Sexta-feira, 28 de abril de 2017 - 12h07
A consulta é uma das funções mais básicas da medicina; e, até pouco tempo, inexplicavelmente estava no limbo dos poucos atos médicos não regulamentados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), autarquia com atribuição legal de normatizar e fiscalizar com exclusividade a atividade no Brasil.
Preenchendo a lacuna, o CFM baixou a Resolução 1.958/2010, definindo a consulta médica como conduta que: “compreende a anamnese, o exame físico e a elaboração de hipóteses ou conclusões diagnósticas, solicitação de exames complementares, quando necessários, e prescrição terapêutica como ato médico completo e que pode ser concluído ou não em um único momento”.
Da definição supratranscrita, se infere que, o ato da consulta não se esgota, necessariamente, no primeiro atendimento. Ele poderá se prolongar no tempo; quando, por exemplo, para auferição diagnóstica, houver necessidade de exames complementares que não possam ser realizados e/ou analisados no primeiro momento.
Nesses casos, o ato se estenderá até a ultimação e avaliação dos sobreditos exames, pois, o diagnóstico provisório ou definitivo é, em regra, parte integrante da consulta. Essa protração, no entanto, não poderá gerar cobrança adicional de honorários.
Lembremos que há casos em que o facultativo, ao verificar que se trata de quadro nosológico que foge ao seu domínio, encaminha o paciente ao especialista. Aqui, a consulta se esgota sem diagnóstico definido, exceção justificada por questões técnicas.
Assunto que durante muitos anos gerou interpretações de toda ordem, dizia respeito ao prazo para retorno. Rezava a “lenda” que esse tempo era de quinze dias; sendo que, após esse período, o médico poderia cobrar como se fosse nova consulta.
Na verdade, essa praxe que imperou (e, ainda ocorre) durante anos nos corredores dos nosocômios, clínicas e consultórios médicos, sempre careceu de base ética e legal, pois, não é razoável limitar no tempo um ato complexo que, para se esgotar, depende de um sem número de variantes. Exemplo clássico ocorre quando o paciente encontra dificuldade em agendar determinado exame complementar, que, pela complexidade e custo, tem oferta reduzida, impossibilitando sua realização imediata.
Referindo-se a esse tema, a mencionada resolução, em seu artigo 3º, dispõe, que: “Nas doenças que requeiram tratamentos prolongados com reavaliações e até modificações terapêuticas, as respectivas consultas poderão, a critério do médico assistente, ser cobradas”.
Entendemos não ser razoável deixar ao isolado alvedrio do facultativo tema dos mais melindrosos, com reflexos, inclusive, financeiros, pois questões de ordem objetivas - que vão além das reflexões técnicas - podem interferir no tempo gasto para o tratamento (como no exemplo acima, da dificuldade em realizar exames).
Por outro norte, há casos em que, no retorno, o paciente apresenta alterações e sintomas de outra doença, exigindo do médico nova anamnese, exame físico, hipóteses ou conclusão diagnósticas e prescrição terapêutica.
Nesses casos, esse procedimento poderá ser considerado uma nova consulta e, por isso, ser remunerado, independentemente do primeiro atendimento que gerou o retorno, pois se tratam de atos médicos distintos. Nesse particular, diferentemente da questão anterior, entendemos que só o profissional assistente poderá decidir.
Muito além das orientações técnicas, essas decisões devem ser tomadas sob a luz da boa-fé e dos postulados deontológicos da medicina, sob pena de infirmar a confiança que, necessariamente, deve instruir a relação médico-paciente e, pior ainda, macular a mais nobre das profissões.
Cândido Ocampo, advogado, membro da Sociedade Brasileira de Direito Médico e Bioética (Anadem); candidoofernandes@bol.com.br; whatsApp: (69) 9-9996-0039
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