Quarta-feira, 5 de abril de 2023 - 09h42
O principal item de consumo da família, quase
um complemento da casa, é o fogão a gás.
Se você toma conhecimento de que uma pessoa de
baixa renda vai casar é porque, com certeza, ela conseguiu comprar o
fogão. Aí começa a se delinear o problema do custo do gás.
O encarte dos descartados permitiria, naturalmente,
que eles auferissem remuneração suficiente para o custo da alimentação, que
inclui o preparo e o cozimento, portanto, a utilização do
gás, mas a situação econômica ainda não chegou a essa fase. Os efeitos da
pandemia ainda pairam como uma sombra sobre a atividade econômica e as
perspectivas ainda não são claras. O preço do gás de cozinha (o também chamado
GLP – gás liquefeito de petróleo) tende a aumentar.
Claro que se trata de um dos grandes bens de que
dispõe a sociedade e que, muitas vezes, pode passar sem ser notado (a não
ser quando ocorre algum vazamento...).
Se parássemos para pensar em quantas
dificuldades havia para a atividade tão trivial de cozimento dos
alimentos, antes do GLP, poderíamos atribuir-lhe o seu verdadeiro valor.
Pois bem, um dentre os itens a ser examinado de
forma duradoura pela reforma tributária será o da incidência sobre os
bens de consumo dos grupos vulneráveis. Em contrapartida, deverá
ser revista a incidência sobre os mais aquinhoados. Enquanto esse momento
não chega, é de ser mantido o programa do auxílio gás, destinado às
famílias de baixa renda.
Muitas famílias pobres, cerca de cinco e meio milhões delas,
estarão aptas a receber o auxílio gás, que acaba de ser reajustado. Para
tanto, é necessário que estejam inscritas no CADÚNICO, que bem
deveria ser o veículo de todas as iniciativas sociais das várias esferas
de Governo.
Fazem jus ao auxílio gás as famílias com renda per capita de
meio salário-mínimo. A cada dois meses o beneficiário recebe a
quantia correspondente, que equivale ao valor médio de um botijão de gás,
na conta digital que tiver cadastrado.
Dezesseis anos passados desde a morte de Dom
Luciano Mendes de Almeida, e já em andamento a fase romana da Beatificação
desse bispo, vale recordar algo que ele contou inúmeras vezes: ao
encontrar-se nas ruas da cidade com os descartados, estes não pediam
alimentos, passagens ou remédios, pediam que lhes comprasse um
botijão de gás.
Porque não se incluir o GLP na cesta básica,
proposta que, de quando em vez, é formulada por aí?
Deixei para o final deste breve escrito a
razão justificadora do título que lhe dei: o gás para os descartados. É
que boa parte dos programas sociais existentes segue o mesmo padrão que
esse. São louváveis, claro, mas não cuidam do projeto maior da inclusão
social. Atendem pontuais demandas dos descartados como que tentando mantê-los
à tona na maré montante das inumeráveis tragédias que os atingem quase
cotidianamente.
E a política social que encarte os descartados? E o compromisso estampado
na Constituição do Brasil com a erradicação da pobreza e da
marginalização? E os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, com sua
abrangente pauta de inclusão? 2030, a data assinalada para o cumprimento
de tal magno programa é depois de amanhã!
Wagner Balera
Coordenador do Núcleo de Estudos de Doutrina
Social, Faculdade de Direito da PUC-SP.
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