Quarta-feira, 10 de dezembro de 2008 - 15h46
* Por: Altair Santos (Tatá)
O cara começou 2008 no maior pique. Prometeu ir pra academia, cuidar da saúde, voltar-se mais pra Deus, ser mais generoso, ajudar os pobres, trabalhar muito e ganhar muito mais, fez votos disso e daquilo. Nascia ali, um projeto de nova pessoa. Tanto planejou que, o curso de 2008 seria pouco para as transformações. O ano, como partícula móvel do tempo, foi, ao sopro do vento, transcorrendo célere, implacável no dia após dia, hora após hora, segundo após segundo, embalando o sujeito na passarela do viver. Lá no início do ano, animado pelos clarins da folia de momo, o estratégico folião entre goles e marchinhas, confetes e serpentinas dizia em pensamento pro seu próprio eu: tudo bem, agora é carnaval, depois a coisa vai mudar! Sucediam-se os meses e o novo homem não saia do papel, ou melhor, do pensamento. Chegou a Semana Santa. Àquela altura, já inseguro quanto às suas atitudes inovadoras, danou-se a pedir a Deus. Foi na Missa e na procissão, acendeu velas, rezou de joelhos e saiu dali, movido pela fé, ao encontro daquele tão sonhado homem novo que ele não fez nascer. Foi ao cinema e assistiu a um filme de superação. Se viu nas cenas, mas não conseguiu, consigo mesmo, entrar em cartaz e protagonizar o enredo da sua própria volta por cima. Já era quase meio do ano e, avistando em cores vivas um projeto em naufrágio revoltou-se, ficou injuriado, se viu em desgraça, bebeu todas, consultou os búzios e os baralhos, jogou culpa em tudo e todos, reclamou do governo, achou que o infortúnio da sua fracassada nova identidade fosse coisa do satanás e tentou sabrecá-lo numa dessas ardentes fogueiras santas e exortá-lo numa sessão de descarrego. Não conseguindo, chamou poderosas correntes com mais mil pastores, foi-se o dízimo e ficaram de plantão os intrépidos capetinhas. Nem precisou muitas contas pra fazer desfolhar por sobre a sua cabeça a árvore das duplicatas, promissórias e cartões vencidos. Sem bússola que lhe apontasse um norte, sentiu-se um José, tipo aquele do poema do Drummond e se fez um incerto chutador de latas a vagar numa alameda mal iluminada chamada Final de 2008. Mas a vida parar ali, seria injustiça das maiores. No dia 2 de novembro (finados), foi ao cemitério, acendeu velas no Santo Cruzeiro e simbolicamente no imaginário enterrou o seu eu inoperante do ano passado e foi pra casa. Lá, enquanto descansa da árdua jornada e se delicia previamente com os quitutes do cardápio natalino, o reflexivo cidadão viaja no pouco de paciência e lucidez ainda em estoque: respira fundo, faz uma pausa... olha para trás e para frente, franze a testa em semblante compenetrado, saculeja os ombros (como quem sacode a poeira) e, sorridente, abre a folhinha de 2009 garimpando nos meses do ano vindouro os feriados, dias santos e datas comemorativas pra juntá-las aos sábados e domingos, replanejando mais um ano de notáveis transformações. Tim! Tim!
*O autor é músico e Vice-Presidente da Fundação Iaripuna
tata.anjos@bol.com.br
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