada vez mais às relações de poder brando, já não podemos perpetuar a crença em que o que nosso país tem de patrimônio se limita a um monumento ou um edifício histórico que se expõe diariamente ao sol enquanto os transeuntes o contemplam com desdém.
Patrimônio é uma categoria que se tornou mais abrangente infelizmente tarde e não por todos os que deveriam lidar com a questão a ponto de incluir o intangível ou o imaterial ao conjunto de objetos de museu e prédios que remontam ao período colonial. Por que ainda há um anacronismo para propor formas de proteger e divulgar os idiomas, os sotaques, as técnicas, os costumes e os saberes locais?
O que define o patrimônio é a capacidade de representar simbolicamente a identidade, que se promove por alguma instituição social e se legitima pelo restante da sociedade. Os traços identitários brasileiros têm sido criados oficialmente em função da nossa maneira de ser, o futebol, o carnaval, as belezas naturais. A identidade nacional caminha junto com o que se soma como patrimônio intangível.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) entende que o patrimônio cultural transcende prédios oficiais, igrejas e palácios para incluir imóveis particulares, segmentos urbanos e ambientes naturais de valor paisagístico. Ademais o instituto reconhece a existência de patrimônio imaterial. A partir daí, constrói-se um argumento em torno da incorporação de novos elementos para o conceito.
No Brasil, objetos são vendidos em lugares turísticos: chaveiros, bonés, camisetas e cartões-postais com alguma referência ao patrimônio. O material tem uma facilidade maior para manifestar-se como patrimonial, enquanto o intangível demanda ações mais cuidadosas pelos governos e iniciativas privadas que promovam, respectivamente, a defesa das diversidades culturais e o desenvolvimento econômico.
Falta calibrar a estratégia para que o Brasil seja efetivamente um ator de importância cultural e econômica no mundo enquanto se desperdiça o nosso dinheiro para fazer o ano da França no Brasil em vez de divulgar as nossas culturas naquele país. Mais um absurdo. Nossas canções, danças, filmes e costumes merecem ser conhecidos e compartilhados além das fronteiras, assim como alguns outros países difundem seu patrimônio intangível pelas facilidades dos recursos comunicacionais e eletrônicos.
O Brasil precisa, ao mesmo tempo, consolidar a proteção e a promoção do patrimônio intangível dentro de seu território sem abandonar as políticas a favor daquele entendido como material. O patrimônio não se refere só ao antigo e obsoleto senão ao que representa a identidade de um país interna e externamente. Embora nem tudo possa ser patrimônio, a consideração do intangível traz vários benefícios ao país.
Pensar numa reconceituação do patrimônio implica supor que as visitas aos museus brasileiros se farão não só com canções estadunidenses nos falantes, ou que o descanso nos lares não se dará só em frente a um televisor japonês, ou que o francês não será um idioma mais importante que o português. A noção atual de patrimônio ultrapassa a materialidade e rediscute o cerne da brasilidade.
Bruno Peron Loureiro é bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Estadual Paulista (UNESP).
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