Quarta-feira, 13 de abril de 2022 - 12h01
A gente sempre dá muito valor à
fala, ao silêncio, mas pouco se tem dito sobre a arte de ouvir. Falar é fácil. Difícil é saber escutar e usar o silêncio
na hora certa... Segundo a professora doutora Daniela do Lago, escutar é uma
arte, porque nem todo mundo sabe como escutar de verdade. Escutar é processar o
que se está escutando, dar um significado, e fazer um esforço para tentar
compreender, e até mesmo se sentir no lugar do outro, a partir daquilo que está
sendo compartilhado.
Já que estamos
em período de eleição, gosto de contar uma piada envolvendo a fala de um
político e a compreensão do eleitor. Esta piada é engraçada e instigante,
porque pode ser contada em qualquer parte do Brasil: um candidato a deputado,
querendo se aproximar do seu eleitorado, mandou armar um palanque sobre um
gramado, na beira de um igarapé da sua cidade natal, e quando chegou a vez dele
se dirigir ao seu público interiorano, possíveis eleitores, ele começou:
− Quando
vejo esta grama verde eu me lembro da minha mãe!
Um eleitor,
cuidador de um pequeno haras, estranhou aquela fala e, do alto da sua
ignorância genética, indagou em voz alta:
− Ela era
égua?
E de imediato
recebeu a resposta em voz alta:
Era não,
filho da puta, era lavadeira!!!
Desfez-se
naquele instante o elo de ligação que havia entre a intenção do candidato e a
possibilidade de receber um voto daquele eleitor, xingado de filho da puta, e
de outros, incomodados com o desfecho do diálogo político. A gozação foi
tamanha que restou ao pretenso político, reunir seus adeptos e se dirigir a
outra freguesia. Nunca mais associará sua mãe à grama verde!
Outro político
que fez história, aparecendo por poucos segundos na TV, ciente de que todos já conheciam
a história da sua vida, foi o Dr. Enéas Carneiro, acreano e Deputado Federal
por São Paulo, que se candidatou a presidente da República. MEU NOME É ENÉAS!
Não ganhou a eleição porque o brasileiro adora ser enganado A gente
sabe que na política, terreno fértil da demagogia e do populismo, competência
não vale nada. Quanto mais longo o discurso político, mais estúpido será. Hoje
basta um candidato abrir a boca, que o povo processa as palavras na audição e
responde em silêncio: mentiroso! Ainda assim votará no meliante, porque
faz parte do jogo o toma lá da cá.
Quem não é
político está estarrecido com a história dos pastores que trocaram os votos do
seu rebanho por milhares de reais ou até mesmo por barras de ouro. Não só os
pastores são corruptos, também os católicos são velhos praticantes do toma
lá dá cá. Comparados à nata da igreja católica, os pastores evangélicos são
meros trombadinhas. Corrupção material e moral é uma prática comum no meio
religioso, onde o pobre coitado pensa que o pastor, o bispo, o apóstolo, o
cardeal ou o padre, são enviados de Deus. Um bom pastor deveria reverberar as
palavras do mestre Rubem Alves: Deus é a beleza que se ouve no silêncio.
Se o Brasil
fosse politicamente um país sério não gastaria bilhões com a propaganda
política. Nas eleições majoritárias, bastava gritar, no horário político,
diante da TV e das mídias sociais: meu nome é Lula, meu nome é Bolsonaro,
meu nome é Ciro, ao lado dos respectivos números, que nossa audição
cerebral processaria as informações necessárias ao exercício do voto.
Em Rondônia,
cuidado para não gritar: Meu nome é Marcos, para não cair no
mundo da dúvida: o Rocha ou o Rogério??? Meu nome é Expedito, qual
dos dois, o filho ou o neto??? Meu nome é Mariana, a descendente
de D. Maria Ana de Áustria ou a filha do Aparício?
“Escutatória” é
o título de uma aplaudidíssima crônica de Rubem Alves que massageia nossa
reflexão: Todo mundo quer aprender a falar, mas ninguém quer aprender a
escutar! Nunca vimos anunciado um curso de "escutatória". Se
existisse esse curso, provavelmente ninguém iria se matricular...
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