Quinta-feira, 13 de setembro de 2018 - 07h07
Todo ano de campanha política é a mesma ladainha: a rodovia Álvaro Maia ou BR- 319, que liga Porto Velho e Manaus finalmente vai sair do papel e voltará a existir. Tolice, bobagem, conversa para boi dormir, sonho inatingível, lengalenga inútil. Sem nenhuma importância para o desenvolvimento do país, a esquecida estrada cortando o coração da Amazônia já existiu de fato. Inaugurada em 1976, mas sem nenhuma manutenção, ela resistiu só até o início dos anos 80 e hoje se transformou num lamaçal intransponível durante o período de chuvas do rigoroso inverno amazônico. Os dois governos estaduais e o governo federal sempre fizeram pouco caso da sua existência, por isso ela desapareceu. O seu reaparecimento, no entanto, seria a repetição de um erro que pode trazer seriíssimas consequências ambientais para toda a região que ela corta.
Se a velha estrada não tem nenhuma importância para o Brasil, para a região Norte é igualmente desnecessária. O Amazonas praticamente nada produz em termos de agropecuária e a pouca produção de Rondônia pode ser escoada pela BR-364 em direção ao sul do país. Gastar bilhões de reais para reativar uma estrada fantasma apenas para transportar farinha d’água e peixe Jaraqui é uma insensatez sem tamanho que vai de encontro a toda e qualquer teoria macroeconômica. Isso sem falar que temos o melhor meio de transporte em uso: os rios da região, cuja extensão entre as duas capitais é totalmente navegável. Rasgar a floresta para reativar um caminho que liga “o nada a coisa alguma” é simplesmente decretar a morte de toda a Amazônia brasileira. Com a “Trans-Jaraqui”, em pouco tempo nenhuma árvore será mais vista em seu longo trajeto.
Fala-se que o atual govenador do Amazonas, Amazonino Mendes, não tem nenhum interesse nessa rodovia uma vez que ele seria dono de várias empresas de navegação. Além do mais, os manauaras e os amazonenses de um modo geral não querem se ligar a Rondônia nem ao restante do Brasil. Se quisessem, não teriam gasto um bilhão e trezentos milhões de reais para construir uma ponte ligando Manaus ao Cacau Pirera e a Iranduba do outro lado do rio Negro. Uma ponte entre Manaus e o Careiro da Várzea e consequentemente à velha rodovia, teria tirado há tempos a capital do Amazonas do isolamento. Mas ninguém lutou para isso. Sem essa ponte, as duas cidades continuariam sem nenhuma ligação por terra, uma vez que sempre haverá a necessidade de uma balsa para cruzar a área do encontro das águas próxima a Manaus.
Decretar o fim da Amazônia e de todas as suas riquezas naturais somente para satisfazer a vontade de meia dúzia de turistas pobres é o fim da picada. Tolice por tolice já existe uma ponte aqui que não tem nenhuma serventia mesmo. Chega de gastar dinheiro à toa. E quem teria coragem de dirigir 12 ou 14 horas apenas para tomar banho de rio? Essa idiotice nós já fazemos aqui há tempos. Humaitá já sobrevive em função de Porto Velho e duvido que alguém de bom senso queira se ligar à “capital da sujeira”. Reconstruir a 319 seria a indução talvez ao maior crime ambiental de que se tem notícia. As ONG’s ambientalistas do Brasil e a opinião pública internacional deviam se movimentar para evitar mais esse desastre ecológico. A pavimentação da BR-364, por exemplo, além da enorme devastação ambiental e dos problemas que causou, resultou na burrice que é conhecida hoje por Rondônia. E quem precisaria errar mais uma vez?
*É Professor em Porto Velho.
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