Domingo, 16 de setembro de 2012 - 17h18
A preservação da floresta localizada na região conhecida como Madre de Dios está arriscada devido a nova estrada entre Brasil e Peru /OPERA MUNDI |
MARCIO ZONTA E VITOR SION
Opera Mundi
Em janeiro de 2011, a inauguração de uma estrada que liga o noroeste do Brasil ao sul do Peru facilitou o intercâmbio comercial entre os dois países, mas também gerou inúmeros problemas na região. Com acessos permitidos a lugares até então preservados, surgiram diversas atividades extrativistas ilegais decorrentes da construção da Rodovia Interoceânica Sul, que também aumentou o tráfico de madeira e a mineração artesanal.
“Há um grau de devastação imensurável nas zonas florestais por onde essa estrada passa. A nova via possibilita o escoamento da madeira retirada clandestinamente de forma mais hábil e rápida”, explicou ao Opera Mundi o cientista social do Fórum de Defesa de Solidariedade ao Peru, Antonio Zambrano Allende.
De acordo com estudos da entidade, as perspectivas para a região nos próximos 20 anos são bastante negativas, com possibilidade de especulação imobiliária devido à compra de terras para o agronegócio.
“Como já ocorreu em outras estradas com características semelhantes à Interoceânica Sul, primeiro coloniza-se a área para extração de madeira e depois surge o interesse pela terra, com consequente intervenção do agronegócio. Por fim, esse processo culmina na especulação no valor da terra ao longo de toda a estrada”, afirmou Allende.
Os impactos no entorno da rodovia e as precauções necessárias para a preservação da região, conhecida como Madre de Dios, também foram analisados pela ONG CSF (Fundo Estratégico de Conservação), que confirma a análise de Allende. “As áreas que necessitarão de maiores esforços para conservação são as que foram concedidas a empresas madeireiras, pois, no futuro, deverão sofrer pressão para a implementação de atividades agropecuárias”, analisa o estudo. A companhia também alerta que a localidade apresenta um dos maiores índices de biodiversidade do mundo.
Até mesmo as comunidades indígenas que vivem próximas ao projeto foram afetadas. “A escola está de um lado e o povoado, do outro, o que aumentou muito o número de atropelamentos em nossas comunidades”, lamentou Guiné Moura, morador da região.
A população que vive próxima à rodovia também tem enfrentado diversos problemas desde a inauguração do projeto, no início de 2011 /OPERA MUNDI |
Histórico
A Interoceânica Sul, que, no Brasil, passa pelo Estado do Acre, faz parte de um projeto assinado em 2000 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso com governantes de outros 11 países latino-americanos. A proposta, batizada de IIRSA (Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-Americana), foi financiada inicialmente pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), tendo como meta interligar, via construção de estradas, os principais portos existentes na América Latina.
De acordo com o projeto, que também tinha o objetivo de integrar os setores de comunicação e energia da América do Sul, o Brasil era obrigado a investir US$ 50 milhões por ano na iniciativa. Durante o governo Lula, porém, esse valor passou para US$ 990 milhões anuais, não só para a Rodovia Interoceânica Sul, mas também para a construção da Interoceânica Norte, além de outros projetos conjuntos de geração de energia.
O objetivo central da rodovia, de incrementar o comércio entre os dois países, foi atingido. Apesar de ser difícil mensurar o impacto da estrada, o intercâmbio entre os dois países passou de US$ 2,9 bilhões, em 2010, para US$ 3,6 bilhões, no ano passado, valor mais alto nas relações entre Brasil e Peru.
“A estrada beneficiou principalmente os pequenos e médios empresários. O setor de alimentos foi o mais beneficiado. As grandes companhias ainda preferem a via marítima”, lembrou o presidente da Câmara Brasil-Peru, César Augusto Maia.
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