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'O juiz deve ter compostura'


 

HÉLIO FERNANDES
www.tribunadaimprensa.com.br


Desperdiçou tempo, desgastou o repórter, desinformou o leitor. Foi isso o que o ministro Gilson Dipp conseguiu com pretensiosa e suposta transparência em entrevista concedida a "O Globo".

O magistrado, corregedor do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) pretendeu examinar e expor os erros da Justiça. Mas falhou inteiramente pelo fato de usar óculos bifocais com as lentes trocadas.

Assim, não viu nada ou viu tudo deformado. Textual: "Não tenho constrangimento em investigar ou condenar colegas". Como corregedor do CNJ está acima do presidente desse órgão, ministro Gilmar Mendes? Falou muito em transparência, mas tudo em volta ficou na mais completa escuridão.

Toda a entrevista do ministro-corregedor se enquadra, vá lá, se enquadraria, na disputa do juiz De Sanctis com o ministro Gilmar Mendes. Gilson Dipp falou muito em corrupção, mas especificamente, no caso, passível de corrupção, só mesmo Daniel Dantas.

Que foi aliás, quem provocou todo o desequilíbrio do sistema, por causa do seu relacionamento com Gilmar Mendes, quando este era advogado geral da União.

Se não existe crime de corrupção, e não há mesmo, aparecem incoerências, contradições, privilégios e favorecimentos. O juiz De Sanctis mandou prender Daniel Dantas, era obrigação. Gilmar Mendes mandou soltá-lo, seria um direito, excluído naturalmente o relacionamento entre o ministro e Daniel Dantas.

Com novas provas (como afirmou) o juiz prendeu Dantas pela segunda vez, Gilmar soltou-o outra vez. O fato era tão estranho, o Supremo estava em recesso. Voltando, um ministro "leu" manifesto a "favor" de Gilmar, sem assinatura ou unanimidade. Gilmar presidiu a sessão "do louvor", tão constrangido, que imediatamente encerrou a sessão.

As incoerências do presidente do Supremo não pararam mais. Com o Supremo em recesso, foi a Fortaleza por um dia, numa viagem que parecia misteriosa. Mas que eu desvendei, revelei e expliquei.

Na terceira intervenção, o bravo juiz de primeira instância condenou Daniel Dantas a 10 anos de prisão. Mas cometeu um equívoco, descuido, desatenção: não determinou a prisão de Daniel Dantas. Poderia e deveria ter feito isso, e aí Gilmar Mendes não teria condições de interferir.

O ministro Dipp acerta em cheio: "Nenhum juiz tem que criticar decisão do outro. Existe um sistema processual que deve ser utilizado e ponto final". Magnífico, crítica velada e ao mesmo tempo aberta ao presidente do Supremo.

O juiz De Sanctis representa uma instância. Habeas-corpus não é instância e sim recurso eventual. Se De Sanctis tivesse mandado prender Daniel Dantas depois da sentença, ele ficaria preso até o caso ser examinado na instância superior. (Que é o Superior Tribunal de Justiça, ao qual pertence o próprio Gilson Dipp.)

O repórter pergunta sobre corrupção entre juízes, o ministro responde com sabedoria: "São falhas de caráter". Então é preciso reformar o sistema judiciário para evitar "essas falhas de caráter".

Existe um exemplo perfeito e irrefutável: o que acontece na Corte Suprema dos EUA. Lá a prioridade dos processos e a pauta diária do tribunal, não são organizadas pelos juízes (lá não existe ministro, todos são juízes) e sim por Oficiais de Justiça. Estes estão imunes à corrupção?

Evidentemente que não. Só que os 9 juízes não podem ser punidos, os Oficiais de Justiça, se cometerem desvios de conduta, são demitidos e presos. Não têm imunidade.

...

PS – No final, o ministro Dipp merece elogio franco: "Os juízes devem ter compostura". Passar o Natal na casa do advogado de Daniel Dantas, como fez o ministro Gilmar Mendes, é prova de "boa conduta?"

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