Sábado, 7 de outubro de 2023 - 10h30
Vinício Carrilho Martinez (Dr.)
Professor Associado IV da UFSCar
https://www.youtube.com/@ACienciadaCF88
Neste texto, traremos uma
ideia prática e já estruturada no ensino público de nível fundamental e médio,
sobre o que se entende por Educação Constitucional – uma Educação pela
Constituição de 1988.
Iremos dialogar sobre
alguns aspectos da Constituição Federal de 1988 (CF88) trazidos pelo livro
didático ou de apoio, vinculado ao ensino fundamental ou médio (Dias e Bellusci,
2021). São recortes ou prints do que podemos chamar de essência da Constituição
e dos direitos, garantias, liberdades e deveres ali consagrados. É preciso ter
a clareza de que não nos propusemos o objetivo de debater, esmiuçar, os
destaques trazidos pela Constituição Federal de 1988 (CF88) para a educação;
posto que nosso objetivo é advogar o seu inverso, isto é, fazer incidir a
Constituição de 1988 na educação pública.
No entanto, para
avançarmos neste debate tão urgente da “Constituição na escola pública”, precisaremos
retroceder um pouco, para 1985 mais especificamente.
A Constituição de 1988,
na prática, começou a ser desenhada muito antes. Pode-se dizer que desde a
Anistia (1979) os debates já exigiam uma adequação normativa condizente com o
final do regime militar. Em 1985 houve uma eleição diferenciada, pois os
parlamentares não executariam apenas as funções normais, tradicionais do Poder
Legislativo, uma vez que iriam formular uma nova Constituição.
Por isso, fala-se de um
processo constituinte, um período mais alongado de tempo em que os grupos de
poder, partidos políticos, movimentos sociais da sociedade civil organizada,
resistências da classe operária, das universidades públicas, da
intelectualidade progressista, estratos de classes dominantes modulariam suas
forças, seus recursos, suas militâncias para que, no Congresso Constituinte,
suas pautas e interesses fossem representados na Constituição de 1988. Estaria
em ação o Poder Constituinte, a partir da posse dos novos congressistas em 1986
e, neste caso, o próprio Poder Constituinte estaria em pleno funcionamento.
Do
ponto de vista pedagógico, o mais interessante a observar foi o processo
constituinte, especialmente em 1985, uma vez que a sociedade brasileira como um
todo foi envolvida no mais amplo debate das últimas décadas, talvez a mais
profunda discussão que se fez do Brasil em toda a história da política
republicana. Porque, naquele presente, o passado que não se queria mais era
revolvido, para ser removido, e o país que se queria para o futuro era
apresentado em várias teses.
Como
dissemos, movimentos sociais, partidos políticos, organizações profissionais,
laborais, de empregados e de empregadores promoviam seus debates, incluíam
formas de financiamento e de mobilização ou formação de quadros que pudessem
militar em favor dos seus interesses. A sociedade brasileira fervia, as
universidades não só tinham seus candidatos mais alinhados – por exemplo, em
defesa da educação pública – como conduziram um debate sobre o poder jamais
visto no país.
No entanto, não só as
universidades, também a escola pública e o “chão de fábrica” foram mobilizados
para a eleição congressual com papel constituinte. Jovens eram convidados a
debater projetos de Constituição, cartilhas e livros específicos foram lançados
para esclarecer e debater o que é liberdade, isonomia, equidade, organização/separação
de poderes[1],
direitos fundamentais, cidadania e democracia, além de aspectos técnicos e mais
específicos acerca do próprio Poder Constituinte. Todos os recursos da época
foram acionados, da grande mídia aos folhetos e cartazes, das palestras à
publicação de livros técnicos ou mais ideológicos, como vemos em alguns
exemplos abaixo:
·
DALLARI,
Dalmo de Abreu. Constituição e Constituinte. São Paulo : Saraiva, 1985.
· BONAVIDES, Paulo. Política e Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 1985.
Esse
debate foi tão profícuo que mesmo anos depois muitos cursos regulares, como
Relações Internacionais e Direito, ainda mantinham em sua estrutura básica essa
temática, como vemos a seguir:
·
NEGRI,
Antonio. O poder constituinte: ensaio
sobre as alternativas da modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
· SILVA, José Afonso da. Poder Constituinte e poder popular. São Paulo: Malheiros, 2002.
De certo modo, todas
essas questões continuam povoando os debates populares ou os mais aquecidos
pelo envolvimento político, nos momentos em que apontamos os limites (ou
desvios) da Constituição de 1988, exatamente, por ter sido forjada como uma
Constituição compromissória, isto é, repleta de compromissos nem sempre
condizentes uns com os outros: a Constituição-cidadã não é pura, isenta,
neutra, é óbvio; contudo, o compromisso com a dignidade humana nunca se abalou.
E
é para este conteúdo do livro didático – prints ou slides – que passaremos
agora, um tempo de nossa análise inicial acerca do(s) significado(s) da
Constituição de 1988. Nossa análise não seguirá uma ordem cronológica das
páginas respectivas dos prints, mas, sim, uma abordagem conceitual que irá se
ligando entre os comentários subsequentes a cada slide. Nas próximas páginas veremos
alguns slides ou prints sobre a Constituição de 1988 da edição colecionada pela
Editora Moderna (Dias e Bellusci, 2021), disponível gratuitamente, no seguinte
link (a partir do volume 5 e da página 78 em diante):
v https://www.calameo.com/read/00694021949142a83926a?authid=J1SXlnF7y1bG. (Acesso em 03/10/2023).
Também é oportuno indicar
uma publicação do Senado Federal, acessível em PDF e intitulada Constituição em
Miúdos, voltada ao público leigo e estudantes iniciais, no link abaixo
(gratuitamente):
v https://livraria.senado.leg.br/index.php?route=product/search&search=constitui%C3%A7%C3%A3o%20em%20mi%C3%BAdos. (Acesso em 03/10/2023).
Em seguida, podemos iniciar com uma pergunta bastante elementar: por que a CF88 foi denominada por Constituição-Cidadã, por Ulysses Guimarães?
[1]
Vimos a importância fulcral deste sentido na última vez em que um governante
nos ameaçou (à democracia, em primeiro lugar) com um jogo “dentro das quatro
linhas da Constituição”.
A
Constituição de 1988 foi designada como cidadã porque um dos seus dois grandes
pilares é a inclusão, defesa e promoção da cidadania – o outro é o desenho do
Poder Político e a segurança institucional advinda da organização/separação dos
poderes. Em resumo, essas são as duas pernas da
Constituição: cidadania e organização/separação dos poderes.
Quanto aos aportes e definições do que
se pode entender como cidadania, e como vemos neste primeiro print, temos a
afirmação da liberdade, a garantia protegida ao acesso à cultura e ao consumo,
bem como o Desenho Constitucional da Saúde Pública – o SUS. Ainda vemos o
combate ao racismo, a busca pela erradicação da fome e da miséria, e a
afirmação da igualdade entre homens e mulheres.
Como exercício de reflexão é interessante
ouvir as ponderações de quem se aproxima desta temática, dentro ou fora da sala
de aula. Entretanto, é preciso entendermos o momento histórico em que nos
encontrávamos, com os militares tutelando a política de longe ou de perto. E os
acordos ou compromissos necessários a fim de que o básico fosse assegurado. Se
há problemas na própria Constituição de 1988, como veremos em outro momento,
isso é fato, mas, pensemos por um momento que tipo de Constituição seria
construída em 2018-2022 ou a partir de 2023, com a qualidade congressual que
temos hoje?
Não
seria muito mais grave a destilação de direitos? Se a Câmara e o Senado Federal
querem emendar a Constituição para “rever” e anular decisões do Supremo
Tribunal Federal (STF), praticamente aniquilando a organização/separação dos
poderes – em pleno século XXI –, qual seria a qualidade da Constitução revista
ou refeita no atual cenário político?
Desse modo, não é difícil supor que a
Constituição de 1988 é muito superior a qualquer projeto ou iniciativa de
emenda ou “mini constituinte”, sobretudo, nesta fase em que a política é
amplamente dominada e orquestrada pelo chamado Centrão.
Em suma, queremos dizer que a
liberdade, a igualdade, a equidade, como são desenhadas na Constituição de 1988,
prefiguram direitos fundamentais (ainda) mantidos e assegurados em face da
divisão e da organização/separação de poderes: os pilares da CF88 estão ativos,
firmes e dirigidos pelo futuro que queremos para o país. O “núcleo forte e
estruturante” da CF88 continua rígido.
Talvez seja mais
relevante levar a Constituição de 1988 para dentro da sala de aula, lendo-se
com cuidado e calma parcelas previamente selecionadas e adaptadas ao estágio de
conhecimento e de idade em que os alunos estejam. Aliás, neste caso em especial,
parece-nos mais produtivo essa apresentação da Constituição de 1988
(textualmente, falando) do que inventariar o histórico das constituições
brasileiras. É fundamental saber o que temos, especialmente quando se investe
tanta energia para negar o que conquistamos. Neste caso ou neste momento, a
imersão no presente é mais salutar – notadamente se pensarmos na salvaguarda da
própria Constituição de 1988 – do que rever todo o nosso histórico.
Além do debate
sociológico que antecede e compõe as aulas e discussões sobre o Conteúdo
Constitucional, exigindo-se que os docentes se preparem em termos de
conhecimento prévio do texto legal, por vezes, ou ao final de um ciclo de
leituras e de debates da Constituição de 1988, pode ser interessante uma
conversa com especialistas, advogados, juristas ou estudiosos da Constituição
de 1988. A ideia é assegurar um entendimento adequado, promover algum
aprofundamento e instigar a curiosidade nos mais jovens para voltarem à
Constituição sempre que possível ou necessário.
Como estaríamos no início
da construção de uma Educação Constitucional – dentro da sala de aula, nunca
seria demais trazer à tona o próprio significado do que é uma Constituição. E
para este esforço pode ser muito útil rever algum dos clássicos, como:
Constituição é um pacto juramentado [...] Para isso será necessário: 1° – Que a lei fundamental seja uma lei básica [...] 2° – Que constitua [...] o verdadeiro fundamento das outras leis [...] 3° – Mas, as coisas que tem um fundamento não o são assim por um capricho [...] A ideia de fundamento traz, implicitamente, a noção de uma necessidade ativa, de uma força eficaz [...] Os fatores reais do poder que regulam no seio de cada sociedade são essa força ativa e eficaz que informa todas as leis e instituições jurídicas da sociedade em apreço, determinando que não possam ser, em substância, a não ser tal como elas são (Lassalle, 1985, p. 10-14-15-16-17 – grifo nosso).
Observe-se que a edição
citada é de 1985, o período efetivamente efervescente em que pautou a
reformulação do Pacto Constitucional brasileiro.
Como apontamos, a abordagem histórica
das constituições brasileiras – no que incluímos a história, a sociologia, a
ciência política, a antropologia que dê conta da formação social do povo
brasileiro – é um fator que, em si, não precisaria receber tanta justificativa
–, exatamente, pela sua relevância e necessidade urgente que se faz convertida
em obrigatoriedade, tanto quanto o ensino aprofundado de um conjunto de
disciplinas que compõem a esfera da propedêutica. Porém, para o caso específico
dessa abordagem, da Educação Constitucional – ou Educação pela Constituição –,
essas discussões nos mostrariam muito mais a condição das instituições
políticas do que propriamente nos esclareceria acerca da evolução/construção
dos direitos fundamentais e das garantias constitucionais. Mesmo a suposta
Constituição de 1967 acaba por ser relativizada quanto à condição de ser uma
Constituição; porém, um recorte histórico mais específico poderia ser alçado a
partir do AI-5 (de 1968), em confronto com a condição intangível que a
delimitação do Poder Político e dos direitos fundamentais sociais e individuais
alcançaram em 1988 – e após esse marco também, lembrando que em 2023 o meio
ambiente já é tido juridicamente como sujeito de direitos e não mais,
simplesmente, tutelado, na forma de objeto juridicamente protegido. Portanto,
um salto nomológico (observando-se a estrutura interna da norma constitucional)
em relação aos preceitos advindos do próprio artigo 225 da Constituição de
1988. Além do mais, o AI-5 (Ato Institucional número 5, de 13 de dezembro de
1968) não pode ser considerado como uma Constituição subsequente, como uma
“outra” Constituição. Do ponto de vista técnico, a junta militar – empossada
como poder único e dissolutivo da isonomia dos poderes – não capitaneava a
legitimidade requerida pelo Poder Constituinte originário. Na prática, não se
produziu outra Constituição, apenas afirmou-se uma série de desvios que vinham
se acumulando nos Atos Institucionais anteriores – e, nessa situação, de poder
reformador das próprias iniquidades constitucionais prostradas desde 1964; no
máximo, podemos supor a atuação de um Poder Constituinte derivado, revisor.
Então, se é um poder revisor da Constituição que vinha sendo desfeita, não há,
por óbvio, lógica em se falar de uma “nova” Constituição: era somente a mesma
Constituição de Jango sendo destruída e substituída por um conjunto de Atos
Institucionais de poder opressor, aniquilador e violador de direitos humanos
fundamentais. Neste aspecto, pode-se/deve-se travar um debate muito mais
político do que constitucional com os demais docentes e estudantes.
No entanto, se o interesse desperto
pela análise histórica das constituições no Brasil for desperto, é possível
fazer-se esta jornada do conhecimento com o respaldo de um dos maiores juristas
brasileiros de todos os tempos, neste livro:
v BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História
Constitucional do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
É certo que será um esforço
de longa data, mas, se este é o intuito, o resultado com certeza nos traria
muitos recortes do Brasil, especialmente porque estaríamos relendo com as
perspectivas de 2023 em diante.
Uma
dessas lições nos revelaria como avançamos tanto na Carta Política em 1988 –
incluindo-se sobremaneira o Direito a ter direitos (artigo 5º, LXXIX, § 2º) –, criminalizando-se o
racismo no alcance máximo do crime inafiançável e imprescritível (artigo 5º,
XLII), alongando-se os direitos sociais e trabalhistas (artigos 6º e 7º), e
como retrocedemos desde 2016, com o Golpe de Estado que abriu brechas (ou foi
sua motivação) à reforma trabalhista e previdenciária: um status de
reforma trabalhista que tão-somente retirou direitos e garantias da classe
trabalhadora. Por isso se diz que o artigo 7º (dos direitos trabalhistas) foi
anulado, sem que tenha sido revogado da Constituição de 1988. Lendo-se o artigo
7º, resta absolutamente claro que o problema não é constitucional, mas sim
político e de revogação do próprio sentido datado em 1988. Constitucionalmente,
historicamente, avançamos muito na configuração do Estado Democrático de
Direito, a ponto de ser possível afirmar que a Constituição de 1988 é a melhor,
maior e mais profunda Carta Política de direitos fundamentais. Mas, na prática
social e institucional movida e dissolvida em seus laços sociais mais
extenuados, por outro lado, as garantias e as defesas desses mesmos direitos
fundamentais sociais e individuais da cidadania são constantemente ameaçadas ou
constrangidas (anuladas), no exemplo que tivemos da reforma trabalhista que
ainda se agravou com a chamada terceirização, pejotização, uberização.
Desde 2016, nosso Estado Democrático de Direitos Fundamentais praticamente se encontra muito rareado, muito difícil de ser performado e definido. A Essência Constitucional não se alterou, entretanto, o pensamento escravista nos coloniza enquanto sociedade e nos ameaça de graves retrocessos em todos os setores da vida civil organizada. De 2018 a 2022 dezenas de recursos institucionais aptos à participação popular foram desfeitos, negativados por ação governamental.
Alguns desses instrumentos de respiro
e de navegação pelo espaço público já foram recuperados e direcionados a seus
fins maiores. O problema está em que a sociedade brasileira, cindida ao meio
quanto à “crença nos valores democráticos e de respeito aos direitos humanos
fundamentais”, não se reconduziu aos marcos e padrões civilizatórios de 2016.
O processo civilizatório
(artigo 215, § 1º), em concomitância com o capítulo dirigido aos povos
originários (artigo 231) está em conflito direto com os ataques sofridos disso
que podemos chamar de capitalismo de barbárie. Também é preciso ter clareza de que
nem todo arranjo capitalista é de barbárie, basta a comparação com o trabalho
análogo à escravidão no espaço urbano ou nas áreas rurais (vinícolas, por
exemplo), com o que dispõe a Constituição de 1988 para as condições minimamente
salutares do trabalho.
Sendo assim, como vemos ainda
hoje, o Fascismo Nacional não se recolheu ao esquecimento da história. Muito ao
contrário disso, o capitalismo de barbárie alimentado pelo Fascismo Nacional do
pós-2018, mais claramente, arvorou-se de propor “interpretações rancorosas”
contra a própria Constituição de 1988.
Esse é o caso evidente da
proposta trazida pelo denominado Marco Temporal – um marco contra todos os
povos originários, sua ancestralidade, uma ação deflagrada para aniquilar
qualquer pretensão de “Indigenato” que se lê no artigo 231 da Constituição Federal
de 1988.
Não há dúvidas para quem
estudou o mínimo de história brasileira, e há menos dúvida ainda para quem lê o
artigo 231 da CF88, sobre o pertencimento dos povos originários a suas terras,
com suas tradições, com sua identidade e afirmação.
Num
sentido mais grave – se é que podemos dizer assim –, com o Marco Temporal e a
resultante expulsão dos povos originários e dos quilombolas de suas terras nós
estaríamos condenando o Brasil à perda de sua história e identidade enquanto
povo e argamassa cultural. Basta-nos pensar: o que é o povo brasileiro sem a
miscigenação? Nada, pois, somos o povo pardo por excelência. A desconstrução de
nossa identidade (“passando a boiada
sobre a Constituição”) seria parte de um projeto político maior – como
herdeiros da supremacia branca que se criou sob o pensamento escravista.
Talvez coubesse um paralelo com a
experiência chilena atual, em que a campanha mais progressista venceu as
eleições, e na sequência instaurou-se um processo constituinte – tendente a
revogar a Constituição herdada da época ditatorial de Pinochet –, com a
elaboração de uma nova Constituição que seria submetida ao plebiscito popular.
Ironicamente, a Constituição foi recusada por ser progressista demais, em que
pese o povo tenha eleito uma constelação de poderes mais progressista. A
comparação histórica remeteria à análise de direito constitucional comparado
entre a Constituição de 1967 e o AI-5 (1968), com a Constituição da era
Pinochet, bem como na atualidade, entre a nossa Constituição de 1988 e, em
linhas gerais, o avanço societal trazido pelo projeto de Constituição chilena.
O
reconhecimento de espaços de poder institucional às populações de origem
indígena, a plena igualdade entre homens e mulheres – nos assentos de poder –,
entre outras questões também emprestadas da América Latina, como a
constitucionalidade iniciada pela Colômbia e pelo Equador. Seria interessante,
com paralelos históricos e culturais, aproximar o passado mais sombrio de
negação dos direitos fundamentais com a atualidade, em que, por piores que
sejam as experiências democráticas brasileiras, há uma Constituição (CF88) com
sua essência ainda ativa e legítima: cidadania e direitos fundamentais.
Também poderíamos
aprender com a experiência latino-americana: desde a ideia de que a
instabilidade política sempre nos atormenta ou nos alcança, efetivamente, até
experiências muito próximas em que – baseando-se no Ideal Constitucional – as
cortes supremas do Judiciário decretam a obrigação do Poder Executivo agir para
o bem social. Esse procedimento que, em tese, escapa às funções previstas ao
Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, são necessárias diante do
descalabro social nitidamente observado, em compasso de espera remota de que o
Executivo intervenha de maneira republicana (e não o faz, reiteradamente).
Ajuizou-se pela primeira vez com status de
urgência em se obrigar o Executivo a agir de maneira que cumprisse o miolo
humanitário da Constituição – qual seja: a dignidade humana – e, assim,
decidiu-se que o barbarismo social encontrado em determinada situação, um
verdadeiro “estado de coisas inconstitucional”, não mais poderia continuar. É
interessante pensarmos que o Judiciário agiu fora de seu escopo regular para,
precisamente, obrigar o Executivo a se reparar e, desse modo, cumprir com a
determinação constitucional mais elementar: constitucionalmente, o poder não
pode se voltar contra a sociedade.
A cidadania, como a democracia, sem
mais qualificações, adjetivações, pode falhar em sua comunicação mais precisa. É
fato que são substantivos, na forma de valores e de ações que precisam se
materializar e de recursos que garantam essa materialidade, daí falarmos em
garantias constitucionais dos direitos fundamentais. São processos
perfectíveis, que tendem a um aprimoramento contínuo, bem como necessitam da
vigilância da sociedade civil organizada a fim de que não se limitem à retórica
jurídica. Essa vigilância política, no sentido positivo, da sociedade civil
organizada que procura controlar o Poder Político e impor a efetivação dos
direitos assegurados, consagrados, é efetivamente o que torna a cidadania e a
democracia instrumentos de transformação social: é a Política (Polis) que
pressiona e institui padrões mais refinados e republicanos. Por sua vez, essas
pressões participativas na base das relações sociais, com vistas à eficácia de
modalidades políticas mais condizentes, é o que definirá ou trará adjetivos com
força de se tornarem outros substantivos.
É
desse modo que a cidadania passiva – aquela que se contenta com o voto regular
nos períodos eleitorais – se converte em cidadania ativa, requisitando-se o
cumprimento de um direito fundamental estabelecido, mas negado pelo poder
constituído, ou, então, pressionando-se desde a base, converte-se em força
social exigente ao Executivo ou ao Legislativo: vimos isto com a Lei Maria da
Penha e com a definição do crime de feminicídio. De outro modo, é a própria
ideia de cidadania ativa que age propositivamente a fim de que sua vontade se
converta em ação política e, depois, adquira “força de lei”. Estamos falando da
iniciativa popular (artigo 14 da CF88) que se converte em lei específica –
vimos isso com a Lei da Ficha Limpa. Neste sentido, a cidadania ativa fortalece
e inaugura outro sentido – mais amplo e aprofundado – para a definição de
soberania popular. Uma leitura obrigatória nesta seara é a obra de Benevides
(1991) e que, a seu modo, guarda muitas proximidades conceituais com Arendt (1991)
e, por seu turno, com Aristóteles (2001).
De
modo geral, ainda temos que ressaltar a descentralização do poder, na
Constituição de 1988, claramente fixada por meio da correspondência e
corresponsabilidade social na condução/fruição dos direitos fundamentais – veja-se
os capítulos sobre família, meio ambiente, criança e juventude, segurança
pública.
Mencionamos acima a
institucionalidade e a mudança de perspectiva social trazida pela Lei Maria da
Penha e por outros dispositivos. Essa lei é ainda emblemática porque nasceu da
história pessoal de graves violências e retrata a própria vida de uma mulher
violentada e agredida brutalmente. É uma lei, portanto, com profundo lastro
social. Toda lei deveria ser espelho de algum nuance, recorte ou generalidade
social, pois teria validade e legitimação desde o nascimento; porém, sabemos
que não é assim. Além do fato de muitas leis não terem significação social,
ainda são desafiadas continuamente: no Brasil, inclusive, diz-se que “a lei não
pega”. E o que isso quer dizer? É como se disséssemos que está muito distante
das necessidades ou da cultura geral que pavimenta a sociedade nacional. Não
estamos dizendo que isso seja correto, nem sempre a lei é tão distante do dia a
dia das pessoas, a ponto de ser ignorada. Pode-se dizer que a cultura
brasileira não considera a formalidade, a institucionalidade como parte de sua
rotina e da cultura geral. Com o combate à corrupção e defesa do patrimônio
público se verifica algo assim. O ditado popular do final do século passado
ainda é exploratório de nossas relações sociais, quando se dizia que “fulano
rouba, mas faz”. E ele era eleito. As leis anticorrupção da época buscavam
cercear atos e pessoas desse tipo, assim como as atuais – muitas, aliás, são as
mesmas, a exemplo do crime de peculato (cometido por servidor público). Muitos
também pensam e advogam que a educação pública seria uma arma efetiva para
mudarmos padrões culturais indesejados e repreensíveis; o que é correto, apesar
de somente a educação não ser suficiente para tal. Mas, com certeza, com o
impacto de investimentos massivos em educação, por dez anos, nós formaríamos
outra geração, já livre e antagônica aos padrões que não nos engrandecem
enquanto povo. Uma dessas grandes e profundas mudanças sociais viria exatamente
a reformular – punindo, evidentemente – todas as formas de discriminação e de
violência contra as mulheres. A mulher negra, como se sabe, na estratificação
social, está no rodapé do poder social. E é para e pela mulher negra que essas
transformações deveriam ser agilizadas, aprofundadas, pois formam o estrato
social que mais necessita de proteção e apoio – a mulher negra e pobre, então,
deveria estar na ponta de todas as políticas públicas, notadamente porque o
desnível de condições econômicas, sociais, culturais, de representação política
e jurídica, é o mais grave de todos. Apesar da Constituição de 1988 assegurar a
igualdade entre todas as pessoas, como um dos seus pilares, foi preciso esperar
2023 para que víssemos uma lei assegurar a igualdade entre homens e mulheres.
Há muitas pesquisas, muito se avançou
na análise e no enfrentamento do racismo no Brasil. A realidade não se
modificou com a mesma velocidade, isso também é verdade. Entretanto, ver o
problema de maneira correta é o primeiro passo para que seja enfrentado. Com o
racismo se dará o mesmo. E há muitas questões específicas que deveriam ser
realçadas, o que seria parte do trabalho já efetuado pelos especialistas.
O
que podemos/devemos destacar é que subsiste um pensamento escravista no país e
que se manifesta em duas pontas das relações sociais e econômicas: no racismo e
na exploração do trabalho análogo à escravidão. É óbvio que o racismo tem que
ser denunciado, bem como todas as ideologias de supremacia branca; entretanto,
para irmos além, precisamos mexer no vespeiro que desafia toda a sociedade
brasileira. Ainda mais depois da reforma trabalhista de 2017, em que muitos
direitos trabalhistas foram simplesmente aniquilados, em conjunto com a
permissividade aplicada por outras formas e normas que descredenciaram a
segurança dos direitos trabalhistas, como a terceirização, a pejotização, a
uberização. De lá para cá, não apenas se “normalizaram” formas brutais de
exploração/expropriação do trabalho, como houve um aporte de legalidade nos
abusos cometidos contra a classe trabalhadora.
Empresas
nacionais e transnacionais estão envolvidas com a exploração do trabalho humano
análogo à escravidão. Algumas autoridades, inclusive do Judiciário,
beneficiaram-se dessa atividade e, depois, surgiram com a recompensa de não
serem punidos. O que nos permite concluir que esse problema é extremamente
grave e complexo, pois está na origem social e é formador da consciência média
do povo brasileiro. Muitas pessoas, não bastasse esse descalabro, ainda querem
a volta do trabalho infantil – precisamos dizer um milhão de vezes: lugar de
criança é na escola!!
Realmente,
as políticas de inclusão surtiram algum resultado, em que pese precisemos
caminhar muito mais em muitas direções: da defesa das políticas públicas
direcionadas a partir da mulher negra e pobre, até a defesa dos direitos
fundamentais das crianças (mormente, as crianças negras e pobres).
Afinal,
essa combinação entre racismo lancinante (ou seja, nunca foi latente) e máxima
exploração do trabalho, com analogia e apologia ao escravismo, é absolutamente
trágica, corrosiva de todos os sentidos civilizatórios, de amadurecimento e de
crescimento social que podemos almejar.
Os movimentos sociais e históricos
que resultaram em efetiva transformação social e cultural não fizeram recortes
de estratificação ou com base em estratos sociais. Com isto dizemos que as
principais movimentações sociais são resultado de grande esforço de mobilização
social em todas as classes, grupos, setores e camadas sociais. Não é difícil de
percebermos isso, historicamente. Basta olharmos os movimentos das Diretas-Já,
na luta pelo direito à democracia, o chamado #Elenão, em que o movimento
feminista foi preponderante, e lá atrás, na história, o Abolicionismo.
Não há descompressão
social e cultural em que homens e mulheres, brancos e negros, não estejam
juntos. Afinal, nessa Luta pelo Direito – que sempre é uma luta política –, o
que está subentendido é a necessária efetivação da igualdade, da isonomia.
Não há direitos
fundamentais, de fato, e já como resultado da descompressão social, que não
estejam pautados na igualdade, no reconhecimento de todas as pessoas como
sujeitos de direitos. Não há direito, efetivamente, sem a igualdade. Sem
isonomia não há direitos, mas sim privilégios e formas de exceção do direito,
maneiras de opressão pela desigualdade.
Neste
sentido, podemos afirmar que historicamente e juridicamente, a Luta pelo
Direito desconhece sexo, gênero, cor, nível de escolaridade e até mesmo
condição econômica. Um exemplo recorrente, por ser um clássico moderno da Luta
pelo Direito contra a escravidão, é o esforço de Thoreau (1966 e 1987), em dar
voz à ação de homens brancos (julgados e condenados) por seu envolvimento
direto nas lutas pela abolição da escravatura nos EUA. No Brasil não foi
diferente. Portanto, a Luta pelo Direito (igualdade, isonomia e equidade), como
luta política, sempre é, essencialmente, uma esfera da luta de classes. Não se
vê, enfim, como “mais uma luta”, mas, sim, como luta pela sobrevivência. Sempre
haverá uma luta entre Direito e Justiça – e a nossa própria consciência:
Não será
possível que o indivíduo tenha razão e que o governo esteja errado? Aplicam-se
leis pelo simples fato de terem sido feitas? Ou porque um certo número de
pessoas as declararam boas, quando não o são de fato? [...] Terão os juízes de
interpretar a letra em vez do espírito? (Thoreau, 1987, p.68).
O capítulo da Constituição de 1988
sobre o meio ambiente (artigo 225) é um dos mais sublimes, ali desfilam os
direitos de todas as gerações, desde o sentido mais óbvio da prevenção (que nos
acautela diante do “não-fazer”), como se fossem lições herdadas dos sábios do
passado, de gente que viveu experiências que não deveriam ser replicadas no
futuro, como real aprendizado de gerações e de tradições herdadas, até os
direitos das gerações futuras.
Esse
artigo 225 da CF88, uma polifonia de vidas, de passado e futuro entrecruzados,
é o bastante para nos dizer o que significa o Estado Ambiental (Canotilho, 1999),
como repositório e repertório de civilidade, de verdadeiro e aprofundado
sentimento de pertencimento e de cuidados com a Humanidade.
Não
é só um capítulo, talvez seja o mais importante de toda a Constituição de 1988,
pela simples razão de que sem meio ambiente equilibrado, preservado, defendido,
restaurado, não há como se manter a vida. Sem fauna e flora, nós não existimos
– é simples assim. Não há interesse nacional que justifique colocar-se em risco
a natureza, como no caso da exploração de petróleo nas proximidades da Foz do
rio Amazonas. Não há interesse econômico que prepondere sobre a preservação do
pantanal, da Amazônia, da Caatinga, dos Pampas, da Mata Atlântica.
É
isso e muito mais o que vemos no artigo 225 da Constituição de 1988, um convite,
um emblema, um libelo e um legado permanente para que busquemos por todas as
formas de contenção do agronegócio devastador dos biomas, com desmatamento e
poluição, além de promover a expulsão das comunidades locais. Ou de
literalmente caçar os povos tradicionais da floresta, os povos originários, o
povo adaptado à natureza, caboclo, quilombola, cafuzo, mameluco.
Essa
obrigação é, acima de tudo, uma imposição social com dever de ser manifesta e
cumprida por todos os cidadãos: é uma responsabilidade coletiva diante da
afirmação de um direito difuso. O meio ambiente diz respeito a todos e todas,
por isso é um direito que se espraia, difunde-se, em todo o tecido social. A
poluição, a degradação do meio ambiente, como se diz, são democráticas, não
ignoram, não poupam ninguém.
Se observarmos com atenção, nunca
haverá conclusão de atividades e de reflexões sobre os tratados e os trâmites
constitucionais. Cada capítulo, artigo, inciso, alínea, abre-se para uma
comunicação com outros tantos direitos, deveres, garantias, liberdades,
manifestos em toda a Constituição de 1988. A educação retrata o direito de ser
ao longo de toda a vida, como firme propósito de se estender como Educação
Permanente, e isto nos conduz ao meio ambiente que se quer para as gerações
futuras. E ambos nos dirigem ao Direito a ter direitos que está assegurado no
artigo 5º da Constituição de 1988.
Esta
é apenas uma demonstração, como a relação que estabelecemos com o pensamento
escravista – racismo e exploração do trabalho humano análogo à escravidão –, e
que poderia se estender por muitas construções conceituais. Neste sentido, vale
destacar dois princípios constitucionais e as suas variadas articulações – são
eles: o Princípio da Unicidade Constitucional e o Princípio do não-retrocesso
moral e social.
Não há como observarmos
separadamente, sem que um interfira diretamente no outro. Por Unicidade
Constitucional observamos que não podemos destacar, pinçar, pedaços da
Constituição para construir uma análise validável. E se é assim que deve ser,
logo, nenhuma análise legitimável da Constituição de 1988 poderá ser empregada
para obstaculizar, restringir, negar, o Princípio da Dignidade Humana.
Ou seja, não há
interpretação ou emenda constitucional que possa ser justificável se, com isto,
busca-se deturpar ou decidir contra os postulados, princípios e pressupostos da
própria Constituição Federal de 1988. Num sentido bem popular, podemos concluir
dizendo que não podemos usar o Texto Constitucional para afirmar um retrocesso moral
ou social.
A
Constituição de 1988 tem uma lógica interna, pautada na dignidade humana, e
nenhum poder, nenhuma pessoa, nenhuma autoridade, nenhuma interpretação tem
juízo de realidade válido para impor seus juízos de valor contrários ao sentido
e Nexo Constitucional.
É inegável que a Constituição de 1988, em que pese, tenha recebido inúmeras modificações que procuraram sua desfiguração, com a perda de poderes e de alcance social, ainda mantém seu eixo condutor, nossa guia de cidadania. Nossa Constituição de 1988 recebeu inúmeros apelidos, codinomes, adjetivações e nem sempre foram positivas – diz-se, especialmente, que é muito comprida, longa e, por isso, não é cumprida. O que, evidentemente, é um abuso da lógica, porque a intenção de ser cumprida não está em sua extensão e sim na cultura social e política. Dito de oura forma, se fosse curta, enxuta – como a Constituição dos EUA – também seria desrespeitada. Como dizia Ulysses Guimarães, os traidores da Pátria são os mesmos traidores da Constituição. Fato, aliás, que sobeja no Poder Judiciário, quando se voluntaria a ser intérprete da Constituição, mas a interpreta contrariamente aos próprios Desígnios Constitucionais. Como é que os intérpretes da Constituição podem ler sim, onde está escrito não – e vice-versa? Isso não é interpretação, é abuso, descrédito, deturpação da própria língua portuguesa, da lógica, da capacidade cognitiva mediana. O Supremo Tribunal Federal (STF) jamais deveria atuar desse modo, a começar da mais alta Corte do país e, notoriamente, porque é o STF o guardião da Constituição – ou deveria ser. Com tantas variações de humor, de interpretações nocivas ao Texto Constitucional, não é de se estranhar que o povo a ignore. O trabalhador, a trabalhadora, a professora, o professor não são adeptos de sua leitura, nem mesmo quando falamos dos seus próprios direitos fundamentais. E assim com o jurista não será diferente, posto que não é adaptado em seu lar ao cultivo da Lei da Cidadania e, quando chega aos cursos de formação em Direito, não se modifica da água para o vinho: não há milagres, não existe almoço grátis. Do mesmo modo, magistrados igualmente desfilam desconhecimento constitucional – muitas vezes com certo escárnio ou comprovando-se o analfabetismo constitucional – e é claro que ignoram, solenemente por vezes, em suas decisões (reformadas) a lição aprendida no ensino fundamental, como vimos nesses slides: a Constituição é a Lei das Leis. Queremos mudar isso? Se sim, nos apliquemos à Educação Constitucional, em todos os seus princípios e pressupostos, como efetiva Educação pela Constituição, e com grande destaque que se trata de uma Carta Política. Portanto, que ofereçamos ao povo brasileiro uma educação político-jurídica com destino à cidadania, à democracia, ao poder popular.
Referências
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A Condição Humana. Rio de Janeiro : Forense Universitária, 1991.
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CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estado de Direito.
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DIAS, Adriana Machado; BELLUSCI, Maria Eugenia (org.).
Pitanguá mais história: manual do professor. 5° Ano. 1. ed. São Paulo:
Moderna, 2021.
LASSALLE, Ferdinand. Que
é uma Constituição. 2. ed. São Paulo: Kairós, 1985.
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