Quinta-feira, 14 de setembro de 2023 - 16h06
Quando o livro foi lançado?
O livro foi lançado agora em
agosto, mal tem 15 dias.
Como surgiu a ideia do livro?
É uma história meio longa, mas
vou sintetizar os últimos capítulos. Nasceu de um conjunto de disciplinas que
ofereço no PPGCTS da UFSCar e, mais recentemente, tomou esta forma final
(correspondente ao livro) a partir de uma disciplina nova: “Sociedade de
Controle”. No início era um punhado de verbetes, a própria ideia originária de
Sociedade de Controle, capitalismo de vigilância, vigilância líquida, império
da vigilância. Porém, como trabalho com uma metodologia dinâmica nos cursos, na
segunda oferta da disciplina os verbetes aumentaram – obviamente, incluímos o
Fascismo Nacional, o Golpe de Estado (de 2016, por exemplo), o que chamei de
Necrofascismo (diagnosticado em outros três livros) e outros. Hoje são
praticamente 40 verbetes sobre formas de ataque à República, à Federação, ao
Estado Democrático de Direito, a exemplo do 8 de janeiro de 2023 – que, aliás,
já está conhecendo os primeiros condenados em julgamento do Supremo Tribunal
Federal (STF) por atos terroristas.
O tema se concentra no caso
brasileiro ou se aplica a outros países?
Esse fenômeno é internacional, e
tem longa data. A Sociedade de Controle já era apontada na década de 1970, por
Deleuze. O fascínio técnico do Nazismo foi reportado por Marcuse. Vemos
acontecer, neste exato momento, a extrema direita ganhar muita força na Argentina;
na Itália subiu ao poder com o Partido Fascista. Na África há uma sequência de
golpes, contragolpes. A Ucrânia tinha um grande agrupamento militar nazista
(Batalhão Azov), a Rússia também tem (ou tinha) o seu: o Wagner Group. É um
fenômeno globalizado, apresentando variações maiores ou menores, mais claras ou
difusas, mais ou menos militarizadas, do que se chamou juridicamente de Estado
de Exceção (ou exception), com uso de todos os mecanismos possíveis para se
tomar o poder ou ali se manter. A indústria de Fake News, o controle econômico
e elitista das mídias oficiais, o envolvimento do Judiciário (entre, na Lava
Jato, no golpe de Estado de 2016), de partes significativas dos setores
políticos e militares, são recursos presentes. Ilustrativamente, o caso mais
antigo dessa forma-Estado dissolutiva da política ou de outros Estados e
comunidades, é o cerco total de Troia, na Ilíada de Homero. Há um Cervantes
também: El Cerco a Numancia. Albert Camus tem dois clássicos justapostos: A
Peste e Estado de Sítio. Ou passagens bíblicas em que se destacam técnicas
militares de guerra assimétrica, dissuasivas, disruptivas: Juízes 7: 15-21
(Gedeão).
¹⁵ Levantai-vos, porque o Senhor
tem dado o arraial dos midianitas nas nossas mãos.
¹⁶ Então dividiu os trezentos
homens em três companhias; e deu-lhes a cada um, nas suas mãos, buzinas, e
cântaros vazios, com tochas neles acesas.
¹⁹ Chegou, pois, Gideão, e os cem
homens que com ele iam, ao extremo do arraial, ao princípio da vigília da
meia-noite, havendo sido de pouco trocadas as guardas; então tocaram as
buzinas, e quebraram os cântaros, que tinham nas mãos.
²¹ E conservou-se cada um no seu
lugar ao redor do arraial; então todo o exército pôs-se a correr e, gritando,
fugiu.
Em síntese, em que consiste esse
projeto de destruição da política? Pode citar um exemplo do que seriam essas
“formas utilitárias”?
Em síntese, consiste em modelos,
formas, sistemas autoritários, autocráticos que se destinam ao controle social,
a tipos variados de aniquilação do espaço público. Da Turquia e da Hungria,
atuais, ao 8 de janeiro de 2023, à Lava Jato. De Gedeão ao Golpe
civil/empresarial-militar de 1964; da Batalha de Argel (um filme clássico neste
gênero) a todos os golpes sangrentos na América Latina. A chamada fase de
“generalíssima” de Gabriel Garcia Márquez é um primor dessa doença política que
nunca cessa.
Tomarei dois exemplos
instrumentais, que chamarei de maléfico e benéfico: 1) Fez-se muito mal ao
país, quando o Supremo determinou a prisão de Lula, pois, fora da corrida
eleitoral, o fascínio com o Fascismo ganhou as urnas. Em claro golpe à
Constituição, revogou-se a necessidade do trânsito em julgado, para se acolher
a prisão em segunda instância. O mesmo juiz que condenou Lula viraria ministro
da Justiça logo depois da posse, em 2019.
O exemplo “positivo” da
mesma instrumentalização – e do mesmo STF – viria no período eleitoral a fim de
que as Fake News e robotização da política (bots) não fossem suficientes para
se aniquilar as eleições de 2022. Criou-se um entendimento que as respostas do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesses casos, obrigatoriamente, tinham que
ser céleres e gravosas – o juiz (ministro do TSE) praticamente agia de ofício.
Outro caso remonta à crime sanitária mundial de 2020, quando obrigou-se a compra
de vacinas. Esse conjunto, e outras medidas, levaram ao entendimento de que
vivíamos uma excepcionalidade judicial, chamada de “estado de coisas
inconstitucional”. Porém, esse assunto em particular é mais complexo.
Qual a importância da
política para a sociabilidade?
Essa pergunta vale todo
o significado do livro, contudo, resumidamente, entendo que somos “animais
políticos” (é a nossa própria condição humana, como ensinou Hannah Arendt, e
muito antes dela o filósofo grego Aristóteles). Dessa condição de habitação na
política vem todo o nosso “fazer-se política” e é isso que nos transforma,
dando-se formas enquanto seres sociais. Em suma, da política inerente
designamos as formações sociais que nos imprimem mais ou menos empatia,
interação. A política é, assim, a origem da inteligência social.
Acesso gratuito:
http://eduepb.uepb.edu.br/e-books.
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