Sábado, 8 de outubro de 2016 - 12h16
Setenta e duas horas antes da PEC 241 entrar em fase final de debates no Congresso, a Procuradoria Geral da República divulgou uma nota que serve de alerta a um debate despolitizado e mal informado, cujo desfecho pode transformar programas de austeridade que são a prioridade número 1 do mercado financeiro em garantia constitucional, destinada a vigorar durante 20 anos – sem que o eleitorado, que irá atravessar cinco eleições presidenciais neste período, tenha o direito de dar um pio a respeito. A PGR pede o arquivamento da PEC, com o argumento de que o projeto, considerado essencial por Michel Temer e Henrique Meirelles, pretende fazer “alterações flagrantemente inconstitucionais.”
A nota foi divulgada pouco depois que a líder da minoria, Jandira Feghali (PC do B-RJ), ingressou no Supremo com um mandato de segurança para pedir que a suspensão da tramitação da PEC 241, que o presidente da Câmara de Deputados, Rodrigo Maia, quer realizar nesta segunda-feira. Além de vários argumentos técnicos, o mandato coloca a questão política essencial, que lembrando que projeta “limitações às gestões administrativas de cinco governos federais e cinco legislaturas”.
Num país onde o debate político tem sido anestesiado pela máquina de publicidade que procura ajudar Temer a lutar contra o relógio, antes de ser corroído pela desconfiança e incerteza, matéria-prima essencial da investigação do TSE que pode cassar seu mandato e o de Dilma, a PEC 241 é uma dessas mudanças grandes e ruinosas que podem alterar o destino de um país por várias gerações. Merece ser debatido com consciência e critério.
Intelectual e economista respeitado, fundador do PSDB, o professor Bresser Pereira já disse que pode ser favorável a uma proposta que limite gastos do governo. Mas discorda da PEC 241. Por que? Porque limita gastos de toda natureza mas não toca nas taxas de juros – cuidado economicamente maroto e socialmente indecoroso, podemos acrescentar.
A palavra pode parecer dura demais mas o fato é que, caso a PEC 241 venha a ser aprovada, o país estará colocado sob um regime de ditadura econômica, na qual o voto do eleitor deixará de fazer diferença. A questão essencial da política econômica de qualquer país – seja a Dinamarca, o Sudão ou o Brasil – é o limite de gastos públicos, que podem ir para a Saúde, a Educação, os programas científicos ou o cassino financeiro. Nas democracias, essas escolhas são um reflexo da decisão tomada em urna, depois de todos as mediações próprias do sistema representativo. Com a PEC, a linha geral já terá sido resolvida com antecedência, num dia qualquer de outubro de 2016, pela vontade exclusiva de 513 deputados e 81 senadores. A partir de então o Estado tem os gastos congelados pela inflação do ano anterior. Na prática, fica impedido de crescer.
Instituído pelo Partido Republicano, um sistema semelhante – que estabelece um teto para o endividamento do governo federal – transformou-se numa camisa de força contra programas sociais e projetos de interesse popular nos Estados Unidos. Sempre que o limite está próximo de ser atingido, a bancada conservadora no Congresso aperta o garrote da Casa Branca – democrata ou mesmo republicana – para exigir cortes em despesas que considera supérfluas ou erradas, condição para que um novo patamar de endividamento seja autorizado. A chantagem, caso não seja atendida, envolve uma ameaça conhecida de quem acompanha o cotidiano de Washington: a paralisia da administração, com fechamento de escolas públicas, cortes em programas sociais e dispensa de funcionários.
Esta situação equivale a uma posição de chantagem e sequestro da democracia – e é justamente isso que se pretende instituir no Brasil. A diferença é que a versão Temer-Meirelles quer um controle ainda mais duro, fixado com antecedência, que não pode ser negociado antes de dez anos.
Neste ambiente, a nota da PGR tem limites e méritos. Num sintoma óbvio das doenças políticas do momento, a crítica é basicamente corporativa, particular, de uma alta burocracia de Estado temerosa de ser atingida em sua autonomia de funcionamento, onde os gastos ocupam, obviamente, uma função essencial, e quer negociar mudanças favoráveis ao que considera seus interesses e necessidades. A PGR diz que " PEC 241 institui o Novo Regime Fiscal pelos próximos 20 anos, prazo longo o suficiente para limitar, prejudicar, enfraquecer o desempenho do Poder Judiciário e demais instituições do Sistema de Justiça e, nesse alcance, diminuir a atuação estatal no combate às demandas de que necessita a sociedade, entre as quais o combate à corrupção, o combate ao crime, a atuação na tutela coletiva, a defesa do interesse público”.
A verdade é que a mesma observação (o risco de “limitar, prejudicar, enfraquecer o desempenho”) também deve ser feita a outras áreas essenciais do Estado, como o Sistema Único de Saúde, a Previdência Social, a agricultura familiar, o ensino público, para não falar no esforço de estimular o crescimento e gerar empregos.
A PEC não é condenável porque diminui prerrogativas do Ministério Público ou outro setor do Estado, mas porque atinge a única força capaz de proteger os interesses maiores da nação e resolver quem deve ficar com o maior quinhão -- a soberania popular. A própria nota da PGR reconhece, em outro parágrafo:
– As alterações por ela [PEC] pretendidas são flagrantemente inconstitucionais, por ofenderem a independência e a autonomia dos Poderes Legislativo e Judiciário e por ofenderem a autonomia do Ministério Público e demais instituições constitucionais do Sistema de Justiça [...] e, por consequência, o princípio constitucional da separação dos Poderes, o que justifica seu arquivamento.
Em outubro de 2014, a maioria dos brasileiros deixou claro, nas urnas, seu apoio a um programa de crescimento econômico, distribuição de renda e expansão de programas sociais.
De lá para cá, a maioria dessas reivindicações foi abandonada, inclusive pelo ajuste iniciado por Joaquim Lewy, no governo Dilma Rousseff . Exatamente dois anos depois, o que se tenta fazer é mais do que um ajuste, que pode ser apertado, diminuído ou mesmo revogado se assim se considerar conveniente.
Uma Câmara eleita sob comando de Eduardo Cunha, expressão do pior que a política brasileira foi capaz de produzir desde a democratização, tentará a partir desta segunda feira revogar o direito do eleitor brasileiro tentar influenciar a política econômica no rumo que considerar mais adequado para sua vida, sua família, sua classe. Pode-se até votar num governo progressista – mas o eleito estará submetido a uma camisa de força para nunca sair do caminho escolhido.
Este é o debate.
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