Quinta-feira, 19 de novembro de 2009 - 06h40
Bruno Peron Loureiro
Os prefixos às vezes embaralham as idéias. Convidam-nos a entender previamente o significado da palavra que os segue: anti-capitalista, pós-moderno, superestrutura, supracitado, ultra-conservador. Se os termos vão com ou sem hífen, já é outra história. O tempo nos adaptará às novas convenções sobre a língua portuguesa.
Temo-nos relacionado de uma maneira distante e pré-concebida com a política como se esta rememorasse um bicho de sete cabeças. Sem pretensão de acreditar que a época atual é a-política, em alusão aos que creem eximir-se das relações oficiais de poder, ou pós-política, cuja expressão supõe uma fase posterior de mimetismo incompleto do que um dia este universo de ordenação do poder representou, o que se vê hoje são nuanças de um único fenômeno.
Seria irresponsável de minha parte veicular o tema fora dos conjuntos da arte, a economia, a sociedade, e outros que compõem sua complexidade. Por isso, desenvolvem-se campos do conhecimento como o da cultura política, a economia política, a sociologia política, entre outros. Gosto de traçar paralelos entre inquietações populares e saberes acadêmicos a fim de não redundar num texto maçante sobre tema banal.
A primeira crítica que faço é à desvinculação cultural do cidadão com a esfera de relações políticas, enquanto a mesma não ocorre no patamar de fato. Quer dizer: o dissabor, o descrédito e o afastamento com relação a este âmbito não implica perda de vínculo real dele, uma vez que somos obrigados a votar, pagamos impostos e tributos variados, recorremos frequentemente a serviços públicos e, vez ou outra, reclamamos de alguma ação mal prestada.
A outra crítica é ao nosso despreparo em ser cidadãos. Em síntese: não sabemos ser cidadãos. A maioria da população desconhece as garantias jurídicas mínimas, é incapaz de reivindicar direitos e, quando o faz, busca recursos que não foram oferecidos pelas instituições de governo. O diálogo com secretários municipais através de cartas em jornais e a crença de que um governante deve prover tudo são exemplos do descompasso a que me refiro.
Quando escrevo algo sobre política, já o faço com a intenção de esclarecer pontos nebulosos e a ressalva de associá-la a outras esferas, como a cultura. Cada vez que o lápis é meu cúmplice neste assunto, sinto o afã de redirecionar o que entendemos por política. Há um movimento grande para deslegitimá-la, ausentar-nos de nossos direitos e deveres, e recrudescer a influência do mercado em relações que este não está preparado para mediar.
É confortante ser cidadão, saber exercer esta prerrogativa e conhecer o seu alcance e seus limites. A política com cidadania é o que todos os brasileiros teríamos o prazer de nutrir, reverenciar e sustentar. Ao contrário, uma política sem cidadania é vazia e dela não tiramos proveito como habitantes de uma nação moderna. É cedo usar os prefixos “a” ou “pós” quando ainda não se entende nem se usufrui do sentido de “política”.
Bruno Peron Loureiro é mestre em estudos latino-americanos e analista de relações internacionais.
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