Segunda-feira, 23 de outubro de 2023 - 15h01
Fizemos uma entrevista sobre os 50 anos do Golpe Militar, no
Chile, com outros docentes para a Revista Ciência&Cultura da SBPC. Uma
parte das observações estão disponíveis neste link: https://revistacienciaecultura.org.br/?p=4819. Ironicamente, em 2023, completamos 35 anos
da promulgação da Constituição Federal de 1988 e dos embates na busca do
reconhecimento, da afirmação e da defesa dos direitos humanos. A seguir, seguem
as perguntas e as respostas na íntegra.
1. A ditadura terminou em 11 de março de 1990. Quais suas
consequências para a sociedade - e a política - chilena? E como impactou em
outros países da América Latina?
A ditadura chilena foi
uma das piores da América Latina, pela crueldade, níveis de violência e também,
ou sobretudo, pela aniquilação da soberania do país e pela imposição de uma
política que em seguida seria vendida para o mundo ocidental: o neoliberalismo.
Pinochet foi o responsável pela solvência das condições de vida de quase toda a
população – salvo as elites que aderiram ou financiaram essa experiência
econômica que só tinha um objetivo regular: expropriar a classe trabalhadora,
subjugando-a à imposição do princípio da hierarquia e da obediência por meio da
coação, coerção, violência extrema. Tatcher e Reagan foram seus seguidores
naquela fase do avanço do capital que já se apresentava como bucaneiro e
especulativo. O Consenso de Washington serviria como indicador jurídico,
cartilha de legitimação do capitalismo predador das subjetividades: o que sentimos
hoje, com a pejotização, uberização, financeirização que, inclusive, mantém as
rédeas do Estado Rentista, tem aí suas matrizes militares, econômicas e jurídicas.
Os níveis de
dessocialização, desconstrução do humano – o que também se denomina de estranhamento
e de brutalização –, foram tão acentuados que a sociedade chilena está
repartida em duas. É como se uma parte ainda lutasse por justiça, reparação e
penalização dos carrascos – apesar de já terem avançado – e a outra metade
(digamos assim) ainda se mantivesse crente nos resultados trazidos por
Pinochet. Um exemplo da magnitude da fissura social, rompimento do liame mínimo
da pacificação social – que poria fim às ações da guerra civil durante a
ditadura – nós vemos na recusa do projeto normativo da Constituinte chilena. Eleitoralmente,
ganhou uma esquerda mais delimitada do que a frente que ganhou as eleições de
2022 – ainda que sob concessões com outros setores e espectros políticos, é (ou
era) uma esquerda mais demarcada. De modo contrário, antagônico, oposto, no
primeiro teste de forças – contando-se que Executivo e Legislativo estavam
alinhados com o resultado da Constituinte –, o mesmo povo que elegeu a esquerda
derrotou sua Constituição em plebiscito popular: “havia muito esquerdismo”. Penso
que este é um recorte dessa desconstrução societal que, ao que parece, não
logrará avanços significativos tão rapidamente.
A comparação com o
bolsonarismo, no Brasil, não é adequada; porém, para efeito de comparação,
imaginemos que metade da população brasileira ainda estivesse sob o jugo
ideológico do Fascismo que nos forçou desde 2013-2016, até 2022.
A ditadura
chilena não só impactou a América Latina como ainda reflete em nossos dias, a
partir da adesão massiva à compulsão de morte, repressão e “naturalização dos
regimes de exceção” – de certa maneira, é como se tudo fosse normal, natural,
das polícias que promovem chacinas até a expropriação máxima da força de
trabalho da classe trabalhadora, notadamente, os mais precarizados, com pouca
escolaridade, sem vínculos significativos com a representação sindical. Os
subalternos estavam e estão submersos, com poucas vias de entrada no mundo
econômico. As chamadas “elites” (plutocracias ou autocracias) estavam e estão gerindo
os mesmos níveis brutais de dissolução social.
2. Há circulação de diversas narrativas ao longo de 50 anos.
Qual o peso da falta de informação sobre o que aconteceu? Como o governo e a
sociedade estão buscando lidar com isso?
Costumo pensar que
por “narrativas” estamos contando meias verdades, inverdades ou simplesmente
mentiras. Se entendermos que são várias narrativas contadas sobre um mesmo
fenômeno – brutalização estatal e social – é porque algo não está adequado. No
brasil, para efeito retórico, é comum, popularizou-se o debate sobre o Supremo
Tribunal Federal (STF) e as condenações da tentativa de golpe do 8 de janeiro:
uma parcela significativa das pessoas chega a discutir a dosimetria das penas,
como se fossem notórios juristas da área criminal e não leigos. E quando, de
fato, a importância das discussões não reside aí, mas, sim, na consciência
político-jurídica de que se intentou um golpe canhestro, chulo até nas
filmagens e nos resíduos orgânicos deixados, e de sua responsabilização e
punição pelos crimes de tentativa de golpe de Estado e de dissolução do Estado
Democrático de Direito. Na verdade, nem a mídia oficial se arrumou
conceitualmente, pois não retrata o ocorrido como tentativa de golpe de Estado
(tipo penal) e sim “baderneiros e arruaceiros” – querendo-lhes atribuir um
crime menor, quase pueril.
Enfim, como
comparativo, as narrativas sobre o Estado de Exceção (ditadura), mortes,
sequestros, torturas, desaparecimentos, não deveriam ser tratadas no plural.
Diante dos fatos aberrantes, da descontinuidade da regularidade, da quebra
sistemática da previsibilidade, por exemplo, de que o Estado não poderia ser o
algoz da sociedade, da perda praticamente em definitivo da chamada “crença no
direito” – que é uma régua de justiça –, não deveriam haver narrativas: só uma.
Se temos muitas e para muita gente ainda há aderência aos preceitos de um
regime nefasto diante da dignidade humana, da vida, é porque a história da
verdade não se pronunciou com a força devida. Alguns, enevoados ainda hoje pela
pulsão de morte, estão retidos no cristalino da ditadura, de suas maldades e
perversidades. Isto é, diante de tão graves e nefastos, gravíssimos crimes
contra a humanidade, contra os direitos humanos fundamentais só é possível haver
uma narrativa: autores, financiadores, partícipes dos crimes da ditadura
chilena precisam ser punidos no máximo rigor da lei. Para que, no futuro breve,
a negação dos crimes contra o povo chileno seja tão punível pela lógica,
epistemologia, convicção da realidade, quanto pelo direito chileno. Para que
ninguém mais negue as barbáries e nem se negue a enfrentar a dura realidade que
ora se apresenta. Diante da negação da realidade, construir narrativas –
afastadas dos fatos, em busca de outras legitimações – sempre, inevitavelmente,
será um açodamento por entre areias movediças e semoventes da verdade.
3. Qual é a primeira contribuição dada à luta pelos direitos
humanos para a restauração da democracia no Chile?
Tentarei sintetizar algo que é concomitante,
não se separando por método positivista, apenas para efeito didático. Primeiro,
vamos acertar nossa premissa: Não é normal que se tenha apreço pela negação da
realidade, mas isso também ajuda a entender a compulsão pela dor e pela
morte.
É esse o ajustamento
que a luta pelos direitos humanos traz para todos nós. É essa convicção a
primeira a ser exigida, num tipo ou momento inaugural da consciência dos
direitos humanos fundamentais.
Em seguida, é fácil
perceber que a denúncia é uma espécie de segunda fase: quando não há mais
dúvidas diante das narrativas de negação dos direitos humanos e, sim, na
identificação, punição dos sádicos institucionais. Nesse encaminhamento,
desmontar as institucionalidades criadas pela ditadura de Pinochet ainda é um
objetivo - não é uma realidade. Veja-se que a Constituição vigente, com
reformas, é herança da ditadura: é a Constituição de Pinochet reformada que
informa a realidade dos direitos humanos no Chile. Comparativamente, a nossa
Constituição é de 1988.
É obvio que a luta
pelos direitos humanos ocorre em todas as dimensões da vida – são direitos,
inclusive, consagrados à natureza, agora tida como sujeito de direitos e não
somente objeto tutelado pelo “Direito dos Homens” (essa era a expressão adotada
em 1789, no bojo da Revolução Francesa). Lutamos por direitos humanos
fundamentais no âmbito do trabalho, da saúde, da educação, da segurança
pública. No Brasil, como referencial, leia-se o artigo 7º da Constituição
Federal de 1988 (CF88), bem como os artigos 3º, 4º, 205, 206, 207, 208, 215,
225. Observemos como é interessante configurar o capítulo constitucional sobre
a segurança pública, que adstrita aos direitos humanos e à dignidade, deveria
ter como marco conceitual a pacificação social, e não só a prevenção e a
repressão.
Pois bem, outra
observação nos levaria à consciência de que devemos reconhecer, defender e
promover o conjunto complexo dos direitos humanos (do clima aos encarcerados ou
esquecidos pelo modo de produção capitalista). Nesta seara, a educação em
direitos humanos se notabiliza, porque é capaz de formar, forjar, mentes e
corações poderosos na defesa intransigente dos direitos humanos – mormente se
pensarmos nos currículos escolares afinados desde o ensino fundamental. Desse
modo, são (ou seriam) mentes e corações absolutamente intolerantes diante do
que é intolerável – por exemplo: tortura, depravação institucional, degradação
humana e ambiental. Simplesmente, não há como ser tolerante diante das
desigualdades, da “dor do Outro”, sem que seja a nossa também.
Isso tudo,
movendo-se entre conhecimento (ciência), consciência e ação, a luta pelos
direitos humanos suplanta as fases iniciais e propositivas da denúncia – que,
obviamente, são necessárias e contínuas (infelizmente as violações dos direitos
humanos são diárias, e, então, as denúncias também não cessam. Porém,
imediatamente após as primeiras constatações, atos concretos (individuais e
coletivos) já são iniciados.
Na educação, de
modo mais específico, podemos partir das denúncias mais recorrentes para enveredarmos
no “que fazer” e no que estudar. A luta pela conservação da afirmação histórica
dos direitos humanos exige essa articulação entre a crítica social,
institucional, a retomada da realidade, com o estudo dos direitos humanos e a
investigação dos marcos, das bases de formação da própria sociedade em que
estamos submersos. Ninguém vive acima da realidade, bem como a ninguém é dado o
direito de se indispor contra os direitos humanos – é crime contra a
humanidade.
De modo bem
resumido podemos/devemos avalizar os conteúdos basilares, mas radicais, que
estão presentes na “metodologia da educação em direitos humanos”. A primeira
noção a reter é que “educar em direitos humanos” implica em educar em conjunto,
a partir de um nivelamento da realidade dos direitos humanos que é comum a
todos. Desse modo, não se educa “para” os direitos humanos – como se estivesse
ali ou acolá. Educar e educandos (em direitos humanos) estão aqui mesmo.
Educa-se fazendo, com envolvimento e colaboração coletiva. É claro que os docentes
estão ali, na condição de docentes, por razões óbvias, não devem estar
desprovidos de estudo e de conhecimento prévio – o próprio conhecimento nos
desnivela, contudo, a experiencia, a vivência, o “lugar de fala”, nos nivela
novamente.
Se tivesse que
resumir ao máximo um conteúdo dessa amostragem de educação em direitos humanos
– assim definida desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 –
diria que esses conceitos, pressupostos, devem ser averiguados, difundidos,
denunciados em caso de violações. Quais sejam:
“Inviolabilidade: os
direitos humanos não podem ser violados em estrutura, especialmente pelo Estado
porque este deveria zelar por sua organicidade.
Imprescritibilidade:
ainda que sejam vistos em gerações sucessivas de direitos, garantias e
liberdades, os direitos humanos não se perdem ao longo da luta política que os
constituiu.
Efetividade: como
são dotados de garantias constitucionais, constituem-se em direitos que requerem
eficácia imediata, plena, tendo o Poder Público o poder-dever de zelar por sua
consubstanciação.
Interdependência: na
condição de super-princípios, os direitos humanos fundamentais não se excluem,
exigindo convivialidade harmônica e observação de sua estrutura funcional.
Complementariedade: os
direitos humanos fundamentais visam atingir objetivos e valores constitucionais
democráticos, exigindo complementação legal dentro da própria natureza
histórica que move sua condição de gerações de direitos. Por isso, não há que
se falar em níveis ou graus de importância entre os seus princípios e marcos
regulatórios.
A
isto, some-se a condição de que os direitos humanos são:
® Naturais, porque ligados à natureza
humana e independem de legislação própria e específica;
® Indivisíveis, porque têm que ser
conquistados em todos os campos;
® Essencialmente Públicos, uma vez que,
para sua garantia, é necessária uma intervenção pública: e sendo públicos, são
reclamáveis;
® e,
como são Reclamáveis, pode-se exigir
a garantia de autoridades competentes.
Finalizando-se este
apontamento, observa-se que é esse o arcabouço teórico que nos desafia, hoje,
sob o chamado Relativismo cultural, isto é, a discussão sobre o embate entre
universal e o histórico (cultural), principalmente porque a Universalidade rege o respeito ao
indivíduo em sua integridade física e psíquica.
Enfim, quem dirá o que é
desumano, o que afeta a integridade física e psíquica, o que é Ético,
suportável e condizente com a Emancipação, é a própria consciência que a
Humanidade guarda e promove de si”.
São todos esses acertos de
conta que o povo chileno precisa fazer, e reconhecer a ditadura após 50 anos,
com todos os traumas e mazelas, é a primeira lição de casa.
4. Uma pesquisa do CERC (Centro de Estudos da Realidade
Contemporânea) e do instituto MORI indica que o percentual de pessoas que
acreditam que houve uma razão para o golpe de Estado de 1973 caiu de 36% em
2003 para 16% em 2013, mas voltou para 36% em 2023. Como o sr. vê a figura de
Pinochet depois de 50 anos – especialmente num cenário de avanço da extrema
direita na América Latina?
Pinochet foi um
general sádico, odiável em todos os sentidos. E digo odiável com plena
consciência do que estou dizendo, afinal, se não odiasse quem ordenou a morte,
a tortura em massa, quem criou uma verdadeira escola de torturadores,
psicopatas, das duas uma: teria adesão a esse tipo de pessoas ou seria
indiferente a essas pessoas (o que, por omissão, me transformaria num apoiador
dessa situação indescritível de barbárie). Diante dos crimes contra a
humanidade, contra os direitos humanos, não há espaço para a omissão e a
indiferença. Aqui se opera num jogo binário da política: somos a favor ou
contra os psicopatas e as sociopatias que crescem mundo afora?
É mais ou menos
assim que vejo a figura de Pinochet, na semelhança de um Médici ou Ustra no
Brasil: são agentes do Fascismo Institucional, da barbárie anunciada a plenos
pulmões (como Bolsonaro fez na tribuna da Câmara, em 2016), são disruptivos,
dissolutivos da memória nacional, dos laços imemoriais da civilidade e da
solidariedade. Pinochet e nem Ustra podem ser celebrados, não há “razão de
Estado” d=que justifique isso: a morte de mulheres, jovens, crianças indefesas,
não pode ser perdoada. Não podem haver as tais narrativas (insculpidas em
mentiras) que procurem validação, justificação – e, por óbvio, não é possível
observarmos pacificamente esse fenômeno de adesão ao fracasso humano voltar a
ser celebrado.
Da mesma maneira,
é muito preocupante vermos o delineamento das eleições presidenciais na
Argentina, em 2023. O projeto político fascista está em curso, em forte
movimento de aprofundamento dos meios mais corrosivos e disruptivos da
política. Na Argentina, o Fascismo renitente na procriação (como diria Brecht)
é um tipo de transfiguração, transmutação do neoliberalismo e neocolonialismo,
mas um emblema pós-moderno e de puro negacionismo. É chamado de
anarcocapitalismo. Sem esquecer do absurdo lógico contido em seu título, é
preciso lembra que o modelo econômico de Pinochet (neoliberalismo) apregoa a
destruição dos aparatos estatais, especialmente, na diminuição de impostos que
acarretam a falência dos sistemas públicos e das pol´ticas públicas. Ou seja,
esse anarcocapitalismo projetado para a Argentina, sem dúvidas, é uma herança
neocolonial (distópica) do neoliberalismo de Pinochet.
Afora isso tudo, a
própria ofuscação da consciência sobre a barbárie tende à “naturalização do
Mal”, como diria Hannah Arendt, e assim todo o Mal é encoberto, possibilitado, empurrado
para fora das consciências e dos valores. Em outras palavras, o crescente
entendimento de que a ditadura chilena “não foi assim tão ruim” é m péssimo
sinal de alerta para todos nós aqui na América Latina.
5. O governo acaba de lançar o Plano Nacional de Busca de
vítimas de desaparecimento forçado sob o regime Pinochet. Qual impacto que o
plano irá trazer ao ambiente da celebração?
É muito provável,
quase uma certeza em definitivo, que os desaparecidos naquele contexto estejam
todos mortos. É muito provável que não se encontre ninguém com vida. Então é
uma condição simbólica, para as famílias eternamente enlutadas e para a
sociedade – à medida em que as “buscas” podem/devem levar aos mandantes, aos
executores, aos financiadores e beneficiados pela ditadura chilena. Há
reparações a serem feitas, além das punições. E essas reparações devem
encontrar o patrimônio pessoal de todos os atuantes na ditadura chilena – todos
e todas que se beneficiaram com a morte e o vilipêndio do povo. Devem encontrar
o capital familiar e empresarial dos apologetas do golpe, dos que se
enriqueceram com a degradação humana. Portanto, além de punição/reparação, há
um conjunto pedagógico assimilado: os males com esse nível de ataque à
dignidade do povo jamais serão esquecidos, os algozes nunca serão perdoados –
não receberão placas com os seus nomes, as ruas, com seus nomes, receberão os
nomes de suas vítimas. É óbvio que não defendo prisão perpétua, não é disso que
se trata – até os algozes também ou estão mortos ou em idade absolutamente avançada.
É um não-perdão simbólico e todos os que vierem a ser condenados pelos crimes
da ditadura receberão penas igualmente simbólicas: como se pode encarcerar
idosos de 80, 90 anos? Seria como nos colocarmos no mesmo patamar dos algozes.
Entretanto, com suas condenações, se levados aos tribunais da justiça, o recado
será dado ao presente (não perdoamos, jamais, crimes contra a humanidade) e ao
futuro: não se arrisquem nesse caminho, nós, a justiça histórica, os
alcançaremos, cedo ou tarde. Infelizmente não produzimos nada disso aqui no
Brasil da Anistia.
Temos outra chance
agora, contra os crimes cometidos contra a Nação. Parece que chegaremos a algum
resultado. Mas, é preciso aguardar o “trâmite em julgado”, do alto da cadeia
alimentar do poder autocrático (2018-2002) até o mais ignorante dos terroristas
do 8 de janeiro.
6. Por que o que aconteceu no Chile é importante para a
compreensão da política hoje, não apenas no país, mas na América Latina como um
todo?
A ditadura chilena foi um nefasto
experimento sociometabólico do capital, com requintes de crueldade, vilipêndio
humano, de acordo com os piores valores econômicos (degradantes para as
condições mínimas de sobrevivência da maioria do povo chileno) e sob a égide
dos piores níveis de psicopatia imagináveis. Por isso e por tudo que tratamos
aqui hoje, é um alerta máximo que de que a luta política no combate ao Fascismo
renitente (e procriado) deve ser constante, atuando-se nos lares, nos bares, no
trabalho, nas ruas, nos grupos sociais, nas escolas. Por onde passarmos, a
menor fraqueza demonstrada diante das mais graves violações dos direitos
humanos, os vacilos em denunciar (levantar-se da mesa, por exemplo, é um ótimo
sinal), são sempre um convite para que o Mal prospere: nada fazer diante do
Mal, diria com Kant, é fazer muito para que o Mal vença.
Esta
é, nos parece, a lição mais dura e difícil que enfrentamos (não sei se
aprendemos adequadamente) desde 2013, com a revolta infanto-juvenil, desde 2016
– com o Golpe de Estado institucional (um tipo de Cesarismo de Estado, fazendo
uma paráfrase com Gramsci nos Cadernos do Cárcere) – e com a ascensão do
Necrofascismo em nosso país. Não é pouca coisa, é muita coisa acumulada,
agregada, quando pensamos na Argentina e em seu modelo implosivo dos padrões
medianos de compreensão da realidade, igualmente mediana para a imensa das
pessoas.
Esse
fascínio pelo Fascismo e suas barbaridades é relutante, atuante, resiliente,
altamente reprodutivo. Essa é a lição que temos que decorar, para saltar aos
olhos toda violação dos direitos humanos e quando confrontados com a mínima
ameaça à nossa dignidade e capacidade integrada de desenvolvermo-nos nos
ambientes mais acolhedores da inteligência humana.
Quando
relemos Gabriel Garcia Márquez, que não era argentino, mas colombiano, na sua
fase conhecida como “generalíssimo” sempre teremos lições profundas para
refletir, compartilhar e assim evitar o grave erro de cometê-las em duplicatas.
Numa paráfrase, concluiria
assim:
·
A barbárie é um assombro latino-americano,
mistura-se tragicamente em nossas realidades, promove convulsões em qualquer
pretensão de racionalidade, como se vivêssemos num eterno vai e vem em que o
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de
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