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Abnael Machado

Sandra: Pegando Carona em Luiz Vaz de Camões


Você clama que a musa nas cordas de sua lira exalte os heróis, da epopéia amazônica, a qual foi erigir o Estado de Rondônia. Aqueles por sua indômita coragem em suas bandeiras fluviais, não mais em caravelas e naus, mas sim embarcados em igarités movidos a velas quando lhes era favoráveis os ventos e a remo pela força de seus braços, não saiam da ocidental praia lusitana, e nem se aventuravam por mares nunca antes navegados. Saiam do litoral atlântico de Belém-do-Pará, se aventurando no caudal correntoso do portentoso Rio das aguerridas Amazonas, não passando além da Troprobana, mas sim de Tupinambara em busca de conquistarem o Rio Madeira desconhecido, arrostando perigos e guerras contra os Parintintim, Mura, Tora, Mundukuru, Caripunas, Iruri e outros, entre estas gentes estranhas edificarem por sua persistência e determinação, a cultura lusa cristã. Da longínqua São Paulo seus bandeirantes chegaram ao Guaporé extraindo riqueza do seu solo aurífero. Construindo cidades e fortificações militares consolidando o domínio lusitano no extremo ocidental de sua colônia, muito além das raias de Tordesilhas, pelo encontro no Rio Guaporé dos mamelucos paulistanos com os paroaras pelos lusos plasmados.

Hercúleo trabalho, se realiza a partir da segunda metade do século XIX, pelo demôdo dos caboclos nordestinos brasileiros, penetrando na pujante floresta equatorial amazônica, ambiente inóspito, confrontrando-se com a agressividade dos indígenas, suportando estoicamente as agruras lhes impostas pelas circunstâncias ambientais e a faina da extração do látex da árvore da seringueira, transformando-o em pélas de borracha, geradoras de riqueza, atraindo para os vales dos rios Madeira, Mamoré, Guaporé e seus afluentes o fluxo imigratório, os empresários nacionais e estrangeiros investindo vultuosos capitais na produção e exportação da borracha para os parques industriais, tendo esse produto elevada cotação de preço no mercado internacional.

Esta nova atividade lucrativa econômica propiciou as construções da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré e da Linha Telegráfica Estratégica Mato Grosso/Amazonas, em cujo longo de seus trajetos surgiram povoados, vilas e cidades. Este promissor surto de progresso foi estagnado pela crise econômica decorrente da desvalorização da borracha.

Os seringueiros os heróis anônimos dessa epopéia, foram relegados ao abandono no interior da floresta. Como a história se repete, o mesmo ocorreu com os ludibriados nordestinos, os “ Soldados da Borracha” recrutados para participarem da “Batalha da Borracha” na Amazônia, considerada teatro de guerra, na qual morreram mais combatentes (seringueiros) do que os soldados da FEB, na Itália. O escritor Manoara Samuel Benchimol em referência a esse episódio, assim expõe:

“Sem direito a toque de Silêncio
E enterro de herói:
- Sem nome
- Sem número
- Sem memória
- Sem monumento
- Na pira da tumba do
Soldado desconhecido”

Neste contexto do chamado segundo Ciclo Econômico da Borracha Fo criado o território Federal do Guaporé, os garimpeiros de diamantes exploram os rios Machado, Pimenta Bueno e Comemoração instalando núcleos de apoio em Vila Rondônia e Pimenta Bueno, é descoberto a cassiterita minério do estranho, nos vales dos rios Ji-paraná e Jamari, é construída a rodovia BR 29 – Brasília/Acre. O governo federal conclama os brasileiros das regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste a imigrarem para a Amazônia tendo em vista a ameaça de ser ocupada por estrangeiros. A convocação tinha por slogan “Integrar para não entregar”. Milhares de pessoas se deslocaram para região Norte, o primeiro ponto alcançado era Rondônia, desordenadamente se estabelecendo em reservas indígenas, seringais, reservas florestais e outras propriedades gerando o maior caos fundiário. Muitos foram os que pereceram vítimas das endemias e das disputas pela posse da terra. Dedicaram-se principalmente à agricultura, pecuária e agroindústria, fundaram dezenas de cidades, vilas e povoados nos vales do Ji-Paraná, do Jamari inicialmente, expandindo-se para o vale do Guaporé e do Roosevelt.
O crescimento demográfico e econômico que geraram, deram o suporte para a elevação do Território de Rondônia à categoria de Estado. Os protagonistas desta etapa de conquista da biota selvagem implantando a modernidade da civilização, os que sucumbiram, assim como os seringueiros, os construtores da Madeira-Mamoré, da Linha Telegráfica e do eixo rodoviário (BR 364), estão relegado ao limbo obscuro do esquecimento.

Sandra nem a Musa invocada para exaltar os seus heróicos feitos, não pode lhe atender, pois está surda e muda sua lira despedaçada, pela decepção com a vulgaridade, com a conduta antiética dos gestores administrativos, políticos e empresariais, sem compromisso com o social, superpondo seus interesses pessoais sobre os de promoção do bem estar da comunidade em geral, não sendo o estado social que deveria emergir da aglutinação dos ideais e do empenho de alcançá-los, pelos protagonistas de cada geração, nestes trezentos e setenta e dois anos de caminhada histórica. Clamemos que a ira de Zeus aniquile os Vies corruptos dilapidadores dos bens públicos e que novos valores se levantem.

Assim sua Musa tendo restabelecido os sentidos, possa atender o seu apelo, e cantar as histórias dos nossos heróis desconhecidos, não só os da Madeira-Mamoré, mas todos demais participantes na construção do nosso Estado de Rondônia.

ABNAEL MACHADO DE LIMA
Membro Fundador da Academia de Letras de Rondônia

 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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