Alex Solnik / Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão" e "O domador de sonhos"
Há 33 anos os generais de quaisquer estrelas (na ditadura aprendemos que cinco é a graduação máxima) vinham se comportando de acordo com a constituição, deixando a seara política para os civis.
Foram anos de razoável estabilidade política só quebrada a partir de 2013 com protestos da nova direita nas ruas contra o governo de esquerda de Dilma Rousseff e mais uma vez abalada em 2014 com a eclosão da Operação Lava Jato.
Quando a direita tomou o poder por meio de um impeachment sem crime de responsabilidade e utilizando meios inconfessáveis, em 2016, e implantou uma agenda retrógrada e desastrosa dos pontos de vista político, econômico e social, aqui e ali começaram a pipocar vozes da caserna expressando opiniões políticas.
Muito timidamente, no início, mas de forma “lenta, gradual e segura”, como Geisel se referia à abertura da ditadura militar nos anos 70.
Até que Temer, na ressaca do carnaval em que ficou conhecido como Vampirão no desfile das escolas de samba, entregou o Rio de Janeiro a um general.
O ápice da ofensiva dos generais rumo à ribalta política e a retomada do poder deu-se ontem.
Tido e havido até então como moderado e respeitador da constituição, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas praticamente enquadrou os ministros do STF ao dizer que não tolera impunidade, no mesmo dia em que dois generais da reserva afirmaram que a depender do que o STF decidir o Exército não terá outra opção senão intervir à força e ele sequer os repreendeu.
O general Villas Boas alinhou-se aos que almejam impor uma nova ordem no país, revogando a presunção de inocência, uma cláusula pétrea e principal pilar de sustentação da constituição de 1988, que restabeleceu a democracia ao garantir os direitos fundamentais do cidadão suprimidos pela ditadura de 64.
Não há dúvida quanto a isso, a considerar os aplausos que mereceu de defensores do retrocesso, como o juiz Marcelo Bretas, que desejam a prisão após condenação em segunda instância, ao arrepio da lei maior da nação.
Nenhum poder tem o direito de enquadrar outro numa democracia, principalmente em se tratando de um poder que dispõe de tropas e de armas e o general sabe disso muito bem. Ocorre que lhe pareceu oportuno correr o risco de transpor a fronteira.
Um presidente da República não deveria tolerar tal comportamento, que representa uma séria ameaça à ordem democrática e, portanto, ao seu mandato.
O pronunciamento do general Villas Boas, tão inconstitucional quanto a ideia que ele e os movimentos de extrema-direita defendem deverá ser respondido à altura pelos ministros na votação de hoje do habeas corpus preventivo de Lula dentro do que estabelece a constituição.
Caso contrário, permitirão interferência externa indevida de outro Poder em suas decisões que devem ser autônomas e independentes e darão aval à intervenção militar no STF, com todas suas previsíveis e trágicas consequências.