A determinação de soltura do ex-presidente Michel Temer foi elogiada pela comunidade jurídica, que viu nela a garantia do trâmite legal do processo e o impedimento de antecipação da pena.
Temer foi preso na quinta-feira (22/3) em investigação sobre propinas da Engevix em operação que é desdobramento da "lava jato". De acordo com os advogados ouvidos pela ConJur, a decisão de Bretas não apresentava fundamentos, além de ser baseada em fatos antigos.
Os advogados dizem que o desembargador federal foi assertivo ao reconhecer a ilegalidade da prisão. Alguns profissionais também demonstraram preocupação com os elogios "demasiados" do magistrado ao juiz e à operação "lava jato".
O advogado Eduardo Carnelós, que atuou na defesa de Temer, considerou que a decisão "merece o reconhecimento de todos os que respeitam o ordenamento jurídico e as garantias individuais inscritas na Constituição da República".
Em nota, o MDB, partido do ex-presidente, afirmou que além de reconstituir a ordem, a decisão "reconheceu a arbitrariedade e violação dos procedimentos tomados e restabeleceu as garantias constitucionais". O partido disse ainda que espera que "o curso das investigações se dê dentro da legalidade, com direito a defesa, até que a verdade seja restabelecida".
Veja abaixo as manifestações:
Lenio Streck, constitucionalista
"Correta a decisão. Crônica de um habeas corpus anunciado. Todos os
elementos apontavam para a concessão. Prisão apressada, ilegal. Ausência
dos pressupostos. Prisão mais política que jurídica. As garantias
constitucionais foram repostas!"
Alberto Toron, criminalista
"Acho uma decisão muito justa diante da prisão muito mais do que
injusta. Vejo na concessão da ordem de soltura a reafirmação do
Judiciário independente."
Daniella Meggiolaro, criminalista
"A decisão que concedeu liminar para soltar o ex-presidente Temer e
demais investigados é, sem dúvida, digna de elogios. Entretanto, soam
bastante preocupantes a excessiva deferência do Desembargador Relator ao
juiz de 1º grau, assim como sua preocupação em enaltecer a operação
"lava jato", quando seu papel se resumiria a julgar liminarmente o
habeas corpus e reconhecer a ilegalidade da prisão."
Guilherme Batochio, criminalista
"A prisão foi revogada em boa hora. O decreto era mesmo absolutamente
desfundamentado e, nem de longe, atendia aos requisitos do artigo 312 do
CPP. Além disso não havia contemporaneidade, na medida em que os fatos
datam de 5 anos atrás. Parece que determinados setores da imprensa,
depois de longos cinco anos, finalmente acordaram para os abusos e
desmandos da Lava Jato, a despeito de todos os protestos dos cidadãos
comprometidos com a ordem constitucional e com a legalidade democrática
no Brasil."
Daniel Bialski, criminalista
"Recebo com esperança esta decisão. Nossas cortes precisam dar mesmo um
basta nessa prática de prisão sem motivação e banalizando algo tão
precioso como é a liberdade. E não canso de repetir que se deverá olhar,
atentamente, para essa avocação de competência sem limite, como se o
citado Magistrado fosse o único juiz criminal do Brasil."
Leonardo Isaac Yarochewsky, criminalista
“Estamos vivendo um momento de banalização das prisões preventivas, que
desafiam o Judiciário e, notadamente, o Supremo Tribunal Federal.
Qualquer punição fora do Estado de Direito é barbárie. A prisão
cautelar/provisória em qualquer de suas modalidades - que não decorre de
sentença condenatória transitada em julgado - só deve ser decretada ou
mantida em casos excepcionais, extremados e absolutamente necessários.
Assim, a conservação da liberdade (status libertatis) deve prevalecer até a condenação definitiva, transitada em julgado.
A prisão provisória decretada antes do trânsito em julgado como
antecipação da tutela penal ou para satisfação dos anseios daqueles que
criam um poder e uma justiça paralela - próprio do Estado de Exceção -
devem ser recheados em nome da Constituição da República e do Estado de
Direito. A decisão dos Magistrados que devolveram a liberdade aos presos
na Operação que culminou com a prisão do ex-presidente Michel Temer
colocou o Estado de Direito nos trilhos. Estado de Direito que foi
afrontado por prisões desnecessárias e midiáticas.”
Augusto de Arruda Botelho, criminalista (Via Twitter)
"Triste os tempos em que um Desembargador para revogar uma prisão ilegal
precisa antes se dizer fã da Lava Jato e que o juiz que a decretou é
uma pessoa correta. A prisão era ilegal e ponto. Pouco importa quem é o
Juiz, menos ainda se é a Lava Jato ou o caso do Zé. A Lei é uma só."
Fernando Hideo Lacerda, criminalista
“A decisão que restabeleceu a liberdade de Michel Temer foi correta e
corajosa. Na verdade, sua prisão não passou de uma oferenda malsucedida
aos deuses da opinião pública. O sacrifício do ex-presidente mais
impopular da República ocorreu justamente quando os pecados da Operação
Lava Jato começaram a ser revelados e os membros da autointitulada
força-tarefa passaram a ter seus interesses e reputações postos em xeque
pelo monstro que eles próprios alimentaram. O roteiro foi fabricado sob
medida para iludir a vontade popular. Desde a decisão sem fundamento
jurídico que apela à gravidade abstrata dos delitos de corrupção,
passando pela teatralidade da atuação policial que aborda com fuzis um
idoso em sua rotina (como se fosse a versão tupiniquim de um Pablo
Escobar), até o sensacionalismo maniqueísta da coletiva de imprensa. Os
atos do espetáculo penal destinam-se a preservar o jogo de aparências
segundo o qual a prisão de lideranças políticas seria uma forma de
pacificar e moralizar a sociedade. Por tudo isso, as decisões agora
proferidas pelos Desembargadores Simone Schreiber e Ivan Athié são
suspiros garantistas em um sistema de justiça contaminado pelo processo
penal de exceção. Resta saber se a retomada da legalidade ficará
restrita ao bode expiatório ou olhará pelos verdadeiros inimigos do
mercado soberano: os pobres inúteis e a resistência democrática
inconveniente.”
Welington Arruda, criminalista
"Restou evidenciado que a decisão de soltura lavrada pelo Desembargador
esclareceu não haver os requisitos autorizados da prisão preventiva,
quais sejam, garantia da ordem pública, da ordem econômica, por
conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei
penal. Foi além, o desembargador, ao afirmar que não há qualquer
possibilidade de prisão preventiva para garantia de eventual recuperação
de valores, conforme justificou Bretas.
Esta hipótese aventada pelo Juiz Federal e rechaçada pelo desembargador
faz parte do pacote de medidas apresentado pelo MPF ao Brasil no combate
à corrupção. Ficou nacionalmente conhecida como as '10 medidas de
combate à corrupção' e em seu item 9 está gravada a hipótese de prisão
cautelar para eventual recuperação de valores oriundos do crime."
Luiz Fernando Pacheco, criminalista
“Acertada a decisão do desembargador Athié ao mandar soltar Temer e
outros, presos à míngua de fatos autorizadores de prisões processuais e
ao arrepio da lei. Causa espécie, contudo, tenha Sua Excelência prestado
louvores excessivos à operação Lava Jato. Todos somos contra a
corrupção e aprovamos o seu combate. Sempre, contudo, com respeito
irrestrito à Constituição Federal. E Procuradores e Juízes desta
operação reiteradamente ferem de morte a Carta Magna, como ocorreu neste
lamentável episódio. Não merecem qualquer elogio.”
Luiz Flavio Borges D’Urso, criminalista
"A decisão que revogou a prisão preventiva do ex-presidente Michel
Temer, é eminentemente técnica e deixa clara a ausência dos elementos
autorizadores para a constrição extrema.
Importante destacar, mais uma vez, que existem dois tipos de prisão em
nosso sistema penal. Como regra, temos o primeiro tipo, decorrente de
condenação definitiva, que diz respeito à culpa do agente condenado,
representando sua punição. O segundo tipo de prisão, é excepcional, nas
modalidades das prisões cautelares e engloba a prisão preventiva que
pode ser decretada durante a investigação ou processo, e nada tem com a
culpa do investigado ou do réu.
Neste caso, a lei estabelece as condições, bastante restritas,
autorizadoras dessa prisão preventiva, ensejando a demonstração de
materialidade e autoria, além da sua necessidade, o que deve constar da
fundamentação da decretação. No caso do ex-presidente Temer, o Tribunal
entendeu que não estavam presentes tais elementos, de modo que essa
prisão preventiva não poderia ter sido decretada, inclusive pela sua
desnecessidade. É inegável que no presente quadrante histórico,
assistimos a proliferação e a banalização das prisões cautelares no
Brasil, infelizmente sob os aplausos de parcela significativa da
sociedade. No Estado Democrático de Direito, a prisão só pode ocorrer,
quando os preceitos legais e os primados constitucionais forem
observados, fora disso, a prisão é ilegal e deve ser imediatamente
revogada."
Daniel Gerber, criminalista e professor
"Decisão acertada, que devolve o processo e a investigação aos ditames
legais. Serve, inclusive, de recado para toda a cultura Lava Jato que,
equivocadamente, passou a utilizar a prisão preventiva como forma de
obtenção de prova."
Fernando Augusto Fernandes, criminalista
"A decisão preserva a aplicação da Constituição Federal e da
presunção de inocência. Há uma frase histórica: 'Ainda há juiz em
Berlim'. Isso não impede a ação penal, mas impede uma antecipação da
pena. Não há contemporaneidade nos fatos, nem a prisão se revestia dos
pré-requisitos para sua decretação. Sai ganhando a Democracia e o Estado
de Direito."
Vera Chemim, constitucionalista
"A mudança da decisão do Desembargador do TRF-2, quanto à validade
constitucional e legal da prisão preventiva do ex-Presidente Temer e
demais envolvidos gerou uma certa perplexidade, a partir do momento em
que aquela decisão teria um caráter mais imparcial se fosse decidida
pelo conjunto dos integrantes da Turma a que ele pertence, a julgar pela
relevância do tema e do contexto a que ele remete.
Tratando-se de fortes indícios de autoria de crimes de alta complexidade
– corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de organização
criminosa – ,além de provas da existência daqueles crimes, o artigo 312 e
313, I, ambos do Código de Processo Penal ratificam a necessidade da
decretação de prisão cautelar, sem falar da conveniência da instrução
criminal para a devida tentativa de elucidação e apuração de informações
decorrentes também de acordo de colaboração premiada.
O conjunto probatório (provas documentais, gravações telefônicas e
outras constantes no inquérito de competência da Vara Federal do RJ)
constituem elementos mais do que suficientes para a manutenção daquela
prisão, inclusive porque os crimes de lavagem de dinheiro e organização
criminosas são de natureza continuada e portanto permanentes."
André Maurício M. Martins, criminalista
"Entendo que decisão do desembargador converge com o princípio
constitucional da presunção de inocência assim como se baseia nas
garantias descritas em nossa Constituição Federal, demonstrado estar em
total conformidade com nosso ordenamento jurídico."
João Paulo Martinelli, criminalista e professor da Escola de Direito do Brasil (EDB)
"O desembargador pode antecipar a decisão quando entender que a
ilegalidade da prisão é provável. É uma decisão liminar. O mérito ainda
será julgado. O desembargador Ivan Athié entendeu que não há elementos
concretos que justifiquem a prisão preventiva. Só há fatos pretéritos. A
decisão é liminar, ou seja, uma antecipação do julgamento porque há
indícios fortes de ilegalidade da prisão. É permitido que o
desembargador relator antecipe a decisão a qualquer momento, até a
decisão do mérito, que será realizado por três desembargadores.
A decisão do juiz Bretas não trouxe fundamentos que justificassem a
prisão preventiva. Além de ser vaga, os fatos apontados são pretéritos. A
decisão preventiva só pode ser fundamentada em fatos atuais, que possam
comprometer a investigação e precisam ser interrompidos. Se os fatos já
foram praticados, não se pode presumir perigo de o acusado responder em
liberdade. A prisão preventiva deve ser exceção, nunca a regra. Não se
pode prender quem ainda não foi condenado apenas por convicção pessoal
sem fundamento técnico. Há uma verdadeira banalização das prisões no
país, uma ameaça ao Estado de direito.”
Nathália Rocha Peresi, especialista em Direito Penal Empresarial
"A
notícia de um ex-presidente preso preventivamente e solto 4 dias depois
é péssima para o Brasil e gera uma falsa sensação de instabilidade das
decisões de juiz de primeira instância. O problema, neste caso, é que o
erro não está na soltura, mas na prisão. A decisão absolutamente
desprovida de justificativa legal foi rebatida com muita assertividade
técnica e, porque não dizer, bom senso do desembargador federal Ivan
Athié."
Marcelo Leal, criminalista
"Prisões preventivas não podem ser decretadas ao alvedrio do magistrado
ou com base no clamor das redes sociais. Somente nos casos definidos em
lei é possível se sustentar o cárcere cautelar. Todo o mais é arbítrio".
Luís Henrique Machado, criminalista
"A decisão se baseou principalmente no argumento de que fatos antigos,
não contemporâneos, impedem a decretação da prisão preventiva,
encontrando-se, dessa forma, em consonância com a jurisprudência do
Superior Tribunal Justiça e do Supremo Tribunal Federal."
Armando S. Mesquita Neto – especialista em Direito Penal Econômico
"A regra, em nosso ordenamento jurídico, é a
liberdade. As prisões cautelares do ex-Presidente Michel Temer e demais
acusados foram decretadas pelo Magistrado singular sem a devida
indicação de qualquer elemento em concreto que as justificassem, pois
foram calcadas apenas na gravidade em abstrato dos delitos que lhes são
imputados. Ademais, a simples presunção de que os réus poderiam criar
dificuldades à instrução processual não autorizaria, por si só, a prisão
preventiva, que só se sustentaria quando presentes os requisitos
constantes do artigo 312 do Código de Processo Penal.
Outro importante aspecto, que demonstra o acerto da decisão, é a abissal
falta de contemporaneidade entre os fatos delituosos alegados pelo MPF e
o momento das prisões preventivas.
Além disso, o seu inegável acerto jurídico não é contestável, visto que a
decisão proferida pelo Desembargador Federal Antonio Ivan Athié
demonstra como é possível manter uma postura de combate à corrupção sem
afrontar as garantias constitucionais da ampla defesa e do devido
processo legal, assim como as leis processuais penais."
Henrique Zelante – especialista em Direito Penal Econômico
"A decretação da prisão do ex-presidente se revelou prematura, ao passo
que ausentes os seus requisitos autorizadores. A sua manutenção, pior do
que isso, confirma o vício ora suscitado, não podendo prosperar. Na
espécie, não foram enfrentados os requisitos autorizadores da sua
decretação, sendo utilizados os indícios de autoria e materialidade para
fundamentá-la."
Sociedade dos Advogados Criminais do Estado do Rio de Janeiro (Sacerj)
"A Sociedade dos Advogados Criminais do Estado do Rio de
Janeiro (Sacerj) manifesta seu júbilo para com os Desembargadores
Federais Simone Schreiber e Ivan Athié, que dignificaram a magistratura
brasileira ao revogarem liminarmente prisões cautelares impostas a
investigados na chamada operação lava jato, calcadas exclusivamente na
suposta gravidade das práticas ilícitas atribuídas. (...) A Sacerj
sempre defendeu que as garantias constitucionais e os direitos
fundamentais não podem sofrer nenhum barateamento. São valores demasiado
altos para os brasileiros, devendo ser preservados e acalentados pelo
Poder Judiciário, o único com força para fazê-lo. Por isso, a Sacerj se
rejubila com os dois magistrados amigos da liberdade, na expectativa de
que os demais juízes do Brasil sigam o edificante exemplo que deram para
a sociedade."
*Fernanda Valente é repórter da revista Consultor Jurídico