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Abnael Machado

A importância do seringal na formação cultural da sociedade amazônica - 1


 

I - O MEIO GEOGRÁFICO

Para um melhor entendimento do aspecto cultural amazônico que pretendemos abordar, face aos aspectos antropo-sociológico e econômicos, necessário se faz, dar uma visão, embora superficial do ambiente fisiográfico que constitui o espaço da amazônia e o universo do homem que nele vive e atua. As particularidades amazônicas asseguram-lhe uma posição distinta não só no Brasil, mas na fisiografía sulamericana. Com área de mais de seis milhões de quilômetros quadrados, tem uma imensa participação no conjunto geográfico do continente americano. É constituída por uma vasta planície, formada por terrenos sedimentares da idade Cenozóica e do Plioceno, resultante do escoamento recente de um mar interno em consequência da elevação da cordilheira dos Andes na era Terciária. Estende-se do litoral Atlântico, onde é estreita formando arquipélagos, mangues e praias, e, conforme avança na direção do oeste vai se alargando até atingir os primeiros contrafortes dos Andes. Ao norte e ao sul é limitada por maciços cristalinos com afloramentos de terrenos arqueozóicos. Ao norte fica o planalto das Guianas com altitudes que atingem a mais de 3.000 metros acima do nível do mar, e ao sul fica o planalto sul Amazônico. À altitude da planície não vai além dos 300 metros em relação ao nível do mar. Ao norte é cortada pela linhado equador, tendo como clima dominante o equatorial super-úmido, com temperaturas médias entre 25° a 28° C, com pequenas oscilações e índice pluviométrico entre 1.500 à 2.500 mm. anuais. As massas de ar que circulam na região são formadas no Oceano Atlântico, acima da linha do Equador e se deslocam de Leste para Oeste: sendo estas as responsáveis pela distribuição das chuvas. Encontram-se na Amazônia a mais rica bacia hidrográfica da terra, tendo orio Amazonas como principal, em cujo conjunto com seus afluentes e subafluentes constitui-se na maior e mais intrincada e espetacular massa d'água fluvial do Mundo. Um denso manto florestal representado em milhares de espécies dos mais variados portes e da maior heterogenidade, cobre a imensa planície, impossibilitando a sua penetração, impedindo a passagem da própria luz solar.

Neste conjunto natural de impressionante beleza, grandiosidade e agressividade, leva a idéia de ser impossível a existência humana.

 

II-O HOMEM

A conquista do espaço amazônico pelo homem , entendido como penetração dos grandes cursos fluviais e estabelecimento de núcleos humanos que representem uma soberania permanente ligada a um empreendimento sócio-econômico , divide-se em dois períodos compostos de varias etapas. O primeiro ocorreu durante o processo de colonização portuguesa, c o segundo liga-se à exploração das héveas, a partir da segunda metade do século XIX.

O primeiro foi uma etapa da aventura colonial portuguesa em que nossos antepassados se defrontaram com o grande espaço brasileiro , e não desanimaramante a sua imensidão, procuraram vencê-lo assentando os fundamentos de uma sociedade na qual os portugueses, os silvícolos e os mamelucos que eles plasmaram, se não teve essa, condições de resistir a todos os imperativos telúricos, de qualquer maneira soube ajustar-se à realidade geográfica e estabelecer as fronteiras políticas do que hoje é a Amazônica Brasileira.

O avanço luso pela faixa litorânea, alcançou a foz do rio Amazonas, aonde estabeleceu o forte Presépio em 1616, sob o comando de Francisco Caldeira Castelo Branco, a partir do qual empreenderam os portugueses a conquista do vale do grande rio, levando de vencida ingleses, holandeses, franceses e seus aliados Aruans e Tupinambás, bem como outras aguerridas nações indígenas, em seu avanço na direção do Oeste através da calha do rio Amazonas, detendo a expansão espanhola em direção do Leste.

A atividade econômica que servia de incentivo a ação colonizadora, neste período consistia na coleta de especiarias nativas as "drogas do sertão", de madeiras, das variadissimas espécies e de aves e animais exóticos, destinados a exportação para Portugal.

Os padres e os militares que seguiam no rastro dos aventureiros, os primeiros assentavam os aldeiamentos neles agregando os indígenas os catequisando, com o objetivo de conquistar almas para Deus e terras para o el rei de Portugal. Os segundos, construíam praças fortificadas nos lugares considerados estratégicos para garantir a posse do espaço conquistado.

Em torno dos aldeiamentos e fortificações militares aglomeram-se colonos desenvolvendo atividades agrícolas e pecuárias, tendo por apoio o Programa Utilitário do Marques de Pombal, propiciando a fixação do homem à terra, representando evidentemente , a ofensiva vitoriosa sobre o espaço conquistado. O processo de evolução socio-econômico nestas duas etapas é lento, a primeira marcada pelo caráter de aventura tendo por suporte o extrativismo vegetal e a segunda a posse da terra concentrando-se a vida às atividades produtivas nas fazendas de criação de gado, nas de plantações de café, cana-de-açúcar, algodão e cacau, nas adjacências das aldeias, vilas e casas grandes. Em ambas têm destacada atuação os pioneiros, comerciantes, as companhias militares, os missionários pacificadores dos silvícolas, os sitiantes e fazendeiros organizadores da estrutura econômica, tendo como centro administrativo e comercial de exportação e importação, Santa Maria de Belém-do-Pará, o único núcleo urbano com expressivo aglomerado humano em toda vastidão Amazônica.

O segundo período é marcado pela força sedutora das héveas e o retorno ao extrativismo, com o conseqüente abandono da agricultura e da pecuária. A partir de 1827 intensifica-se a migração da região Nordeste para a região Norte, expressivos contingentes de nordestinos em maioria cearenses dirigiam-se para a Amazônia, adentrando-a pela foz do grande rio Amazonas, por este se expandindo na direção de seu alto curso, bem como nas dos seus afluentes, dilatando a fronteira legada pelos portugueses, conquistando e anexando o Acre ao Brasil.

O homem desta vez ainda não pode vencer a floresta, moldando-a aos seus interesses e às exigência de nova Civilização apesar de ter a sua disposição melhor técnica, mais eficientes instrumentos de trabalho e sistema de comunicação e transporte . O mesmo assim, não teve condições de se liberar dos imperativos telúricos, continuando a conquista do espaço amazônico a ser uma empresa marcada pelo pioneirismo, pelo caráter de aventura sujeita consequentemente, aos imprevistos, quanto aos êxitos ou aos fracassos comuns a empreendimentos com essa natureza.

  

FORMAÇÃO DA POPULAÇÃO AMAZÔNICA

Os homens que enfrentaram a floresta amazônica para extrair as matérias-primas que oferece, tanto vegetais, animais , bem como minerais, estes de seu sub-solo, ou para implantarem núcleos agropecuários ou industriais geradores dos bens e recursos econômicos regionais realizaram e realizam um empreendimento de gigantes que se destacam no quadro dos grupos de tipos antropo-sociais e de atividades de trabalho que compõem a sociedade brasileira. Isto porque em nenhuma outra região do país ocorreu ou ocorrem empreendimentos que exijam dos seus empreendedores tanto denodo, perseverança e sacrifício ante os obstáculos e dificuldades impostas pelo meio geográfico selvagem e agressivo que impiedosamente ceifam vidas.

O processo de formação da população que compõe a sociedade amazônica decorreu da missigenação dos grupos étnicos português, negro, amerindo e mameluco com o predomínio destes dois últimos, amalgamados ao longo das etapas sócio-econômicas da conquista, povoamento e colonização da Amazônia, desde os contatos iniciais dos europeus com a região operando-se a sua descoberta e a exploração do seu potencial na faina do extrativismo empreendido pelas bandeiras fluviais, as missões religiosas, os assentamentos de fortificações militares, os núcleos agrícolas e pecuários, consolidando a conquista da terra, até o retorno ao extrativismo através da corrida à floresta na exploração e produção das gomas elásticas .

Assim, no ambiente amazônico os grupos étnicos e as atividades econômicas originaram uma sociedade de estrutura sócio-cultural peculiar à região e sui-generis no quadro cultural brasileiro por sua heterogeneidade de tipos sócio-culturais resultantes da movimentação e sedimentação desses grupos em seus empreendimentos para a conquista e colonização do espaço geográfico. Neste encontram-se as populações indígenas se auto-isolando na tentativa de se defenderem e de preservarem a sua cultura milenar; A população branca predominante, descente dos portugueses e espanhóis; A população cabocla amazônica (mameluca) resultante da missigenação dos brancos com os indígenas, tendo por características a índole pacífica e contemplativa, a aparente displicência, o afeiçoamento à terra e a vida plácida sem ambições; A população cabocla nordestina (mameluca) de origem ética idêntica a amazônica, porém apresentando características inversas tendo o nordestino temperamento vibrante, audacioso, amante da aventura , sóbrio , ambicioso, tenaz vontade de vencer , enfrentando com galhardia as adversidades. Estes tipos humanos constituíam a então sociedade amazônica, na qual o seringal era a unidade mas expressiva deste colorido e complexo conjunto cultural.

Fonte: Abnael Machado

 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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