Terça-feira, 23 de julho de 2024 - 09h15
CONLUIO
O Decreto 29.251,
do último três de julho, baixado pelo Governo de Rondônia tem provocado
polêmica nos meios políticos e empresariais em razão de ser uma iniciativa de
mimo tributário que atende ao interesse de apenas uma indústria rondoniense. O
advogado Caetano Neto, através das redes sociais, denunciou um provável conluio
tributário para privilegiar uma das maiores empresas rondonienses que tem
sócios cujas relações de amizade são estreitas com o governador Marcos Rocha.
MIMO
É um alento para o
empresariado quando os governos diminuem a carga tributária que invariavelmente
é extorsiva e penaliza quem gera emprego e renda. Mas quando a diminuição é
direcionada para atender interesses supostamente inconfessáveis de uma única
empresa estadual, sem que as demais possam usufruir do mesmo mimo, é no mínimo
imoral. E é o que fez transparecer o decreto estadual ao diminuir a carga
tributária de uma empresa estadual que produz bicicletas, coincidentemente a
única do ramo em Rondônia.
DIRECIONAMENTO
Em razão do princípio
da isonomia tributária, o decreto não poderia ser destinado a uma empresa,
mesmo sendo por um convênio de ICMS aprovado pelo Confaz. Tal princípio
constitucional é uma trava legal para evitar o privilégio da exclusividade de
um contribuinte em detrimento aos demais. E ao que tudo indica é o que
aconteceu, visto que o Decreto se trata de um adicional de 2,37% de crédito
presumido referente ao benefício concedido pela Lei 1558/2005. Essa lei
estabelece que o crédito presumido a ser concedido para indústrias que aderiram
ao termo de acordo com o CONDER será de até 85%, sendo este o limite máximo.
ILEGALIDADE
Já o decreto editado,
portanto, permite um adicional de 2,37% à indústria rondoniense de bicicletas,
aumentando o crédito presumido para 87,37%, sem que uma lei anterior
autorizasse. Além de o incentivo fiscal ser ampliado sem as formalidades
legais, limitaram sua abrangência supostamente para atender apenas a quem se
destinou. A coluna pesquisou nos sites oficiais quantas empresas do ramo seriam
beneficiadas e somente encontrou uma, a Cairu, no município de Pimenta Bueno.
Consultando técnicos do próprio tesouro estadual a coluna foi informada
que o decreto usurpa prerrogativas legislativas e de conteúdo eivado de
ilegalidades.
RENÚNCIA
O mimo tributário, ao
longo do exercício fiscal, tende a sangrar a arrecadação estadual em
aproximadamente cem milhões de reais. Uma renúncia na arrecadação que poderia
contribuir para o governo desafogar em tese a rede hospitalar. São
recursos que Rondônia não deveria abrir mão, uma vez que os gargalos nas mais
diferentes áreas da administração pública necessitam de investimentos. Todos
contribuintes perdem, exceto a Cairu.
PEROROÇÃO
A pergunta de fundo é
também saber os motivos pelos quais um decreto é editado com destinação
específica e supostamente para atender com exclusividade apenas um segmento
produtivo estadual. Contribuinte que, não raro, abre as portas das suas
fábricas para autoridades fazerem perorações em período eleitoral aos seus
“peões”. Foram perguntas que a coluna enviou ao Secretário Estadual de
Finanças, que de pronto, enviou as explicações que seguem...
EXPLICAÇÃO I
"Com relação ao
Decreto 29.251/2024, esclareço que se trata de benefício fiscal aprovado pelo
CONFAZ para diversos Estados, por meio do Convênio ICMS nº 69/2023 e do
Convênio ICMS nº 198/2023, visando ajustar a alíquota de ICMS aos níveis
praticados anteriormente ao aumento da alíquota modal para indústrias
incentivadas, a fim de conferir segurança jurídica às empresas instaladas em
cada Estado em função de incentivos tributários."
JUSTIFICATIVA II
Para conceder esse
benefício, além da adesão ao Convênio ICMS nº 198/2023, a SEFIN realizou
estudos técnicos buscando identificar, dentre as indústrias sujeitas à nova
alíquota modal, aqueles que estariam mais propensos a eventual relocalização de
suas plantas por estarem distantes de sua matéria-prima e/ou do seu mercado
consumidor. Foram identificados 17 segmentos econômicos potencialmente
afetados. O Secretário Luís Fernando relacionou 17 empresas, entre elas, a
Cairu.
JUSTIFICATIVA III
O impacto estimado da
concessão do benefício, sob a forma de crédito presumido adicional de 2,37%,
foi de R$ 6.113.778,26 para o primeiro ano, valor que foi inserido na Lei de
Diretrizes Orçamentárias por meio da Lei n. 5.795/2024, de 14 de junho de 2024,
cujo art. 3º alterou o quadro - Anexo da Estimativa e Compensação da Renúncia
de Receita, que compõe o Anexo I da Lei nº 5.584/2023 (Lei de Diretrizes
Orçamentárias para o ano de 2024).
JUSTIFICATIVA IV
Após a autorização da
Assembleia Legislativa para alteração da Lei Orçamentária, conforme determina a
Lei de Responsabilidade Fiscal, a SEFIN elaborou o Decreto concessivo do
benefício, optando por restringir mais o rol de CNAEs beneficiados, num
primeiro momento, visando mitigar o impacto dessa renúncia e adotando como
critério prioritário a preponderância de vendas interestaduais. Assim,
prevaleceram na redação final do decreto os seguintes setores: 3092000
Fabricação de bicicletas e triciclos não motorizados, peças e acessórios;
3292202 Fabricação de equipamentos e acessórios para segurança pessoal e
profissional.
JUSTIFICATIVA V
Contribuiu ainda para
a escolha desses dois setores num primeiro momento da internalização do
benefício, o fato da produção nacional dos bens oriundos especialmente do
primeiro segmento estar bastante concentrada na Zona Franca de Manaus, com
isenção total de ICMS, o que eleva o risco de perda de investimento industrial
em Rondônia.
TRÉPLICA
Apesar das
justificativas que a SEFIN gentilmente nos enviou, através do seu titular,
resta comprovadamente que apenas uma única indústria em Rondônia conseguiu
diminuir a carga tributária com um decreto específico para o que produz. O
curioso é que no ano passado o Governo de Rondônia se esmerou para que a
Assembleia Legislativa aumentasse o ICMS o que, na época, mobilizou a classe
produtiva contrária à proposta e fez o executivo recuar. Recua mais uma vez só
que para socorrer um único contribuinte.
FORMA
Ademais, a forma pela
qual o tributo foi mitigado é discutível, uma vez que necessitaria em tese de
uma lei própria para que o legislativo autorizasse e que alcançasse de forma
isonômica todos os contribuintes e geradores de emprego e renda, a exemplo da
Cairu. Feitas tais considerações, a coluna agradece a presteza de Luís
Fernando, técnico da melhor qualificação.
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