Terça-feira, 20 de agosto de 2019 - 06h00
A
região do Médio Solimões, no Amazonas, abriga centenas de comunidades
ribeirinhas, presentes também nas diversas unidades de conservação da área. As
pessoas que lá moram, além de terem de se adaptar à dinâmica dos rios locais
com drásticas variações anuais no nível da água, enfrentam uma série de
desafios relacionados ao isolamento geográfico, que limita o acesso a serviços
básicos, como estradas que as conectem às cidades, cabeamento elétrico público
e estruturas para saneamento básico, telefonia e internet. Todos esses
problemas têm uma origem em comum: a falta de políticas públicas nessas
localidades. Para
trocar experiências e buscar soluções para essas questões, um grupo de jovens
lideranças ribeirinhas criou a Rede de Gestores Comunitários. Os integrantes
são alunos e ex-alunos do Centro Vocacional Tecnológico (CVT) do Instituto
Mamirauá. O marco inicial da rede se deu em um encontro que mobilizou membros
do CVT de quatro turmas diferentes, nos dias 7 e 8 de agosto, em Tefé, no
estado do Amazonas. Sandro
Regatieri, gestor do CVT, revela que a ideia de reunir as turmas em um coletivo
que pudesse trocar conhecimentos e soluções é antiga. “Desde que o CVT surgiu,
nós percebemos que havia uma grande diversidade geográfica e de conhecimentos e
experiências entre eles e acreditamos que essa troca entre os estudantes era
uma das potencialidades do centro”. O
Centro Vocacional Tecnológico O CVT
do Instituto Mamirauá oferece bolsas de dois anos de estudos para alunos
indicados por comunidades ribeirinhas e associações comunitárias da região. Os
estudantes passam o primeiro ano em aulas teóricas e práticas em Tefé, onde
fica a sede do instituto, e no segundo retornam às respectivas comunidades para
implementar um projeto relacionado ao manejo de recursos naturais ou à melhoria
da qualidade de vida das pessoas de seu local de origem. Entre
outras atividades, os alunos do CVT têm aulas com os pesquisadores e técnicos
do instituto sobre manejo sustentável de recursos naturais, gestão de
organizações e a respeito de tecnologias sociais adaptadas para as condições da
região que possam sanar problemas como a falta de energia elétrica e água encanada
nas comunidades. “O que
o CVT deu para essas pessoas foi informação. Nas oficinas, nos encontros, nas
aulas e na participação social dos eventos em que eles estiveram presentes. O
CVT abriu horizontes para que elas pudessem olhar além da comunidade delas, do
problema delas, dos desafios que só elas tinham. Agora eles sabem que são
cidadãos e cidadãs, podem e devem lutar por melhorias na qualidade de vida das
comunidades e por uma sociedade melhor”, explica Sandro. “Hoje
eu tenho uma visão muito mais ampla de organização. Eu vejo que nós temos
recursos naturais, temos uma biodiversidade muito grande atrás da nossa casa e
muitas vezes, por falta de conhecimento, não sabemos utilizá-la de forma
organizada e controlada”, acrescenta Adriano Ferreira, ex-aluno do CVT que hoje
atua no acordo de pesca Jurupari Grande, no setor Mamirauá da Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. O
Centro Vocacional Tecnológico do Instituto Mamirauá, organização social
fomentada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações,
conta com o apoio da Fundação Gordon e Betty Moore. A rede Ao
final de seu primeiro ano como alunos do CVT, integrantes da turma 2017 – 2018
começaram a pensar em como trocar as experiências e ajudar uns aos outros no desenvolvimento
de seus projetos. Depois da formatura da turma, um grupo teve a ideia de criar
a Rede de Gestores Comunitários, que funcionaria como um coletivo para a troca
de conhecimentos. “A
gente quis pensar em uma maneira de poder se comunicar nesse segundo ano. Em
uma conversa, pensamos em conhecer, fazer viagens a comunidades de outras
pessoas, às associações de outras pessoas”, conta Weigson Pedrosa, ex-aluno do
CVT. “Decidimos criar uma rede. Pensamos
no intercâmbio: por exemplo, se a minha associação está começando e a
associação da comunidade de um colega está superdesenvolvida, a gente vai lá
conhecer a organização, a liderança, e tentar trazer isso para a organização
que está no início”. O
primeiro encontro reuniu alunos e ex-alunos de quatro turmas diferentes para
organizar e delimitar qual seria o papel da rede e como ela funcionaria.
Chegou-se à conclusão de que a rede não deveria ser mais uma associação, mas,
ao invés disso, reunir jovens das diversas instituições já existentes para que
o conhecimento e a experiência dessas pessoas possam ser trocados e as
organizações fortalecidas. Ficou decidido também que a rede não receberia
apenas alunos e ex-alunos do CVT, mas abriria as portas a outras pessoas
interessadas. “O que
eu vejo é que eles, com essa consciência de espaço, consciência política e
cidadã, podem fazer a diferença. Então a rede surge para fazer com que os
verdadeiros protagonistas possam influenciar a sociedade”, ressalta Sandro. Um dos
maiores desafios que a Rede de Gestores Comunitários terá de enfrentar é a
dificuldade na comunicação entre seus integrantes, devido ao escasso acesso à
telefonia celular na região. “A
realidade deles é o Médio Solimões, com todas as complexidades e desafios. E
eles têm a consciência disso e de todos os desafios que eles têm que enfrentar:
distância, falta de comunicação, falta de políticas públicas, falta de
interatividade. Eles sabem disso porque eles vivem essa realidade no dia a dia”,
complementa Sandro. “A rede tem o potencial de melhorar a vida deles e a vida
na região, se eles souberem utilizar as ferramentas que têm da maneira correta.
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