Domingo, 1 de novembro de 2009 - 08h27
AMAZÔNIA: BRASIL IGNORA O MAIS IMPORTANTE BANCO GENÉTICO DO PLANETA (II)
Roberto Gueudeville
Afonso era funcionário do SPI – Serviço de Proteção aos Índios, hoje FUNAI. Experiente na selva, fala bem o kaiapó. No inicio de 1968 chegava à cidade de Altamira, no Pará, com um saco às costas com 3 crânios de trabalhadores da rodovia que seria a Transamazônica, arcos e flechas de índios que ninguém conhecia. As onças tinham devorado os corpos. Outros silvícolas, já atraídos, os chamavam de “Cabeça Pelada” pelo hábito de pelar as cabeças e usar longas perucas que eles mesmos confeccionavam. Entendiam que a rodovia bloqueava suas áreas de caça e pesca e atacaram. A imprensa abriu manchetes. Fazia tempo que não se via uma chacina tão violenta.
Em Brasília, o general Albuquerque Lima, Ministro do Interior, logo formou uma expedição e convocou os três maiores sertanistas brasileiros: Chico Meireles, Orlando e Cláudio Vilas Boas.
Integrei-me à expedição como jornalista. O avião do ministério, um C 47, do comandante Dario, nos deixou em Altamira, sede das ações da missão.
Orlando, o mais falante, e os outros decidiram que partiríamos da cidade de Porto de Moz, nas proximidades da foz do Xingu. De lá, subiríamos o rio Jaraucu, último afluente do grande rio pela margem esquerda, até encontrar o seu afluente Penatecaua, de onde continuaríamos na tentativa de surpreender os índios pela sua retaguarda.
Enquanto isso as primeiras iniciativas para a construção da rodovia Transamazônica continuavam. Era prioridade para os militares. Homens sem terra para terra sem homens!
Subíamos em duas canoas com capacidade de 3 toneladas, cada uma, empurrados com motor de popa Arquimedes 10 x 12, aquele que de meia em meia hora quebra o pino, quando submetido a uma pressão maior. No ar, tínhamos o apoio da FAB com caças N.A., uma decisão errada do oficial responsável. Sua rapidez não permite visualizar corretamente os alvos, no meio de uma densa floresta como a Amazônia. Éramos 15 homens, cada um com 30 kg às costas, incluindo panelas, apitos, facões, espelhos e outras bugigangas que seriam deixadas para atrair os índios.
No quarto dia de subida, de 200 em 200 metros com uma grande árvore caída, bloqueando nossa passagem e que era abatida na base do machado, à mão, outro erro na preparação da expedição, o primeiro desastre. O cheiro de podridão tomava todo o ambiente. Podridão de carne de bicho grande. Subimos o barranco e tropeçamos em vários corpos de índios mortos, já em decomposição. Orlando me pediu pelo amor de Deus para não fotografar. Atendi-o. O chefe do posto retornou com uma forte gripe que dizimou 80% dos Kararaôs, sub grupo Kaiapó.
Com extrema dificuldade, íamos avançando. Deixamos o Jaraucu e entramos no Penatecana. Era o décimo dia. O NA da FAB passava rápido, como um foguete, nos deixando uma sensação de absoluto abandono. Até o momento, nem sinal dos Cabeça Pelada.
Eram nossos companheiros um grupo de cinema que filmava para a BBC de Londres, Adrian Cawell, diretor; o alemão bisneto de Bismark, neurótico de guerra, o fotógrafo Jesco Von Putkamer, com a sua sanfona, era o cinegrafista e um loirinho inglês, auxiliar que carregava o tubo canhão das gravações. Adrian tinha uma leishimania na perna direita e todos os dias, religiosamente, aplicava ele próprio uma injeção, tentando curá-la. Inglês raçudo na selva.
No vigésimo dia deixamos o igarapé e enfrentamos a selva bruta, a pé. O mais dramático é que não havia água, na maior bacia fluvial do planeta. Lembro que Chico Meireles molhava sua cueca numa cacimba e passava pelo corpo. Cada um de nós já não suportava sua própria catinga.
Passamos por uma, duas, três aldeias de índios, todas abandonadas, mas havia vestígios de roças de banana, batata, etc, o que significava que eles estavam por perto.
Eu trabalhava com uma velha Roleiflex 6 x6 e um velho rifle winchester 44. E o medo estraçalhava minha mente, implantando a dúvida se, diante de um índio brabo, o que usaria, a Rolei ou o 44. Ninguém dormia. Um sufoco. A moral da tropa começava a cair. O avião da FAB, nunca mais.
Antes de completar um mês de caminhada que a maioria de nós já questionava a validade, distribuindo presentes para índios brabos, sem ver um sequer, eis que topamos com outra aldeia. Esta, também vazia, tinha dois mourões fincados no chão e distantes 1,5 m do outro. Postes do sacrifício, falou Chico Meireles. Em um deles estava a peruca loura que eles usavam tipo a dos lordes ingleses em sua Câmara Alta. O medo aumentou. Os sertanistas Vilas Boas e Chico Meireles, pela peruca identificaram os índios como do grupo Tupi.
Já cansados, acampamos à margem de um pequeno igarapé, aguinha de palmo e meio, moral no calcanhar. Madrugada. O vigia grita: Índio! Vimos de fronte, algumas sombras. Eram eles. Nos cercaram, o tempo todo, os donos da floresta. Hoje sabemos que são os Araras, cuja reserva fica acima de Altamira, margem esquerda dos rios Iriri – Xingu.
Quando o C. 47, após 40 longos dias, pousou em Brasília, Chico Meireles foi preso por um coronel araponga. Apelei ao Orlando que se escondeu atrás do avião. Eram adversários, defendiam teses opostas sobre o destino dos índios brasileiros. O Chico começou a morrer!!
Fonte: Roberto Gueudeville (Encaminhado por Sílvio Persivo ao Portal Gentedeopinião).
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