Quinta-feira, 6 de outubro de 2011 - 05h49
1. Quando cheguei à Rondônia, ainda alcancei o movimento nos seringais. Gente que vivia na floresta, com família, sozinhos, extraindo látex em suas “colocações”. O que mais recordo é do apego que tinham a suas lidas permanentes. Honório tinha uma caligrafia linda. Letras desenhadas na rotina dos livros de anotações. Idoso e dado a uns goles de cachaça, mesmo assim, não perdia a linha da escrita. O seringueiro recebia a mercadoria e cedia o produto. Cícero Cabeça de Pato era comprador de borracha, também chamado de “marreteiro”. Honório era um verdadeiro contador à moda antiga. Era o “noteiro”. Perlas de borracha ou bolas vinham dos Seringais Massangana, Bom Jardim, Santa Cruz, Escalvado, Canaã, Boa Vista, Garapeira, Cujubim. Raimundo Seringueiro, ali na boca da Linha C-100, perto da Fazendinha, ainda está lá, resistindo no apego de uma vida inteira de compras e vendas. Rosália com o peito cheio de medalhas e fitas, também aparecia na Vila de Ariquemes a cada 120 dias para renovar compras e depois sumia com sua família enorme. Hoje reside em Manicoré. Cuidei deste povo e desta gente por anos a fio.
2. Como Anésio não havia ninguém. Memória admirável. Negro, alto, magro, sereno, elegante, tudo para ser um mestre, contava histórias, roda de gente se formava para ouvi-lo. Ele ia contando, dizendo datas, dias, uma precisão incrível, subia a voz, exaltava, mornava a entonação, um ator de verdade. Era contador de histórias. Chegou a dar palestras nas faculdades de Ariquemes e sempre aplaudido de pé. Mais de 80 anos, ainda ágil, subia escada, tirava goteira, puxava água no poço, estas coisas da lida. Uma ironia, sei lá, achou pouco viver na terra, e consertando o teto da casa, lá em cima, sem queda, sem trauma, sem pancada, de uma vez, desligou-se da vida como se desliga uma lâmpada. Um clique e morreu no telhado, talvez querendo chegar mais rapidamente ao céu.
3. Quem tiver curiosidade de saber destas histórias, basta visita o Bairro Marechal Rondon em Ariquemes, ou dar uma voltas pela periferia de Porto Velho ainda irá encontrar muita gente que viveu nos seringais. E que se lembram da vida difícil de vencer estirões de carreadores no meio do mato, carregando cargas, tangendo burros, defumando o látex. Mesmo assim, guardam saudades e lembranças imorredouras.
4. Outro personagem interessantíssimo, era o “gateiro”. Este era matador de onça ou gato do mato. Justamente para vender a pele. Sumiam no floresta, a gente esquecia deles, de repende apareciam com dezenas de couros para vender e trocar. Sussuarana, onça pintada, jaguatirica. E assim viviam às soltas pelas imensidões verdes rondonienses.
4. Ninguém mais ouve falar do “caucheiro”. Desta árvore, o “caucho” o seringueiro não sangrava a casca, formando o rego de escorrer a seiva branca. A árvore era derrubada e encerrava o ciclo. Por isso que ninguém mais ouve nem falar no caucho. Que foi junto com a seringueira importante na economia daqueles tempos.
5. A gente tem muita lição ainda por aprender. Sobre o cacau e seringueira. Na floresta, de certa forma protegida ela sobrevive e deu para colocar em evidencia um ciclo economico poderoso. O ciclo da borracha. Mas, plantadas por cultivo não prosperou como se esperava. Os fungos reduziram vidas e produções das plantas. Mas, tem gente em Rondônia que vive da extração da borracha e do plantio do cacau. Eles aprenderam a driblar a doença ou conviver com ela. Como uma micose na unha, não mata, o pé fica feio, mas, dá para se viver com ela. O que mais se aprende que se deve manejar a roça e fortaleçar a árvore com bastante vitamina e fortificante. Assim, como uma pessoa bem alimentada se torna mais resistente às doenças.
6. Hoje, no meu blog o texto é este. Só amenidades. Isto porque não falei dos garimpeiros, faiscadores de pedras semipreciosas, dos enfermeiros milagrosos e mais tarde dos toreiros.
Fonte: Blog do Confúcio
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