Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Dom Moacyr

2011: diálogo e bem comum!


 
Iniciamos 2011 celebrando ainda as alegrias do Natal do Senhor. Nesse itinerário nos aproximamos do mistério do nascimento de Jesus e aprendemos a acolher as pessoas indistintamente. Com a festa da Sagrada Família valorizamos a vida em comunidade e percebemos a importância do amor e da família. Ao contemplar Maria, a Mãe de Deus, no primeiro dia do novo ano, elevamos nosso pensamento para o dia mundial da Paz, pedindo sua compreensão para vivenciar todos os acontecimentos, meditando-os em nosso coração. E apesar da tradição popular celebrar a Festa dos Reis dia 06 de janeiro, somos hoje convidados a participar da Solenidade da Epifania. Epifania é uma palavra grega que significa “manifestação”; na pessoa dos Reis Magos, o Menino-Deus se revelou a todas as nações que, no futuro, seriam iluminadas pela luz da Fé. Portanto, a Liturgia comemora hoje a Adoração dos Reis Magos vindos do Oriente ao Menino Jesus e domingo próximo, o Batismo de Jesus . Em síntese, podemos afirmar que a Epifania, ou seja, a manifestação do Verbo Encarnado, não pode ser considerada desligada da adoração que Lhe prestaram os Reis do Oriente. Este é o reconhecimento público da divindade do Menino Jesus unida à Sua humanidade.

A primeira leitura da solenidade da Epifania (Is 60,1-6) nos coloca em sintonia com os símbolos da celebração de hoje: a luz que guia os povos a Jerusalém será como a da estrela que guia os magos do evangelho, os tesouros trazidos à cidade santa do Oriente e do Ocidente se cumpriram nos presentes que os magos colocaram aos pés do menino recém-nascido e de sua mãe; a salvação será universal quando os judeus e pagãos, todos juntos, adorarem a Deus na pessoa de Jesus recém-nascido em Belém.

Em sua Mensagem para o 44o Dia Mundial da Paz, o Papa Bento XVI, fala da “Liberdade religiosa, caminho para a paz” e afirma que “o patrimônio de princípios e valores expressos por uma religiosidade autêntica é uma riqueza para os povos e respectivas índoles: fala diretamente à consciência e à razão dos homens e mulheres, lembra o imperativo da conversão moral, motiva para aperfeiçoar a prática das virtudes e aproximar-se amistosamente um do outro sob o signo da fraternidade, como membros da grande família humana”.

Somos, dessa maneira, solicitados pela nossa própria fé em Deus, Pai do Senhor Jesus Cristo, a viver como irmãos que se encontram na Igreja e colaboram para a edificação de um mundo, onde as pessoas e os povos “não mais praticarão o mal nem a destruição, porque o conhecimento do Senhor encherá a terra, como as águas enchem o leito do mar” (Is 11,9).

Na ultima assembléia arquidiocesana, avaliamos a caminhada conciliar da Igreja Particular de Porto Velho, constatando que devemos avançar na dimensão ecumênica, pois o diálogo entre os membros de diversas religiões constitui um instrumento importante para colaborar com todas as comunidades religiosas para o bem comum.

Para José M. Vigil, o grande problema ou obstáculo para as religiões se falarem, dialogarem, se unirem não é externo, mas sim interno. As religiões têm vivido a sua história toda sobre a convicção de serem, cada uma, a única, a verdadeira, a universal, a perfeita, a que sabe tudo e não tem nada a aprender de ninguém (Não todas da mesma maneira, obviamente. As religiões não são iguais nem dizem a mesma coisa, como o igualitarismo pretenderia).

Em sua entrevista a IHU On-Line, Vigil que faz parte da Associação Ecumênica de Teólogos da América Latina, e vai participar em fevereiro, do Fórum Mundial de Teologia e Libertação, dentro do Fórum Social Mundial (Oficina Religiões e Paz), constata que “as religiões não dialogam; coexistem simplesmente". Segundo ele, “não haverá paz entre as religiões, e no mundo, enquanto não tivermos uma visão pluralista”. É claro, sabemos todos que a paz não é só a ausência de guerra. A paz não é um conceito negativo, mas extremamente positivo. Poderíamos dizer que a paz seria o shalom (judeu), ou o shalam (árabe), que não são conceitos negativos. Pelo contrário, são conceitos de plenitude: a paz é o resumo de todos os bens salvíficos.

Isso também se reflete na teologia do pluralismo religioso, que teria como funções ou tarefas: uma primeira, negativa, de desconstrução, de desmonte dos obstáculos, dos preconceitos geradores de conflitos, dos axiomas superados que hoje viraram daninhos, inclusive no mundo globalizado atual; e uma segunda tarefa, positiva, a de reconstrução, o encontro prazeroso das convergências religiosas, da muita riqueza comum, das inesgotáveis peculiaridades que cada religião tem como lampejos únicos da luz única e eterna do Mistério, a função mesma de "religação" por cima da imensa "diversidade do sagrado".

E num período de crise ambiental, em que a “natureza geme as dores de parto”, como propõe a Campanha da Fraternidade de 2011, as religiões podem contribuir para a defesa e proteção da Criação, tendo em vista "o bem comum da humanidade e a Vida no planeta". Já não podemos ter só o objetivo da humanidade, como o antropocentrismo religioso nos educou. O bem comum da humanidade ficaria absolutamente curto e mal-entendido se deixasse de buscar o bem comum da vida no planeta.

Nesta última década (a consciência da emergência da ameaça climática não tem dez anos), a situação mudou tanto que as prioridades se deslocaram todas. Todos os serviços tradicionalmente feitos à humanidade ficaram curtos diante da urgência planetária. Se "a caridade começa pela própria pessoa", hoje a caridade realista deveria começar pelo planeta: todos os nossos objetivos estão ameaçados de morte, ante o que está vindo. Em rigor, estamos caminhando para a extinção da nossa espécie. Se não mudarmos – e já tem quem duvide que seja possível mudar a tempo – o sistema atual de vida (economia, produção, consumo, contaminação ambiental, destruição da ecologia...), estamos nos aproximando a cada dia do nosso fim, como afirma o teólogo Vigil.

Nessa conjuntura, como é possível que as religiões ainda não tenham pedido perdão por terem permanecido cegas ao ecológico? Como não levantaram a sua voz profética contra os que se opõem egoistamente às medidas urgentes para o salvamento do planeta e da humanidade? E como ainda não convocaram um concílio verdadeiramente “ecumênico” (de todas as religiões que habitam a ecumene, a "casa habitada") para se unirem e se concentrarem na única prioridade verdadeiramente prioritária?

A CF 2011 nos convoca a fazer algo e dar o nosso contributo, pois, ele não só é válido, mas necessário. Como membros da Igreja em sentido amplo comungamos de um ponto fundamental do credo cristão de que o mundo que habitamos resulta da ação criadora e amorosa de Deus. Até algum tempo atrás, era absolutamente comum dizer ou ouvir, também na igreja, que o homem é o centro e o sentido de toda a criação, pois ele teria a função de “dominar e sujeitar” o mundo criado (Gn 1,26-28). Sua tarefa fundamental deve ser a de “cultivar e guardar” (Gn 2,15).

Pode-se aqui falar do “princípio responsabilidade” como elemento fundamental da ética(TB 215-219). O cuidado com o ambiente deve, hoje, incluir também as gerações futuras. Mas o próprio direcionamento escatológico da fé cristã aponta para a consumação final da história e da criação como obra redentora de Deus. Possam nossas ações contribuir nesse novo ano para a construção deste mundo novo, que há de ser construído com o empenho renovado a cada dia, e que pode ser vislumbrado na bela imagem bíblica oferecida pela expressão “novos céus e nova terra” (Ap 21,1)

Fonte:  Arquidiocese


 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoDomingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Pentecostes: Comunidades de rosto humano!

Pentecostes: Comunidades de rosto humano!

Palavra de Dom Moacyr Grechi – Arcebispo Emérito de Porto Velho

Páscoa do povo brasileiro - Por Dom Moacyr Grechi

Páscoa do povo brasileiro - Por Dom Moacyr Grechi

Hoje reafirmamos a nossa fé na ressurreição de Cristo; somos uma Igreja Pascal. Na oração do Credo, proclamamos a ressurreição dos mortos e a vida ete

Verdade libertadora! Por Dom Moacyr Grechi

Verdade libertadora! Por Dom Moacyr Grechi

  A Igreja, convocada a fortalecer o povo de Deus na atual conjuntura, é chamada a estar ao lado daqueles “que perderam a esperança e a confiança no B

Lugar seguro para viver! - Por Dom Moacyr Grechi

Lugar seguro para viver! - Por Dom Moacyr Grechi

  Diante do aumento da violência agrária que atinge trabalhadores rurais, indígenas, ribeirinhos, quilombolas, pescadores artesanais, defensores de di

Gente de Opinião Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)