AMAZÔNIAS
JOSELITO MOTTA (*)
Temos bons motivos para comemorar em 22 de abril os 510 anos de vida deste País. Na sua chegada ao Brasil, em 1553, o Padre José de Anchieta viu a importância da mandioca e logo a batizou de pão da terra ou pão dos trópicos.
Quando Pero Vaz de Caminha escreveu a primeira carta ao Rei de Portugal, comunicou-lhe que a raiz brasileira já existia e fazia sucesso entre os indígenas. Ao referir-se aos nativos disse: “São tão rijos, tão nédios que não o somos tanto, com tanto trigo e legumes que comemos”. “Eles não comem senão doutra coisa a não ser dum inhame que brota da terra”, completou.
Era a mandioca, “o pão do Brasil”, o aipim, a macaxeira, desconhecida do colonizador europeu que sabia de algo semelhante, o inhame, proveniente das colônias da África portuguesa.
O deputado Fernando Melo (PT-AC) está apresentando na Câmara um projeto de lei que cria o Dia Nacional da Mandioca, a ser lembrado a cada ano, na mesma data do Descobrimento do Brasil. Isso anima a todos os que se dedicam ao resgate dessa cultura em lugares onde ela “adormeceu” ou foi atropelada por grãos de exportação.
Atualmente, a mandioca (Manihot esculenta Crants) está presente no dia-a-dia de 80 países e representa uma das principais explorações agrícolas do mundo. Colhem-se 170 milhões de toneladas/ano. Entre as tuberosas, ela perde apenas para a batata. A África é o maior produtor mundial com 53,32%, seguido pela Ásia (28,08%), Américas (18,49%) e Oceania (0,11%).
Estudos em sítios arqueológicos auxiliados pelo uso do carbono 14 indicam nosso País como o centro de origem e dispersão da espécie. Sua importância alimentar é base de sustentação para mais de 600 milhões de pessoas no mundo.
O Brasil produz em torno de 27 milhões de toneladas de raiz provenientes na quase totalidade de mais de 14 milhões de agricultores familiares. A condição de maior produtor mundial que possuía em anos passados foi ultrapassada pela Nigéria na África e mais recentemente pela Tailândia, caindo para o posto de terceiro lugar.
Além do projeto do deputado, o site da
www.malaguetacomunicacao.com.br, em Brasília, teve a feliz idéia de colocar a mandioca em evidência na Copa de 2014. O “País do futebol” teria assim a oportunidade de mostrar outras manifestações da cultura brasileira. Afinal de contas, temos muito mais do que belas mulatas, dribles performáticos, caipirinha e feijoada.
Para além do estereótipo, o maior evento esportivo do planeta pode ser uma oportunidade de apresentar um time de comidas e ingredientes regionais que compõem a gastronomia nacional. E, como toda equipe precisa de um mascote, a brasileiríssima mandioca seria uma representante de peso da cultura nacional.
O pessoal da Malagueta pensou num símbolo, o Mandioquinha. Com ele, fugimos dos clássicos segurando a bola ou com a bola no pé. A ilustração é dos gêmeos desenhistas paulistanos Fábio Moon e Gabriel Ba. Fábio sugeriu fazê-lo e matando a bola no peito, bem dinâmico e dramático. “Ele é meio escurinho, mulatinho, pretinho, com sobrancelha grossa e alguns cabelinhos na cabeça. Feinho e meio medonho, mas carismático. E sempre com um sorriso no rosto”, explicou o desenhista.
Mandioquinha é um personagem novo e fala um pouco mais do Brasil e do povo brasileiro. O mascote pode até não “pegar”, mas a proposta é criativa e se alinha à onda crescente de valorização da mandioca.
O que produz essa raiz? — Caldos, sucos, pães, bolos de puba, de aipim, escondidinho, bolachas, biscoitos, paçocas, cuscuz, tortas, rocamboles, mingaus, sopas, cremes, pudins, sorvetes, farinhas, pirões, purês, farofas, pizza, maniçoba, tacacá, tucupi, xibé, caxirí, ximango, xiringa, avoador, pêta, ginete, brevidade, casadinho, cozido e assado.
Dela fazemos também farinha de tapioca, sagu, tapioca pipoca, tapioca recheada, pão de queijo, beijus tradicionais e coloridos preparados com frutas e hortaliças.
Pratos quentes e frios, doces e salgados são exemplos da vasta culinária regional espalhada Brasil afora, como iguarias que evidenciam a presença da Raiz do Brasil.
Agregamos ainda outro valor de alta importância alimentar: o fato de a mandioca não conter glúten, tornando os seus derivados adequados aos portadores da doença celíaca. (Continua).
(*) O autor é pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical em Cruz das Almas, no Recôncavo Baiano.