Segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012 - 19h43
PATRÍCIA FACHIN
Do IHU OIn-line
Trinta anos depois do boom de investimentos em infraestrutura, o Brasil volta a projetar a construção de grandes obras na região norte e nordeste do país, onde está localizada parte da Floresta Amazônica. Desta vez, o ciclo de empreendimentos traz à tona uma discussão atual: como ampliar o crescimento brasileiro preservando áreas florestais e garantindo qualidade de vida à população da região. “Aquele manto verde, quase impenetrável e destrutível, depois de três décadas de ocupação e desenvolvimento, está sendo degradado em função de uma economia baseada na extração dos recursos naturais
Municípios mais desmatados são os que apresentam maior índice de violência, aponta Veríssimo. "A disputa pela terra tem gerado assassinatos e as mortes que ocorreram recentemente não estão isoladas desta dinâmica." /AGÊNCIA PARÁ |
de forma predatória”, denuncia Adalberto Veríssimo. Romper com a conjuntura histórica de desmatamento, violência e pobreza na Amazônia, segundo o pesquisador do Imazon, é um dos desafios do governo.
Em entrevista a IHU On-Line concedida por telefone, ele afirma: "Se não forem feitos investimentos correspondentes em outras áreas, o PAC, por si só, não vai resolver o problema de subdesenvolvimento da Amazônia e pode, inclusive, agravar o desmatamento e os conflitos sociais”.
Adalberto Veríssimo é engenheiro agrônomo, pós-graduado em Ecologia, pela Universidade Estadual da Pensilvânia, EUA. Cofundador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia - Imazon, atualmente é pesquisador sênior da instituição.
Confira a entrevista.
O senhor pesquisa a Floresta Amazônica há mais de 15 anos. Que transformações percebeu no ecossistema ao longo desse tempo?
Estudo especialmente a região da Amazônia e posso dizer que existem três características importantes na história da região. A primeira é em relação ao desmatamento: até 1975, apenas 0,5% do território havia sido desmatado. No entanto, de 1975 em diante, a situação piorou e, hoje, 18% dessas terras estão desmatadas. Em função disso, aumentaram os problemas ambientais e estimamos que 40% da floresta já esteja afetada pelo fogo, pela exploração madeireira e pela caça. Aquele manto verde, quase impenetrável e destrutível, depois de três décadas de ocupação e desenvolvimento, está sendo degradado em função de uma economia baseada na extração dos recursos naturais de forma predatória.
A segunda característica da Amazônia é a violência. Ao longo da minha trajetória como pesquisador, tenho visto que há uma correlação entre violência rural e urbana nas cidades do interior e a taxa de desmatamento. Os municípios mais desmatados são os que apresentam maior índice de violência. A disputa pela terra tem gerado assassinatos e as mortes que ocorreram recentemente não estão isoladas desta dinâmica. Não é a primeira vez que lideranças ambientais e sociais são vítimas da ganância. Essa situação de conflito sempre esteve presente no processo de desenvolvimento da região. É bom lembrar que a Amazônia é um território imenso e que os conflitos estão localizados em uma área geograficamente pequena. Só o estado do Pará, onde moro, é maior que toda a região sul e sudeste. Os conflitos acontecem em uma extensão de terra equivalente ao estado do Rio Grande do Sul.
Quando se fala em Amazônia, temos de lembrar que também existem diferentes Amazônias: a Amazônia do alto Rio Negro concentra populações indígenas e é muito diferente da Amazônia do Marajó, da Amazônia do rio Trombetas, do rio Solimões. Eu sempre me refiro a Amazônia que está no chamado arco do desmatamento, a região que mais está sendo impactada pelo desmatamento e pelas ações da fronteira agrícola.
O terceiro aspecto é em relação ao subdesenvolvimento. Mesmo com a ocupação recente na Amazônia, ela continua pobre. Nos anos 1970, a Amazônia contribuía com aproximadamente 7% do PIB nacional e hoje o percentual permanece o mesmo. Além do mais, os indicadores sociais da Amazônia sempre estão abaixo da média nacional e da própria região nordeste, que é o concorrente mais pobre. Portanto, a região é subdesenvolvida social e economicamente. Algumas ilhas de prosperidade estão relacionadas à zona Franca de Manaus ou áreas de mineração.
Apesar de ter essas características negativas, a Amazônia tem uma face positiva. Ela oferece oportunidades para o Brasil, pois é superlativa em tudo: água, carbono, madeira, tem potencial hidrelétrico e jazidas minerais gigantescas. Além disso, ela é importante para o clima do Planeta e pode agravar os efeitos climáticos caso seja destruída.
Qual a situação social e econômica das populações que vivem próximas às áreas florestais?
Na Amazônia desmatada - onde os municípios já perderam mais de 80% da cobertura vegetal -, que se estende da região sul do Pará até o Maranhão, se tem o pior dos mundos porque a natureza foi destruída e a pobreza se manteve ou foi agravada. O modelo de exploração da floresta gera uma riqueza passageira e a previsão é de que, à medida que florestas sejam destruídas, a pobreza se agrave.
Nos municípios onde a floresta está sendo desmatada atualmente, as pessoas têm uma melhoria na renda em função do atual boom econômico. Entretanto, aumentam os conflitos em função da disputa pela terra. Xingu e Marabá são municípios típicos desse tipo de fronteira. Nas regiões mais remotas da Amazônia, onde existe a maior área florestal, há pobreza, mas não miséria. A situação mais dramática está na região desmatada e isso mostra que o desmatamento não melhora a condição de vida das pessoas.
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