Quarta-feira, 21 de outubro de 2015 - 05h03
Destinos Cruzados
Rememorar como episódio integrante dos cem anos de História de Porto Velho sobre a cientista alemã Drª Emília Snethiage quando estudante na Universidade de Cambridge na Inglaterra conheceu a brasileira Diana, paraense da cidade de Cametá, no Rio Tocantins, filha de um rico empresário, proprietário de extensos castanhais (castanha brasileira).
Tornaram-se amigas, residindo no mesmo apartamento, Diana ensinou português a Emília e com essa aprendeu alemão. Contava-lhe como era a floresta equatorial constituída de árvores gigantescas entrelaçadas de lianas, produtoras de frutas alimentícias, óleos, látex, farmacológicos e outros, por palmeiras de magnificas belezas, por campos de diversos gramíneas, formando clareiras na selva. Nas margens dos rios formavam-se as matas de igapós periodicamente alagadas, os pântanos e lagoas com vegetação aquática florida de todas as cores, destacando-se a Vitória Régia, a qual muda de cores no decorrer das horas do dia.
Esta encantadora e ao mesmo tempo misteriosa selva, biota habitat de variada fauna composta por mamíferos, repteis, ofídios, insetos, aves de variados tipos e coloridos, inclusive do homem, os nativos indígenas.
Descrevia os caudalosos rios de águas verdes uns, outros de águas amareladas, todos piscosos, abundantes em quilônios, em gigantescos ofídios cobras grandes (sucuris) e audaciosos jacarés, alguns com mais de seis metros.
Obstaculizando seus cursos surgem espetaculares cachoeiras e corredeiras.
A Emília ficava deslumbrada, entusiasmada com o que ouvia, incluindo as lendas e os mitos relacionados à floresta, aos rios e aos seus habitantes.
Concluídos seus respectivos cursos superiores, Emília regressou à Alemanha, e Diana para o Brasil na região tocantina, nos castanhais de seus pais. Mantendo correspondência com a amiga.
A Drª Emília Snethiage ornitóloga especialista em zoologia avifaunistica, havia se dedicado a análise dos relatórios e das pesquisas realizados por cientistas sobre as aves da Amazônia. Veio ao Brasil, para Belém-do-Pará, a convite de Emílio Goeldi, naturalista suíço, diretor do Museu Paraense, o qual lhe encarregou de organizar um “Catálogo das aves da Amazônia”.
Iniciou seus trabalhos examinando as coleções do Dr. Emílio Goeldi e de outros pesquisadores e colecionadores ingleses, franceses e austríacos. Na coleção do professor Johan Natterer encontrou um pequenino pássaro por ele descoberto e classificado, encontrado no Rio Madeira nos arredores da cidade de Borba, empolgando os meios científicos por se tratar de verdadeiro Uirapuru. Resolveu percorrer a Amazônia para descobrir o modelo ornitológico comprovando o descoberto pelo professor Johan Natterer.
Drª Emília conta que em Tocantins ao chegar em Cametá, tomou conhecimento da tragédia ocorrida com sua dileta amiga, que tanto esperava reencontra-la, os índios haviam trucidado todos os membros de sua família, porém seu corpo não foi encontrado, deduzindo-se que tinha sido levada prisioneira. Ela ficou emocionalmente abalada. Mesmo assim deu continuidade as suas pesquisas. Em uma de suas excursões, perdeu-se na floresta. Após alguns dias de exaustivas peregrinações cansada e faminta, desiludida de salvação, sentou-se junto ao tronco de uma árvore, nele se recostando aguardando a morte por inanição fechou os olhos sonolentos, quando surpresa ouviu o canto de um galo. Pensou estar delirando, mas o canto se repetiu, levantou-se seguindo em sua direção, deparando-se com uma taba indígena com várias ocas. Não acreditava no que estava vendo, entre as índias que curiosas e desconfiadas lhe miravam, esta Diana com seus longos cabelos louros, despida da cintura para cima, usando uma tanga. Ao lhe reconhecer destacou-se do grupo, emocionadas rindo e chorando se abraçaram. Diana conduziu-a acompanhada por um cortejo de índias e crianças para sua habitação, uma ampla e bem cuidada maloca.
Apresentou-a ao seu marido tuxaua da tribo dos Gaviões e seus cinco filhos. Contou-lhe que ao regressar ao Brasil foi residir na fazenda de seus pais próxima a cidade de Cametá, no Rio Tocantins, casou com jovem proprietário de castanhais. Um dos seus coletores de castanha os preveniu de que havia um índio apaixonado por mim, querendo me raptar. Tomamos todas as precauções, reforçamos o número dos homens de segurança.
Numa tarde descíamos o Rio Tocantins em uma lancha juntamente com meus pais, irmãos e empregados com destino à fazenda desses, ao chegarmos em uma cachoeira, na qual obrigatoriamente tínhamos de desembarcar, a fim de facilitar a travessia da embarcação puxada na sirga, fomos atacados por todos os lados, pelos índios que estavam emboscados, me prenderam levando para sua retaguarda, chacinaram todos os nossos familiares e empregados, o barco naufragou, arrebentando-se nos rochedos.
Quando eles se certificaram que não havia sobreviventes iniciaram o retorno para a taba, longa caminhada pela floresta. Fui isolada numa oca sob permanente vigilância e os cuidados de uma velha índia, quanto alimentação, asseio (banho de rio), aprendizagem do idioma e preparativo para o casamento com o raptor, filho do tuxaua. Fui submetida a dolorosa provação, gradativamente me resignando a minha desventura.
Drª Emília passou vários meses morando com os indígenas, ela não sabe precisar quantos, por não dispor de calendário. O Tuxaua a pedido de sua amiga Diana mandou para as proximidades de Cametá para qual se dirigiu. Ficou sabendo que após dois meses de buscas na floresta, foi declarada desaparecida, ocorrência publicada nos jornais do Pará e da Alemanha.
Regressando à Belém, retornou seus trabalhos, voltado ao Rio Tocantins, agora acompanha de um guia Manoel Cavalcante Umbuzeiro e seus auxiliares designados pelo Museu Paraense. Subiu o Rio Xingu e desse por terra percorrendo mais de trezentos quilômetros, chegaram ao Rio Tapajós, deste subindo o Rio Amazonas chegaram ao Rio Madeira o percorrendo de sua foz até Santo Antônio.
Escolheu Porto Velho como base de suas explorações hospedou-se no Hotel Brasil. Realizou suas pesquisas no espaço entre Porto velho e Borba. Com maior intensidade na floresta no entorno de Borba, onde esperava encontrar o verdadeiro uirapuru. Estando em plena atividade profissional provavelmente, próxima de redescobrir o famoso pássaro, foi encontrada morta no seu apartamento no Hotel Brasil. O médico Antônio Pimenta Magalhães, diretor do hospital da Candelária atestou como “causa mortis”, colapso, ocorrido no mês de agosto de 1929, faziam 29 anos trabalhando no Museu Paraense, destacando-se entre outras produções de projeção internacionais as seguintes obras:
1 – Catálogo das “Aves da Amazônia”;
2 – Roteiros e Informações dos espaços percorridos;
3 – Coleta e registro de 95% das classificações das Aves Brasileiras;
4 – Nature and Main Easter Pará, Brazil (livro);
5 – In The Geographic Review (livro);
6 – Journal of Ornithology (livro);
7 – Uber Vogal Xingu – Tapajós (livro).
É patronesse de uma das cadeiras da Academia de Letras de Rondônia.
Foi sepultada no Cemitério dos Inocentes, em Porto Velho. Porém por relaxamento, falta de sensibilidade cultural, é desconhecido o local de sua sepultura, na qual repousam os seus restos mortais.
Drª Emília Snethiage é uma personalidade de História de Rondônia e da Amazônia, pelo que foi e por tudo que fez prestamos-lhe reverenciosas homenagens.
Abnael Machado de Lima,
1. – informações com maiores detalhes, encontram-se no livro “Os Igaraunas” de autoria do escritor Raimundo Morais
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