Quinta-feira, 8 de junho de 2017 - 07h01
Por Luis Nassif, no jornal GGN
Michel Temer mente tão desbragadamente, que transforma em pecado capital até mentiras desnecessárias.
Para pegá-lo em mentiras, não há necessidade de engenho, nem de arte. Basta apontar uma suspeita, esperar o desmentido e apresentar a prova ou testemunho.
Confira no que ele transformou um episódio de carona em jatinho:
1. Informa-se que ele e família viajaram para Comandatuba no jatinho da JBS, quando já era vice-presidente. Uma falta média.
2. O Palácio nega qualquer viagem. Sustenta que a única viagem na época foi em avião da FAB. Apresentado o plano de vôo da aeronave, volta atrás. Foi a primeira mentira.
3. Admite, então, que voou, mas sem saber o nome do dono do avião. Além de mentiroso, revela-se tolo.
4. Em sua delação, Joesley Batista contou que Marcela Temer foi recebida com flores despertando ciúmes em Temer. Para aplacar a ira de Otelo, o comandante informou que foi presente da mãe de Joesley. Temer telefonou então para a matriarca para agradecer. Passou por duplamente mentiroso e duplamente tolo.
Peça 2 – os tsunamis pela frente
Tudo isso acontece antes da delação de Rodrigo Loures Júnior, do doleiro Lúcio Funaro e provavelmente de Eduardo Cunha, antes de se saber mais detalhes das delações não divulgadas da JBS e antes do STF (Supremo Tribunal Federal) julgar a nomeação de Moreira Franco e, derrubando-a, se tornar mais um candidato à Papuda. Sem contar a delação de Antonio Pallocci, que poderá provocar um furacão no sistema financeiro.
Quem aposta que Michel Temer ficará até o fim do interinato? Ninguém. Sua frase altissonante - "só se me matarem" - é ridícula. Basta mostrar que é desonesto e que mente.
O governo tem reagido com um festival de factoides. Ontem, mesmo, fontes do Palácio acionaram seus jornalistas para espalhar que Rodrigo Janot tinha pedido autorização para colocar escuta ambiental no Palácio. O factoide não durou uma hora. Passou por dois repórteres oficialescos e se perdeu nas brumas da fantasia.
É questão de tempo para o Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot denunciar Michel Temer. Aí a bola passa para o Congresso, que precisa autorizar por 2/3.
Parte do Congresso foi comprada pela camarilha de Temer. São deputados montados em aparelhamento de cargos públicos, em negócios com leis, à luz do dia, e com a cabeça a prêmio se perderem o poder.
Como será resolvido o impasse? O STF (Supremo Tribunal Federal) vai enfrentar? O Congresso vai reagir?
Peça 3 – as vozes dos quartéis
Vive-se um quadro de ampla desordem institucional, um tiroteio sem fim entre o Executivo, Congresso, Ministério Público, Supremo, Tribunal Superior Eleitoral, acirrado pela reforma trabalhista e da Previdência. Externamente, uma indignação popular que se alastra, que já resultou em uma greve geral, resultará em outra.
A grande incógnita é como o único poder silencioso – o militar – se manifestará.
No comando das Forças Armadas se tem um militar legalista, o general Eduardo Villas Boas. No Gabinete de Segurança Institucional outro nem tanto, o general Sérgio Etchegoyen.
As discussões políticas internas, que se consegue acompanhar em alguns sites especializados, mostram dois temas bastante sensíveis à corporação: a corrupção e os resquícios da guerra fria.
Recentemente, foi divulgada a reunião do Comandante do Exército com representantes de alas político-militares, os generais da reserva Alberto Cardoso, ligado ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Augusto Heleno, que sempre defendeu protagonismo maior das Forças Armadas, Bolívar Goellner, ligado a Etchegoyen e o general de divisão Rocha Paiva, teórico militar.
Os conceitos de "guerra híbrida” já foram assimilados pelos estrategistas militares. Sabe-se que há movimentos internacionais que, através de redes sociais, provocam burburinhos populares, as chamadas primaveras, e que por trás há posições nitidamente antinacionais, interessadas no pré-sal, na derrocada das empresas brasileiras, na venda das terras a estrangeiros.
Os diagnósticos divergem quanto às motivações.
Parte dos analistas entende se tratar de movimentos conduzidos por grandes corporações e governos estrangeiros ligados ao grande capital. Parte vê traços da influência russa e dos chamados países bolivarianos.
Em uma dessas análises, o observador juntava os quebra-paus em Brasília com as denúncias aos organismos internacionais de direitos humanos e a supostas ofensivas diplomáticas de vizinhos bolivarianos. Dizia que 24 de maio marcou oficialmente o início da guerra híbrida.
Nota-se que ao pouco conhecimento que o mundo externo tem da corporação militar, corresponde o pouco conhecimento da corporação sobre o mundo externo.
De todo modo, é esse tipo de sentimento que explica a ideia fixa do ex-chanceler José Serra e de seu alter ego Aloysio Nunes Ferreira, de insistir na guerra diplomática com a Venezuela.
Não se trata meramente de condenar o governo venezuelano, mas de conduzir uma cruzada, transformar em tema único da diplomacia brasileira. Em parte, se explica pela absoluta carência de conhecimento e de projeto diplomático. Mas, seguramente, o que mais pesa é a tentativa de se aproximar de segmentos militares anti-bolivarianistas.
Ao estimular a Lava Jato, foram devorados pelas investigações. Mas a síndrome do escorpião não os abandona.
Ainda há carência de informações para um diagnóstico mais preciso sobre os rumos dos ventos na caserna. Mas, como em política não existe o vácuo, não custa prestar atenção.
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