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Camponeses cortam Água Viva e obtêm 250 lotes em Corumbiara



 

Camponeses cortam Água Viva e obtêm 250 lotes em Corumbiara - Gente de Opinião
Comitê de Defesa e LCP fortaleceram famílias que conseguiram assentar-se em área onde funcionou acampamento /DIVULGAÇÃO



 EPAMINONDAS HENK
Com Montezuma Cruz

FAZENDA SANTA ELINA, Corumbiara (RO) – A emoção estampada no rosto de cada camponês revelou o quanto esperaram para cortar cerca de 250 lotes de oito alqueires e preservar aproximadamente mil alqueires de mata. Assim que as linhas iam sendo abertas, recebiam o nome de um dos camponeses assassinados em 1995. Na medida em que as parcelas iam sendo cortadas já era prontamente feito o sorteio e a entrega dos lotes aos seus novos donos.

Situada a quase oitocentos quilômetros de Porto Velho, a Fazenda Santa Elina é o primeiro latifúndio amazônico a ter uma reforma agrária fora dos padrões oficiais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Foi cortada pelas mãos de camponeses ali acampados e dali despejados várias vezes.

Recentemente funcionários do Incra em Colorado  do Oeste responsabilizaram as famílias pelo “não andamento do processo  de desapropriação da fazenda”. Elas reagiram, alegando ter se alimentado de negociações, conversas, acordos e promessas não-cumpridas durante 15 anos”.

–  Será que é mesmo responsabilidade das famílias?  Com razão, o povo já cansou de esperar por quem não vem, já cansou de esperar pela falida reforma agrária do governo e agora está aplicando a Revolução Agrária, tomando e cortando as terras e entregando as parcelas para quem nela trabalha.

Durante os sorteios, alguns camponeses tremulavam as mãos ao tirarem o papelzinho com o número do seu lote. Nas diversas falações, eles manifestaram alegria pela realização do sonho de ter um pedaço de terra. Parecia um refrão, mas eles repetiram a frase: “Dessa terra, agora ninguém me tira mais!”.
 
 

Camponeses cortam Água Viva e obtêm 250 lotes em Corumbiara - Gente de Opinião
A polícia sempre teve na mira essa área onde agora os camponeses semeiam na expectativa de nunca mais serem despejados /DIVULGAÇÃO


 

Sorteio por ordem de chegada

O tempo dirá se esse corte terá validade ou sofrerá contestação. O Comitê de Defesa das Vítimas de Santa Elina (Codevise) e a Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia e Amazônia Ocidental sortearam as famílias por ordem de chegada ao acampamento, intercalando com as famílias das vítimas da chacina ocorrida na madrugada de nove de agosto de 1995.

LCP e Codevise informaram esta semana que o corte popular de parte da fazenda totalizou 3.164 alqueires, correspondente à área denominada Água Viva, agora fora do latifúndio dos herdeiros de Antenor Duarte do Vale. 

Até hoje o governo federal não indenizou as vítimas, apesar de sucessivos relatórios do Incra, da Ouvidoria Agrária Nacional e promessas de autoridades estaduais e federais. Há três anos, o Codevise coordenou o acampamento de vítimas da chacina ou parentes delas, em Brasília.

 

Camponeses cortam Água Viva e obtêm 250 lotes em Corumbiara - Gente de Opinião
Vítimas de sucessivos despejos, vítimas ou parentes dos sobreviventes da chacina de 1995 agora ocupam lotes cortados por conta própria /DIVULGAÇÃO
 

 
 

Do “capim e miséria” à produção

FAZENDA SANTA ELINA – Uma assembléia dos camponeses definiu o corte e uma comissão se encarregou de executar a decisão. Todos se revezaram nas tarefas, num clima de alegria: enquanto uns operavam os equipamentos, outros preparavam a alimentação, outros carregavam água, abriam picadas, organizavam marcos demarcatórios etc.

Demarcaram o loteamento, passando ao largo das promessas do Incra. Segundo o Codevise, a terra “que antes era de apenas uma família e só produzia capim e miséria, agora serve para produzir alimentos, sustentar centenas de famílias e desenvolver a região”.

– Há 15 anos essa terra foi regada com o sangue de tantos companheiros que por ela lutaram, e por isso o corte dessa terra tem um significado muito especial – assinala o Codevise.

As famílias construíram suas casas,gradearam os lotes e iniciaram a semeadura de milho, feijão e outros grãos .Organizaram ainda uma horta coletiva,desde o início de setembro.
 

 

Camponeses cortam Água Viva e obtêm 250 lotes em Corumbiara - Gente de Opinião

Organizados, diversos grupos empenharam-se em plantar, fazer mudanças, obter água e colocar marcos divisórios /DIBULGAÇÃO

 

As pedras no caminho da “Revolução Agrária”

FAZENDA SANTA ELINA –Para a LCP e o Codevise não tem sido fácil o chamado avanço da “Revolução Agrária” na área da Fazenda Santa Elina. Além de ter que enfrentar pessoas oportunistas dentro e fora da área, os camponeses sofrem ameaças da polícia e advertências do Poder Judiciário.

Desde a ocupação, em 25 de julho de 2010, as polícias civil e militar foram à área cinco vezes e em todas quis intimidar os camponeses. Agentes e Pms vasculharam ameaçaram prender lideranças. A juíza Sandra Beatriz Merenda, da 2ª Vara Cível de Vilhena, expediu em agosto de 2010 uma liminar de reintegração de posse para a área ocupada, alegando que “se trata de propriedade plenamente produtiva”.

A juíza estipulou multa diária de R$ 500, determinando que a polícia identifique e conduza os ocupantes para a delegacia. Além disso, determinou para as fazendas vizinhas o interdito proibitório, mandando prender todos os que ali estivessem.

– Em nenhum momento a autoridade levou em consideração o fato de que a área já foi palco de um dos mais sanguinários crimes do latifúndio contra a luta camponesa. Ela simplesmente ignorou todo o processo de discussão entre nós e o governo federal, já que a área foi oferecida por decreto para fins de reforma agrária – queixa-se o Codevise.

Para o órgão, “é praxe em Rondônia, a justiça servir aos interesses dos exploradores, dos latifundiários, dos grandes burgueses e dos seus politiqueiros”.

– A cada nova decisão judicial enquanto por um lado se ataca os mais pobres, particularmente os camponeses, criminalizando sua justa luta, por outro a “justiça” acoberta os mais odiosos crimes do latifúndio – acusa.

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