Sexta-feira, 17 de novembro de 2006 - 06h09
A fronteira do Brasil com a Bolívia e o Peru, onde estão situados os estados do Amazonas, Acre, Rondônia e Mato Grosso, e os aeroportos da Amazônia são os pontos mais vulneráveis para a prática da biopirataria internacional, que está levando para o exterior grande parte da riqueza natural do país, principalmente através do contrabando de animais silvestres e plantas medicinais.
É o que concluiu a auditoria realizada recentemente pelo Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o sistema de fiscalização exercido pelo governo federal para evitar o contrabando da flora e da fauna do Brasil, que saem clandestinamente do país e são patenteados no exterior.
"Devemos ser mais enfáticos na defesa de nossa biodiversidade", destaca, destacou Eduardo Valverde (PT-RO) acerca do relatório da auditoria do TCU. Além de cobrar ações de segurança para o país, a auditoria do TCU estabelece prazos para o cumprimento das medidas.
"As divisas com a Bolívia e o Peru e os aeroportos da Amazônia, permitem, segundo Valverde, inclusive, a entrada de pragas responsáveis por grandes prejuízos à agricultura nacional. "A entrada de espécies exóticas ao país provoca impactos tão graves que se constituem em ameaças à sobrevivência de outros seres. Além das conseqüências econômicas, com prejuízos, principalmente, para a agricultura", assinala o relatório da auditoria do tribunal.
Além de apontar as falhas na fiscalização, o relatório do TCU dá prazo de 180 dias (até março de 2007) para que o governo federal faça a adequação da fiscalização nessas áreas consideradas frágeis do território nacional. Pelo que o TCU apurou, é mínima a presença do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) nos aeroportos brasileiros.
Fauna é contrabandeada todos os dias
Após admitir a deficiência do Ibama, o coordenador da Divisão de Fiscalização Aeroportuária do órgão, Antônio Paulo de Paiva Ganme, ressaltou ao jornal Correio Braziliense, da capital federal, que um convênio foi firmado com a Infraero para a capacitação de pessoal na identificação de produtos de biopirataria e para a instalação de detectores de material orgânico nos equipamentos de Raios-X das esteiras dos aeroportos. "O sistema já funciona nos cinco maiores aeroportos do país e está em fase de instalação em mais oito", disse o coordenador.
Apesar disso, o número citado pelo funcionário do Ibama está longe de se aproximar dos 66 aeroportos controlados pela Infraero em todo o país, sem contar os aeroportos que têm autorização para funcionar, mas não são supervisionados pelo governo. Outra tentativa do governo de ampliar a fiscalização contra a biopirataria internacional foi feita, também, no convênio firmado pelo Ibama com os Correios para fiscalizar as correspondências despachadas para o exterior.
Essa fiscalização, no entanto, se restringe hoje ao Estado de São Paulo, onde nos últimos três meses os flagrantes de contrabando têm sido quase que diários. Segundo o coordenador do Ibama, o contrabando mais comum é de animais peçonhentos como aranha e escorpião.
Pelos que os auditores do Tribunal de Contas da União conseguiram levantar, a ação dos biopiratas na Amazônia e em outras regiões do país tem se dado de forma muito sutil, com a maioria dos traficantes levando o material genético coletado nas próprias roupas.
Convenção internacional é ignorada
"Com mais de 10 anos de vigência, a Convenção da Diversidade Biológica prevê que o uso de recursos genéticos depende do consentimento do país provedor. Mas, para os ambientalistas, o acordo tem sido constantemente ignorado", assinala matéria publicada ontem em destaque pelo jornal Correio Braziliense com o título "Amazônia saqueada."
O jornal lembra que mais de 170 países são signatários do compromisso internacional assumido através da Organização das Nações Unidas (ONU). Esse compromisso inclui o reconhecimento da soberania nacional sobre a biodiversidade, a necessidade de consentimento prévio ao uso dos recursos e a repartição dos benefícios relacionados à exploração e aos conhecimentos tradicionais associados, como a sabedoria indígena e quilombola, no caso brasileiro.
A organização não-governamental Ambiente Brasil assinalou que a comprovação do contrabando fica evidente no crescente número de patentes concedidas no exterior para produtos ou processo derivados da biodiversidade brasileira. E citou levantamento preliminar do Ministério do Meio Ambiente (MMA) indicando que, depois de 1992, data do início de vigência de convenção internacional, foram concedidas um montante acima de mil patentes internacionais para 40 espécies brasileiras contrabandeadas para o exterior.
Mil patentes em 40 espécies
Nos últimos anos, o Brasil tem tentado reverter as patentes concedidas sobre princípios ativos extraídos do cupuaçu, da graviola, do murumuru, da copaíba e do jaborandi. O que foi patenteado antes da convenção não tem mais como ser revertido. Segundo informou o diretor de Patrimônio Genética do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Eduardo Vélez, esse é o caso do uso do veneno da cobra jararaca e da árvore amazônica pau-rosa. O Captopril, remédio anti-hipertensivo, foi elaborado a partir de princípio ativo do veneno e o famoso perfume Chanel Nº 5 contém fragrância extraída da árvore da Amazônia chamada pau-rosa.
O diretor do ministério destacou ao Correio que o combate ao contrabando de recursos genéticos é complexo para países ricos em biodiversidade. As leis nacionais regulam as normas dentro do Brasil, mas falta um marco regulatório internacional para o sistema de registro de patente fora do país. "Não existe lei internacional de proteção", destacou Eduardo Vélez.
Segundo Eduardo Valverde, A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, apresentou à Organização Mundial do Comércio (OMC) um dos antídotos para a biopirataria: uma proposta de emenda ao Acordo TRIPs (Trade Related Intellectual Property Rights), que estabelece padrões de patente e propriedade. "A proposta obriga os escritórios internacionais de patentes a exigirem uma autorização de origem do material a ser patenteado" afirmou o deputado federal. Além do Brasil, o documento foi assinado pela Índia, Paquistão, Peru, Tailândia e Tanzânia.
Fonte: SEIAM - Wesley Fasollo
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