CHICO ARAÚJO
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Criadas por pressão de organizações não-governamentais (ONGs), algumas com braços em outros países, as reservas indígenas da Amazônia causam preocupação nas Forças Armadas e poderão ser pivô de conflitos bélicos num futuro próximo. Alerta nesse sentido foi dado esta semana pelo comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno. Para ele, a demarcação contínua dessas áreas — é o caso das reservas Ianomami e Raposa Serra do Sol, em Roraima — põe em risco a soberania nacional.
A Reserva Ianomami, com 5 milhões de hectares, é uma espécie de país dentro Brasil. A reserva é fruto da pressão establishment inglês que, em 1969, criou a ONG Survival Internacional para concretizar seu intento. A entidade é resultado das expedições de Robin Hanbury-Teninson e de seu colega Kenneth Taylor, que, em 1968, fizeram um trabalho de campo com os ianomâmis de Roraima. A Survival deu as cartas na Amazônia até 1976, quando Taylor e o antropólogo francês Bruce Albert foram expulsos do país.
“Nós estamos cada vez mais aumentando a extensão das terras indígenas na faixa de fronteira e caminhando numa direção que me preocupa. Pode não ser uma ameaça iminente, mas ela merece ser discutida e aprofundada”, disse Augusto Heleno, durante o seminário Brasil, Ameaças a sua Soberania, que encerra nesta sexta-feira, 18, no Clube Militar do Rio de Janeiro. Para o general, as reservas contínuas “poderão representar um risco para a soberania nacional”.
No início da tarde, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva chamou ao Palácio do Planalto o ministro da Justiça,
Nelson Jobim, e o comandante do Exército, Enzo Martins Peri. Exigiu dos dois que peçam explicações de Heleno sobre suas declarações. Lula teria ficado revoltado com as declarações do comandante militar da Amazônia.
De acordo com o general, o país tem que estar preparado para a guerra e a Amazônia é a região mais provável de ocorrer ações bélicas. “É nossa hipótese alfa. Há
ameaça de conflitos armados, ainda que não sejam iminentes, mas que podem ocorrer, devido ao aumento inegável de tensão em algumas relações bilaterais”, disse Augusto Heleno.
Ele apontou dez possíveis conflitos fronteiriços entre os países vizinhos, desde disputas por terras entre Guiana e Venezuela ou Paraguai e Bolívia, até efeitos da guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (
Farc).
Problema precisa ser discutido
Para o militar, a sua posição contrária à demarcação de área contínua na reserva Raposa Serra do Sol não representa quebra de hierarquia. “Em nenhum momento eu contrariei a decisão do presidente da República. Ela está tomada e será cumprida por quem de direito. Eu levantei
o problema. E ele merece ser discutido e novamente está sendo estudado”, referindo-se à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que mandou suspender a ação de retirada de não-índios da reserva.
Na quarta-feira, 16, o representante da Advocacia Geral da União (AGU), José Antônio Toffoli, contestou os argumentos de que homologação em área contínua colocaria em risco a defesa do território nacional. Toffoli fez uma censura velada ao general, quando afirmou que declarações de membros das Forças Armadas contrários à demarcação “não correspondem ao pensamento do governo brasileiro”.
“Eu não tomei posição quanto à demarcação de terra indígena. Eu coloquei um problema para que ele seja discutido por aqueles que representam o governo. Eu não falo em nome do governo porque não tenho autoridade para isso. E o Exército brasileiro é um instrumento do Estado, acima de ser um instrumento de governo.”
A posição do general se baseia em trechos da Declaração da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos dos Povos Indígenas. A declaração da ONU foi aprovada no ano passado e tem 46 artigos, com objetivo de proteger os povos indígenas em todo o mundo. Segundo ele, o artigo 6 define que “toda a pessoa indígena tem direito a uma nacionalidade”. O artigo 9 diz que “os povos e as pessoas indígenas têm o direito de pertencer em uma comunidade ou nação indígena, em conformidade com as tradições e costumes da comunidade, ou nação de que se trate”.
O diretor do Centro de Informações da ONU, Giancarlo Summa, rebateu as desconfianças do general e disse que a declaração não tem objetivo de formar novos estados indígenas. “O artigo 46 proíbe, explicitamente, que a declaração possa ser utilizada para tentar desmembrar um território de um país. Não é para formar novos países ou estados indígenas e a própria declaração proíbe essa possibilidade.”
Repercussão no Senado
A postura do general Augusto Heleno repercutiu no Senado. Para o senador Romeu Tuma (PTB-SP), ex-diretor da Polícia Federal, o militar fez “uma brilhante exposição” sobre a Amazônia durante sua palestra no Clube Militar. Tuma ainda cobrou a valorização profissional das
Forças Armadas e da modernização dos equipamentos de defesa. A pedido de Tuma, o Senado promoveu nesta quinta-feira, 17, uma sessão especial em homenagem ao Exército.
Aloizio Mercadante (PT-SP), filho de general, defendeu uma ação maior em defesa da região. “A Amazônia precisa dos vinte e cinco mil militares que estão lá. O meu pai comandou o lado ocidental da
Amazônia e sei o que é cada posto de fronteira”. Por sua vez, o senador Delcídio Amaral (PT-MS), defendeu a definição de uma política de fronteira para o Brasil. Essa política, segundo ele, vai garantir as fronteiras e promover o desenvolvimento de áreas inóspitas da
Amazônia, por exemplo.

Quarta-feira, 2 de abril de 2025 | Porto Velho (RO)