Domingo, 17 de abril de 2016 - 07h51
Reginaldo Trindade[1]
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O caráter redundantemente provocador do título é proposital.
Um dos mais famosos diamantes de todos os tempos se chama Esperança (Hope, em Inglês). Cuida-se de uma magnífica e rara pedra azul de 44 quilates (cada quilate pesa 0,2 gramas), que já pertenceu a várias famílias reais.
Existem muitas outras gemas célebres em todo mundo.
O “Taylor” pertenceu à atriz Elizabeth Taylor, que o colocou à venda e, com parte da renda, pretendia construir um hospital em Botswana. Somente para inspecionar a pedra, os compradores tinham que pagar U$2.500,00. Em junho de 1979 ele foi vendido por quase três milhões de dólares.
Na Idade Média acreditava-se que um diamante poderia reatar um casamento desfeito. Usado em batalhas como símbolo de coragem, Napoleão tinha um diamante raro em sua espada (diamante chamado, primeiro, de “O Pitt”, por ter pertencido a William Pitt, mais jovem Primeiro Ministro Britânico da história, e, depois, de “Regente”).
Marilyn Monroe dizia que “Os diamantes são os melhores amigos das mulheres”. Devem ser mesmo porque, não bastasse todo o glamour, beleza e misticismo atribuído às pedras, elas ainda podem ser utilizadas, atualmente, em tratamento estético (peeling de diamantes), promovendo renovação celular, clareando manchas etc., sendo até menos agressivo que o peeling químico.
O “Cullinan” foi o maior diamante já encontrado. Ele pesava incríveis 3106 quilates (mais de meio quilo!). Em seu processo de lapidação, o lapidador desmaiou várias vezes; mas conseguiu transformá-lo em nove pedras grandes e cem menores. Uma das joias está incrustada nada menos que na coroa da rainha da Inglaterra.
No entanto, a pedra preciosa não está associada apenas a riqueza, glamour e beleza.
O Hope, por exemplo, esteve envolvido na morte de 12 pessoas e causou tragédias em duas famílias reais. O célebre diamante pertenceu a Luís XIV, que o utilizou uma única vez e morreu de varíola depois. Luiz XVI herdou a gema e Maria Antonieta foi vista com ela diversas vezes. Ambos terminaram decapitados na Revolução Francesa.
Ou seja, a maior e mais fantástica riqueza da Terra tem lá seus altos e baixos.
Acontece que há um lugar nesse maravilhoso planeta em que o diamante só tem servido para trazer coisas ruins; gerando apenas tristeza, miséria, desolação. Nesse lugar não existem altos, só baixos...
Em reportagem já um tanto antiga da Revista Época, o semanário questionava “Por que o Brasil deixa a maior jazida de diamantes do país, na terra dos índios cintas-largas, entregue aos contrabandistas?”.
As coisas mais simples são as mais difíceis de entender.
A excelente matéria afirma que o país deveria regulamentar a exploração, à semelhança do que fez o Canadá. “Essa seria a melhor opção para o Brasil. A outra é atolar na violência, como Serra Leoa”. A exploração, segundo a revista, poderia colocar o Brasil entre os três maiores produtores mundiais.
Esse paradoxo – viver em uma terra riquíssima e passar toda sorte de privações – tem afligido o Povo Cinta Larga muito mais que o leitor possa imaginar ou essa pena descrever. Como se cultivássemos uma horta maravilhosa em nosso quintal, mas não tivéssemos o que comer à mesa.
A encruzilhada em que se encontra o Povo Cinta Larga é absolutamente limítrofe.
Os diamantes têm servido, em suas terras, apenas para disseminar violência, provocar mortes e destruir a própria comunidade, pela perda das tradições e entrada de tudo que não presta na aldeia (prostituição, drogas, armas de fogo); além de não permitir o recolhimento de qualquer tributo pelo Governo.
Assim, para tentar desatar esse nó que há tanto tempo desafia o Estado brasileiro e, sobretudo, evitar novas tragédias, que podem acontecer a qualquer momento (em 2015 só não aconteceram por sorte, quiçá por intercessão divina), o Ministério Público Federal (MPF) em Rondônia iniciou, há algumas semanas, uma jornada, que já se antevê longa e tortuosa.
A finalidade da caminhada, definida pela própria Instituição como ousada, desafiadora e de difícil implementação: aprovar uma lei federal para autorizar a exploração de diamantes apenas nas terras do Povo Cinta Larga.
A singular propositura observa todas as vertentes possíveis (social, cultural, antropológica, ambiental etc.). Além disso, prevê o pagamento dos tributos devidos e a reversão do valor apurado com as vendas para toda a comunidade indígena.
Durante a reunião realizada em Brasília/DF, em fevereiro do corrente, com o Presidente da Funai, o procurador da República Reginaldo Trindade, idealizador da proposta, leu um texto que havia escrito na madrugada que antecedeu o importante encontro.
Queria que suas palavras e, sobretudo, pretensões, calassem fundo no coração dos representantes da fundação indigenista:
“Não se mata uma pessoa só com tiro, bomba ou envenenamento. Aliás, a morte que tem sido imposta a esses índios é a mais cruel de todas. É uma morte silenciosa. É uma morte que não aparece nas estatísticas. É uma morte que os jornais não noticiam. É uma morte coletiva, não apenas de uma pessoa. É a morte pela omissão, pelo dar de ombros. Pelo ‘não estou nem aí’. Pelo ‘não vai dar certo’. É uma morte lenta, dolorosa, agonizante... É o que temos chamado, Sr. Presidente, de genocídio... Genocídio daquilo que o Ser Humano possui de maior importância. Da última coisa que resta ao homem – por mais desgraçado e desafortunado que seja. É o genocídio da esperança, dos sonhos, da fé por dias melhores. Não nos deixemos curvar pelas dificuldades da batalha – por maiores que sejam! Pelo contrário, façamos dessas dificuldades nossa força motriz, nossa inspiração. Presidente João Pedro, o Senhor não estará sozinho nessa jornada. Terás um batalhão de pessoas de bem ao seu lado – aqui parcialmente representadas. Acima de tudo, o Senhor estará acompanhado da melhor companhia que um mortal pode almejar: a Justiça e o Amor.”
[1] Procurador da República. Responsável, no Estado de Rondônia, pela Defesa do Povo Cinta Larga desde abril/2004. Pós-Graduado em Direito Constitucional. Membro da Academia Rondoniense de Letras.
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