Domingo, 7 de fevereiro de 2010 - 09h13
Gilberto Costa*
Agência Brasil
O serviço de recebimento de denúncias de violência contra crianças e adolescentes, o Disque 100, registrou em 2009 cerca de 30 mil reclamações de agressões.
Essas denúncias geraram mais do que o dobro de registros de violência – 61 mil, uma vez que uma mesma reclamação pode se referir a mais de um tipo de agressão.
Mais de 15% desses registros são de abuso sexual (9.638 registros), reclamações mais comuns do que as de violência com lesão corporal, exploração sexual, pornografia e tráfico de crianças.
Segundo especialistas, as vítimas de abuso sexual são principalmente crianças e adolescentes vulneráveis socialmente, mas também suscetíveis do ponto de vista psicológico.
É o caso da jovem maranhense Marta Elias. Em novembro do ano passado, ela depôs na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Maranhão, que investiga casos de abuso sexual infantojuvenil.
Antes de fazer a denúncia contra o prefeito de uma cidade do interior do estado, pai de seu filho mais velho, Marta falou à Agência Brasil sobre o namoro que manteve por dois meses com o político, quando ela ainda era adolescente. Segundo ela, o prefeito era um cara “bacana”, “passeava de mãos dadas” e era “muito carinhoso”.
Marta, que agora busca o reconhecimento da paternidade do filho, mas teme ser perseguida, diz que a atitude do então namorado era muito diferente da vivenciada em casa, entre os pais. “Meu pai não sabe dar carinho para ninguém, nem ele nem a minha mãe. O carinho que eles dão é xingando a gente. A minha mãe é muito zangada.”
A psicóloga Sandra Santos, que coordena em Salvador (BA) um projeto de atendimento de crianças e adolescentes vítimas de exploração sexual, avalia que os abusadores percebem a falta de atenção e de afeto sofrida pelas vítimas e estabelecem com elas uma relação de poder. “Essa é uma relação de afetividade e de autoridade do adulto sobre as crianças e adolescentes.”
Além dos dados do Disque 100 (baseados em denúncias), não há dados precisos sobre os casos de abuso sexual. Mas, de acordo com o secretário executivo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), o antropólogo Benedito Rodrigues dos Santos, a maior parte dos abusos relatados nos conselhos tutelares e nas delegacias de proteção infantojuvenil é de incesto: pai com filha e padastro com enteada.
Para a psicóloga social Maria Luiza Moura Oliveira, do Conselho Federal de Psicologia, a situação de poder e submissão é comum na relação entre o abusador e sua companheira. “Por que a mãe não conseguiu perceber o abuso? Essa mulher também vem de uma situação de submissão e falta de autonomia inclusive para interditar aquele ato.”
Na opinião de Moisés Bezerra, do Conselho Tutelar da Cidade Operária, na periferia de São Luís, a exploração em ambiente familiar dificulta a denúncia e a prevenção. “A gente tem medo de alguém que possa entrar na nossa casa e roubar, mas a gente não tem medo de quem a gente conhece.”
Denúncias de violência sexual podem ser feitas todos os dias (inclusive sábados, domingos e feriados) pelo Disque 100. O serviço funciona das 8h às 22h. A ligação é gratuita e o usuário não precisa se identificar. A denúncia também pode ser feita no e-mail disquedenuncia@sedh.gov.br .
*Os nomes de crianças e adolescentes que sofreram violências sexuais e de seus parentes foram trocados
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