Segunda-feira, 16 de outubro de 2023 - 16h00
Brasília - “Não
existe final feliz com o trabalho infantil doméstico”. Esse é o tema da
campanha de 12 de outubro – Dia das Crianças – realizada em conjunto por
Ministério Público do Trabalho (MPT), Justiça do Trabalho, Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE) e Organização Internacional do Trabalho (OIT),
com apoio do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho
Infantil (FNPETI), para enfatizar a importância de se combater o trabalho
infantil doméstico, considerado uma das piores formas de trabalho infantil e
que, por ser extremamente invisibilizado e naturalizado, é de difícil
fiscalização.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (2019), 84 mil crianças e adolescentes são vítimas do trabalho
infantil doméstico no Brasil, realizado, em sua maioria, por meninas (85%),
negras (70%) e adolescentes de 14 a 17 anos (94% do total), em atividades
voltadas aos cuidados de crianças (48,6%), executando serviços domésticos
(40,3%) e em cuidados pessoais em domicílio (5,3%), de acordo com pesquisa do
FNPETI de 2019.
A campanha, iniciada hoje (12) nas redes sociais
das instituições, conta a história de Maria, uma menina pobre que saiu do
interior do país em busca de melhores condições de vida e acabou indo trabalhar
na casa de uma família em outra cidade.
A história descortina a realidade por trás das
promessas de melhoria de vida e do falso discurso de pertencimento à família
empregadora. A história de Maria, infelizmente ainda comum a tantas meninas
brasileiras, escancara a realidade do trabalho infantil doméstico: longas
jornadas de trabalho; exposição a abusos físicos, psíquicos e até mesmo sexuais;
condições análogas à de escravo; afastamento da família e da convivência
comunitária; e violação aos direitos à educação e ao lazer.
A campanha pretende disseminar a informação de que
o trabalho infantil doméstico é uma grave violação de direitos, que reproduz o
ciclo de pobreza e rouba a infância plena e a perspectiva de futuro.
A coordenadora nacional de Combate ao Trabalho
Infantil e de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes
(Coordinfância) do Ministério Público do Trabalho, Luísa Carvalho
Rodrigues, afirma que “A campanha de conscientização lançada, com o mote
‘trabalho infantil doméstico não tem final feliz’, é uma importante iniciativa
conjunta de vários órgãos que compõem o Sistema de Garantia de Direitos das
Crianças e Adolescentes, no intuito de trazer visibilidade à essa grave
violação de direitos e erradicar o trabalho infantil. É um chamado à sociedade
para ajudar na transformação dessa triste realidade.”
Segundo a vice-coordenadora nacional da
Coordinfância, Cláudia de Mendonça Braga Soares “De fato, um dos grandes
desafios do combate ao trabalho infantil doméstico é retirá-lo da
invisibilidade dos lares, onde essa violação a direitos é silenciosamente
praticada, e trazê-lo à superfície, aos números oficiais, possibilitando proteção
social a milhares de crianças e adolescentes, especialmente a tantas Marias
desse Brasil, meninas negras, inseridas em famílias de baixa renda, a ter uma
infância digna. Trazer o tema à discussão no Dia das Crianças é oportunizar a
reflexão da sociedade de que existem diversas infâncias, vivenciadas de formas
diferentes, a merecer proteção integral.”
O ministro do Tribunal Superior do Trabalho Evandro
Valadão, coordenador nacional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de
Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, reforça a necessidade e união
de instituições e sociedade para combater uma das formas de trabalho infantis
mais comuns no Brasil. “O trabalho infantil doméstico é cruel em todas as suas
nuances, pois viola direitos básicos, especialmente de meninas negras, além de
jogar sob a infância e a adolescência responsabilidades que não as pertence”,
disse. “São sonhos que vão morrendo sob uma desfaçatez gerada pela desigualdade
histórica e permanente. Temos um longo caminho pela frente e a Justiça do
Trabalho tem atuado e vai continuar atuando para erradicar essa tragédia social
em nosso país”, completou.
A pobreza persistente, a vulnerabilidade socioeconômica
das famílias e a desigualdade social, potencializadas pela ausência de
políticas públicas impactam diretamente nos casos de trabalho infantil
doméstico.
Para se combater essa grave violação a direitos é
necessária, para além da garantia da educação de qualidade e em tempo integral,
a formatação de políticas públicas intersetoriais de proteção social e geração
de renda, políticas de desenvolvimento econômico, a ampliação de programas de
estímulo e incentivo à aprendizagem profissional, além da efetivação do direito
ao não trabalho crianças e adolescentes.
A coordenadora do Programa de Princípios e Direitos
Fundamentais no Trabalho da OIT, Maria Cláudia Falcão, destaca que erradicar o
trabalho infantil, incluindo o trabalho infantil doméstico, é uma meta assumida
globalmente e de responsabilidade compartilhada no âmbito da Agenda 2030.
"As meninas, meninos e adolescentes que realizam atividades domésticas são
“trabalhadores invisíveis”, pois seu trabalho é realizado no interior de casas
que não são as suas, sem nenhum sistema de controle e longe de suas famílias.
Esta população é provavelmente a mais vulnerável e explorada, bem como a mais
difícil de proteger." disse ela.
“Por isso, precisamos aprimorar as políticas
públicas para conseguir identificar essas vítimas, retirá-las desse tipo de
trabalho e garantir proteção social para que possam retornar à sociedade, ter
seus direitos restituídos e não sejam na idade adulta, trabalhadores e
trabalhadoras vulneráveis ao aliciamento para o trabalho escravo.", acrescentou.
Para o Coordenador Nacional de Fiscalização do
Trabalho Infantil do Ministério do Trabalho e Emprego, o auditor fiscal do
Trabalho Roberto Padilha Guimarães: “O trabalho infantil doméstico, uma das
formas mais conhecidas de trabalho infantil, trata-se de uma violação aos
direitos fundamentais de crianças e adolescentes, com prejuízos ao seu
desenvolvimento físico, psíquico, cognitivo e moral, bem como a sua frequência
à escola. Além disso, crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil
doméstico que acabam expostas a longas jornadas de trabalho e a diversos
riscos, entre os quais: esforços físicos intensos; isolamento; abuso físico,
psicológico e sexual; trabalho noturno; exposição ao fogo; movimentos
repetitivos; tracionamento da coluna vertebral; contato com perfurocortantes;
manuseio de produtos químicos, entre outros. Estima-se que mais de 83.000
crianças e adolescentes estejam submetidos a esta que é considerada uma das
piores formas de trabalho infantil! Precisamos visibilizar esta realidade por
meio de ações de informação, mobilização e sensibilização, e estimular que
estes abusos sejam denunciados”.
Segundo a secretária-executiva do FNPETI, Katerina
Volcov, campanhas de sensibilização sobre temas invisibilizados à população
como é o caso do trabalho infantil doméstico são necessárias a fim de
possibilitar a reflexão crítica de quem ainda faz uso de serviços de mão de
obra infanto-juvenil e de quem ainda considera digno e justo que crianças
trabalhem em suas próprias casas ou na de terceiros. "É praticamente um
costume dizer que as trabalhadoras infantis domésticas trabalham em "casas
de família". Ora, nós não podemos nos esquecer que essa criança ou
essa adolescente tem também sua família. Na verdade, quando uma adolescente sai
de sua casa para ir trabalhar em outra residência, é simplesmente trabalho que
acontece ali, ainda que existam discursos de oportunidades e mobilidade social.
Entretanto, hoje, com os resgates de mulheres envolvidas no trabalho doméstico
em situação análoga à escravidão, observa-se que, muitas delas, foram
trabalhadoras infantis domésticas que, por sua vez, trabalharam nas chamadas
"casas de família". Isso precisa ser modificado urgentemente e essa
campanha visa justamente chamar a atenção dessa triste e violadora
realidade: que crianças e adolescentes que trabalham em serviços de
limpeza ou de cuidado a crianças menores e a idosos, em suas próprias
residências ou na de terceiros, são trabalhadoras infantis domésticas e
trata-se de uma das piores formas de trabalho infantil existentes na
atualidade", finaliza Katerina
Piores formas de Trabalho infantil
O trabalho doméstico é proibido para pessoas com
menos de 18 anos, e é considerado uma das piores formas de trabalho infantil,
de acordo com a Lista TIP, instituída pelo Decreto nº 6.481/2008. A prática
viola os direitos humanos das crianças e adolescentes à educação, à saúde, à
convivência familiar e comunitária, além de acarretar prejuízos ao seu pleno
desenvolvimento físico, psicológico e moral, consistindo em porta aberta para
outras formas de violação, inclusive a sexual.
Ajude a transformar essa realidade!
Denuncie o trabalho infantil doméstico. Disque 100
ou acesse mpt.mp.br e ipetrabalhoinfantil.trabalho.gov.br.
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