Terça-feira, 13 de agosto de 2019 - 11h59
O peixe-boi-amazônico (Trichechus inunguis) é uma
espécie de mamífero aquático que ocorre apenas na bacia amazônica e pode pesar
até 450 quilos. Caçada intensamente a partir dos anos de 1500, a espécie é
considerada vulnerável à extinção pela União Internacional para a Conservação
da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).
A carne do peixe-boi de água doce é altamente
apreciada e consumida tradicionalmente em comunidades ribeirinhas da Amazônia.
Por isso, mesmo com a proibição de sua caça desde 1967 no Brasil, o consumo do
animal por humanos ainda acontece em regiões da Amazônia afastadas dos grandes
centros urbanos.
Com o objetivo de traçar um panorama da ameaça à
espécie na região do Médio Solimões, na Amazônia Central e para melhor
desenvolvimento de ações de conservação na área, a pesquisadora do Grupo de
Pesquisa em Mamíferos Aquáticos do Instituto Mamirauá, Hilda Chávez coleta
dados de eventos de caça do peixe-boi na área desde 2017.
Os resultados levantados desde então foram
divulgados em pesquisa apresentada no 16º Simpósio sobre Conservação e Manejo
Participativo na Amazônia (Simcon), em julho. O estudo apontou que de janeiro
de 2017 a abril de 2019 ocorreram 95 eventos de caça nas reservas de
desenvolvimento sustentável Mamirauá e Amanã.
“O resultado não é um total bruto, pois é muito
provável que existam eventos de morte não declarados”, atesta a pesquisa de
coautoria da especialista em mamíferos aquáticos amazônicos Dra. Miriam
Marmontel.
O número foi obtido a partir de conversas informais
com os próprios pescadores e por relatos de Agentes Ambientais Voluntários
(AAVs) que atuam nas duas unidades de conservação. As pesquisadoras também
obtêm informações de como se dão os eventos de caça, os locais onde ocorrem com
maior frequência, e se os produtos são comercializados ou não.
Educação ambiental para diminuição da caça
“A caça é ilegalizada, mas a realidade é outra. Ela
existe e não podemos negar isso. Por isso reunimos esses dados”, explica Hilda,
que também afirma que há formas de remoção mais perigosas à espécie.
“É comum, por exemplo, que os filhotes emalhados
nas redes de pesca sejam utilizados para atrair a as fêmeas lactantes e quando
os filhotes e fêmeas são retirados do ambiente, o ciclo reprodutivo da espécie
é mais abalado e, consequentemente, o risco à espécie aumenta”, afirma a
pesquisadora, que procura esclarecer os pescadores sobre essa e outras
informações acerca da espécie para amenizar o impacto sobre o
peixe-boi-amazônico.
A pesquisadora diz que foi identificada uma menor
tendência de transferência das técnicas de caça do animal a gerações mais novas,
o que é um bom indicativo. Ainda assim, atesta: “Existem pescadores que dominam
essas técnicas, então o trabalho é grande para erradicar a caça. ”
Crescimento populacional
De acordo com Hilda, os relatos dos comunitários
dos últimos dois anos podem indicar um crescimento populacional do
peixe-boi-amazônico na área. “Em 2017 eles relatavam que era muito difícil
encontrar, em 2018 já falavam que estava tendo mais peixe-boi e agora, em 2019,
ainda mais”, diz.
A preocupação, explica a bióloga, é que a maior
quantidade de espécimes nos rios e lagos possam eventualmente implicar em um
aumento da caça. “Se há mais peixe-boi, é porque a caça diminuiu. Mas agora
pode acontecer um efeito nverso. Os comunitários veem que tem muito, então
podem acabar pensando que por isso podem caçar”, afirma.
Por isso, a importância da educação ambiental, esta
muitas vezes realizada pelos próprios comunitários que também atuam como
agentes ambientais voluntários.
Desafios da pesquisa
Para conseguir os relatos de eventos de caça, a
bióloga passa por momentos desafiadores em suas expedições de pesquisa nas
comunidades. “É preciso criar uma relação de vínculo e de confiança. Ainda
assim, muitos têm medo de fiscalização e não fornecem as informações”, explica.
Além disso, a pesquisadora afirma que a falta de
recursos para passar períodos mais longos na reserva também dificulta a coleta
mais precisa dessas informações.
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