Sexta-feira, 19 de março de 2021 - 15h59
Os julgadores da 2ª Câmara
Especial do Tribunal de Justiça de Rondônia, em recurso de apelação, mantiveram
a sentença, em Ação Popular, do Juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Porto
Velho, que determina à Igreja Internacional da Graça de Deus a remoção das
intervenções realizadas no edifício do Cine Teatro Resky, na capital, e devolva
à estrutura arquitetônica os seus aspectos anteriores, inclusive as cores
originais (amarelo ouro, verde e vermelho escuro). O prazo para cumprimento da
medida judicial é de 120 dias para que a Igreja promova a demolição, remoção
das intervenções de ferro, aço, peças de vidro, canteiros e jardins. O não
cumprimento implicará em multa diária que vai de 10 a 100 mil reais, e será
revertida para a Fundação Cultural do Município de Porto Velho.
O prédio do Cine Resky,
localizado na Praça Marechal Rondon, Centro de Porto Velho, “foi construído
pelo libanês George João Resky, inspirado em prédios do movimento arquitetônico
denominado Art Decó, da Broadway de Nova York, e inaugurado, em 17 de junho de
1950, pelo governador do então Território Federal do Guaporé e pelo prefeito da
Capital”, da época. O monumento representa um patrimônio histórico para as
gerações presentes e futuras da sociedade rondoniense, segundo as decisões
judiciais de 1º e 2º graus do Poder Judiciário do Estado de Rondônia.
O voto do relator, desembargador
Miguel Monico, explica que qualquer cidadão é parte legítima para propor ação
popular, uma vez que ela é “um relevante instrumento processual de participação
política do cidadão, destinado eminentemente à defesa do patrimônio público,
bem como da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio
histórico e cultural". E, no caso, a Ação Popular foi movida pelos
cidadãos Ernande da Silva Segismundo, Luiz Leite de Oliveira, Antônio Candido
da Silva e Antônio Serpa do Amaral Filho, que defendem o patrimônio cultural da
cidade, o qual, segundo o voto, “já demonstra que o bem possui apreço
considerável da sociedade, tendo os cidadãos manejado ação para defender o
patrimônio cultural da cidade, instruinda-a com diversas reportagens indicando
manifestações populares contra as descaracterizações da estrutura arquitetônica
do Cine Teatro Resky”.
O relator, em seu voto, após
fazer uma explanação jurídica sobre a Constituição Federal, legislações e
julgados de outros tribunais, incluindo o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e
Supremo Tribunal Federal (STF), explica que “o direito à propriedade não é
absoluto e, mais do que uma função social (art. 1.228, §1º, CC), a propriedade
deve cumprir uma função socioambiental, pois não se concebe mais no atual
ordenamento jurídico aquela propriedade conhecida no direito anterior em que o
proprietário era o senhor absoluto do bem”. Segundo o voto, o imóvel é uma
propriedade alienada à apelante religiosa, que, com a realização de obras, está
descaracterizando a estrutura arquitetônica original do imóvel, violando o
patrimônio histórico, cultural e arquitetônico da capital do Estado.
Para o relator, “o patrimônio
cultural concebido pelo art. 216, da CF/88, não se limita ao monopólio da
Administração Pública, caracterizada por sua burocracia e parcimônia, ao passo
que também é dever do Poder Judiciário pronunciar-se sobre a matéria, quando
provocado para tanto, sem que isso implique em violação à separação dos
poderes”. Pois, como no caso, “o bem não necessariamente precisa ser tombado
para ser protegido”. Por isso, “os argumentos da apelante não merecem acolhida,
eis que, como já destacado, é dever de todos os poderes e da coletividade a
preservação do patrimônio cultural de um povo, que identifiquem uma cidade ou a
arquitetura típica de uma época que represente uma cultura, um povo, os
registros históricos e culturais, etc., não necessariamente tombados”.
Como já dito, “a Ação Popular
constitui instrumento válido para proteção do meio ambiente cultural,
notadamente quando há omissão do Poder Público para adotar medidas
administrativas eficazes de preservação de bem imóvel com significativa
importância à sociedade, devendo o proprietário ser compelido a praticar ações
para preservar suas características originais, razão pela qual deve ser mantida
a sentença de primeiro grau”, finaliza o voto.
Acompanharam
o voto do relator, o desembargador Roosevelt Queiroz e a juíza convocada Inês
Moreira de Castro. O julgamento foi realizado na terça-feira, 16.
Apelação Cível, sobre Ação Popular, n. 000753-43.2015.8.22.0001
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