Segunda-feira, 30 de julho de 2007 - 14h51
PF nunca recebeu dados sobre aviões de traficantes. Sistema de vigilância aérea está sucateado, dizem militares
Na madrugada do dia 21, após a infindável sucessão de dramas no setor aéreo, o país foi surpreendido por um apagão no Cindacta 4, em Manaus, a base do Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam), um projeto de US$ 1,3 bilhão. O problema aprofundou a crise aérea — que já havia sido agravada devido ao acidente com o avião da TAM e ao colapso do Aeroporto de Congonhas — e pôs em evidência as fragilidades de todo o Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam), o mais ambicioso projeto de segurança da região ao qual o Sivam é vinculado.
Depois de todo o investimento, o sistema não tem servido nem mesmo para conter o intenso tráfego de pequenos aviões a serviço do tráfico de cocaína entre Brasil, Colômbia, Bolívia, Peru e Suriname.
— Eles não repassam para nós nenhuma informação sobre aeronaves clandestinas. Nunca repassaram — afirma o coordenador de Operações Especiais de Fronteira, delegado da Polícia Federal Mauro Spósito.
Faltam recursos para manutenção de radares Segundo o policial, a frota narcotráfico circula livremente na região. Alguns aviões só são interceptados a partir de denúncias ou de investigações da própria PF. É o mesmo modelo antiquado e ineficaz de combate ao tráfico que existia antes do Sivam.
A promessa original do sistema, centro da primeira crise no governo do ex-presidente Fernando Henrique, era reforçar a vigilância aérea e golpear duramente o comércio da cocaína na região, dependente quase que exclusivamente de numerosa frota de pequenos aviões.
As queixas de Spósito são ampliadas por militares que estão em postos de comando na região.
Segundo um deles, o Sivam não dispõe de recursos nem para a manutenção de alguns radares.
Equipamentos estariam abandonados no meio do mato.
Esse militar, que falou com O GLOBO com a condição de não ter o nome divulgado, diz que os problemas são graves e expõem, de fato, as brechas do sistema de defesa nacional. O Sivam seria uma espécie de quartel-general de proteção da Amazônia em tempos de globalização.
— Não há dinheiro para nada.
As estruturas estão sucateadas.
Tem radares abandonados no meio do mato. Estou muito preocupado. O Sipam, que era voltado especialmente para a proteção do meio ambiente, está realmente comprometido em relação ao que imaginávamos — afirma o general .
Para a polícia, o mais grave é que os radares do Sivam (ou Cindacta 4) não conseguem identificar aviões abaixo de seis mil pés de altura. A cobertura dessa faixa do espaço aéreo teria que ser feita por três aeronaves de vigilância. Mas o aviões foram levados para a Base Aérea de Anápolis, em Goiás, bem distante da região da fronteira com a Colômbia, onde estão as principais rotas do narcotráfico. Com isso, os aviões do narcotráfico não encontram dificuldades para transitar pela Amazônia. Aeronaves e barcos são os principais meios de transporte da região.
— Temos bloqueado o tráfico pelos rios, mas não pudemos fazer o mesmo em relação ao espaço aéreo — diz Spósito.
Procurado pelo GLOBO, por intermédio do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica, o comandante do Cindacta 4, coronel Eduardo Antonio Carcavallo Filho, não retornou as ligações. Em recente depoimento à CPI do Apagão Aéreo da Câmara, o coronel disse que os equipamentos sofrem constante manutenção e que o problema é de falta de pessoal — tanto de controladores como de engenheiros. Ele contou que perdeu oito engenheiros para a iniciativa privada.
Nenhuma pista clandestina foi destruída pela PF O diretor Centro Gestor e Operacional do Sistema do Sipam (Censipam), Marcelo de Carvalho Lopes, disse que o sistema tem repassado informações à Polícia Federal sobre pistas clandestinas, mas nada comentou sobre o trânsito livre da frota do narcotráfico pelo espaço aéreo da Amazônia. "Com base nesses dados (da Aeronáutica), a equipe do Censipam prepara relatórios de inteligência, indicando, por exemplo, indícios de ocorrências de processos ilícitos (pistas de pouso em unidades de conservação, terras indígenas) e repassa tais dados aos órgãos federais responsáveis pela fiscalização (como a Polícia Federal)", informou em resposta, por e-mails.
A Polícia Federal sustenta que não destruiu uma única pista clandestina até agora com base em informações do Sivam. A Atech (Tecnologias Críticas), empresa contratada para a implantação do Sivam, se exime de qualquer responsabilidade pelas deficiências operacionais do sistema. A empresa argumenta que entregou a estrutura de vigilância em perfeitas condições de funcionamento. A Atech afirma ainda que os equipamentos do Sivam, são sofisticados e estão prontos para oferecer uma grande quantidade de informações aos órgãos federais.
Fonte: O Globo
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