Segunda-feira, 26 de junho de 2017 - 05h21
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) está elaborando regulamentação que trata sobre os requisitos mínimos para o funcionamento dos serviços de vacinação no país. A norma já passou por consulta pública e, se aprovada, permitirá que farmácias apliquem vacinas. Entretanto, entidades médicas temem que a resolução possa precarizar o serviço de vacinação e colocar em risco a população.
Segundo a Anvisa, a permissão para farmácias disporem de vacinas está prevista na Lei nº 13.021/2014, que trata sobre o exercício e a fiscalização das atividades farmacêuticas, e, com ela, a regulamentação vigente sobre o controle sanitário para estabelecimentos privados de vacinação, se tornou insuficiente para farmácias e drogarias.
“A fim de diminuir o risco da população brasileira frente ao possível uso e administração inadequados de um medicamento tão peculiar quanto a vacina, principalmente em estabelecimentos que não têm um histórico antigo na prática da vacinação, a Anvisa propõe norma sanitária com requisitos mínimos para a prestação dos serviços de vacinação”, diz a Anvisa, na justificativa da proposta.
Atualmente, além da rede pública, somente clínicas de vacinação podem oferecer o serviço, regulamentadas pela Portaria Conjunta Anvisa/Funasa nº 01/2000.
Entre outras exigências, pela norma atual, a clínica deve ter um médico como responsável técnico pelo estabelecimento. Segundo a presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai, essa exigência é muito importante e está sendo retirada da nova proposta. “Ela tira a obrigatoriedade de maca, consultório e médico para atender evento adverso, desde o desmaio até anafilaxia. Isso não é serviço de vacinação, é aplicação de injeção”, disse ela, explicando que o médico especialista em vacinação é importante desde a triagem até o diagnóstico de reação à vacina.
A proposta de regulamentação em análise na Anvisa diz que o estabelecimento deve ter um profissional habilitado e capacitado para o serviço de vacinação. Também prevê que, em caso de intercorrências, ele deve garantir o encaminhamento do paciente ao serviço médico. E as vacinas que não fazem parte do calendário oficial do Programa Nacional de Imunizações deverão ser feitas mediantes prescrição médica.
Riscos à população
Para Isabella, esses requisitos não são suficientes e, acabar com as regras atuais pode ser prejudicial para a cobertura vacinal, pois um serviço precário de vacinação pode levar medo às pessoas. “A SBIm não discute onde a vacina é aplicada, na clínica médica ou farmácia, o que defendemos é a qualidade e manutenção das normas para que a vacinação não seja banalizada e a população não corra risco de erros. As normas deveriam ser mais exigentes e não menos”, disse a médica.
“Estamos falando de movimentos de antivacinismos, mitos, medos, famílias que circulam informações erradas em redes sociais. Um erro pontual pode fazer a população perder a confiança na imunização. Que sejam bem-vindas as farmácias, desde que o rigor nas exigências seja mantido”.
O presidente da Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas (ABCVAC), Geraldo Barbosa, concorda que os requisitos mínimos propostos podem prejudicar os serviços. “Não somos contra vacina estar em farmácias. Mas temos um nível de exigências que se provou muito eficaz para conseguir os resultados de imunização. Então, se vai entrar farmácia nesse mercado, porque flexibilizar a lei?”, disse, informando que os laboratórios de análise clínica passaram a oferecer vacinas porque se enquadraram na legislação atual.
Segundo a presidente da SBIm, também é errado falar em maior acesso da população às vacinas, pois as farmácias devem priorizar grandes mercados. Além disso, ela explica que a indústria de vacina não foi levada em conta para a edição da proposta de regulamentação. “A falta de vacinas que vivemos na rede privada é absurda, e isso deve ser colocado em discussão. E com o aumento dessa rede pode ser que se tenha menos vacinas ainda porque os fabricantes não conseguem atender o mercado”, argumentou Isabella.
Barbosa complementa dizendo que a previsão para a demanda atual de vacinas ser normalizada é entre 2020 e 2022, porque os laboratórios já estão no limite de produção e novas fábricas estão sendo construídas.
Interesse comercial
Para ele, o interesse comercial das farmácias é apenas na vacina contra gripe. “Não estão preocupados com o esquema vacinal completo”, disse. Segundo Barbosa, a vacina contra gripe é o que ajuda a manter o custo operacional das clínicas de vacinação, já que a operação de outras vacinas é quase negativo. Então, para ele, a nova regulamentação pode prejudicar a qualidade e acesso ao serviço quando as clínicas começarem a cortar custos com outras vacinas para pode competir no mercado.
A norma ainda está em elaboração e recebeu centenas de contribuições durante a consulta pública, que ocorreu no mês de maio. Não há prazo para a votação no colegiado da Anvisa.
Para o presidente do Conselho Federal de Farmácia (CFF), Walter da Silva Jorge João, a possibilidade das farmácias aplicarem vacina é uma ação social e as farmácias irão se adequar à regulamentação da Anvisa para garantir a qualidade do serviço e as condições impostas.
“Temos que ver as farmácias como unidades prestadoras de atenção à saúde e assistência farmacêutica, que têm sua contribuição com as políticas de saúde do país. É um avanço social. E vacina é medicamento e, sendo medicamento, o farmacêutico tem propriedade para fazer a aplicação”, disse.
Segundo João, a indústria precisa ter um olhar positivo para a situação dos estoques, pois vai aumentar o número de postos que passarão a oferecer as vacinas. O presidente do conselho ressalta ainda que o Brasil possui 80 mil farmácias e a concorrência com as clínicas de imunização vai ajudar na queda dos preços de vacina para a população.
A proposta de regulamentação sobre os requisitos mínimos para o funcionamento dos serviços de vacinação no país está disponível na página da Anvisa.
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