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Gente de Opinião

Dom Moacyr

A Via Sacra dos doentes


Estamos iniciando a Semana Santa. No Domingo de Ramos fazemos memória da entrada do Senhor Jesus em Jerusalém, participando da procissão ou entrada solene na Missa. Com a leitura da Paixão, perfazemos os passos de Jesus, adentrando na sua paixão e morte e abrindo nossos olhos para reconhecer no crucificado o Filho de Deus.

O Tríduo Pascal da Paixão e Ressurreição do Senhor começa na Quinta-Feira Santa, com a Missa vespertina da Ceia do Senhor, possui o seu centro na Vigília Pascal e encerra-se com as Vésperas do Domingo da Ressurreição. É o ápice do ano litúrgico porque celebra a morte e ressurreição do Senhor, “quando Cristo realizou a obra da redenção humana e da perfeita glorificação de Deus pelo seu mistério pascal, quando morrendo destruiu a nossa morte e ressuscitando renovou a vida” (GL).

Somos convidados nesta santa semana apercorrer com Jesus o caminho que leva ao Calvário, a entrarno Sinédrio, continuar com Jesus até o calvário e voltar nosso olhar para o Crucificado, deixando que o Espírito por ele entregue na cruz nos faça exclamar: "De fato, esse homem era mesmo Filho de Deus!" (Mc 15,39).

Nesta semana, estamos vivenciando a dura via sacra dos doentes e dos trabalhadores, perfazendo seus passos em busca de atendimento digno, em sua luta pela saúde e pela justiça.

A Campanha da Fraternidade de 2012 com o tema “Fraternidade e saúde pública” tem repercutido bem na sociedade. O desafio presente é fazer com que a reflexão desta temática resulte em real melhoria do sistema público de saúde no Brasil beneficiando os pobres, que dependem integralmente do Sistema Único de Saúde (SUS) como assegura o artigo 196 da Constituição: “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.”

O Brasil conseguiu garantir um sistema de atendimento de saúde considerado o melhor do mundo em termos de proposta legal. Esta estrutura, conhecida como política pública de saúde foi construída pelos princípios e diretrizes da Constituição Federal de 1988 e pela Lei Orgânica da Saúde de 1990. No entanto, na prática do SUS evidenciam-se alguns problemas. Estes são colocados num leque amplo e variado, destacando-se três entre eles, conforme uma pesquisa do IPEA realizada em 2010: falta de médicos, demora no atendimento e demora para conseguir uma consulta com especialistas.

Coloca-se como uma questão de fundo, e talvez a mais importante, o financiamento do SUS. O Brasil é um dos países que menos investe em saúde publica - 385 dólares per capita/ano, no total, cerca de 3,7% do PIB. Alguns países latino-americanos, com um PIB menor que o do Brasil, têm um investimento mais expressivo em saúde pública per capita: Argentina, 757 dólares; Chile, 479 dólares; Costa Rica, 708 dólares; Uruguai, 619 dólares. A média de investimento em países onde o sistema tem certa eficácia está na faixa de 2.530 dólares per capita/ano. Dados do IBGE revelam que, em 2007, do total gasto com saúde, as famílias entraram com 58,4%, enquanto o setor público gastou 41,6%. Em alguns países acontece o inverso: o investimento público é de 70%, enquanto as famílias investem 30%.

O caso do Brasil indica que, mesmo arcando com uma alta carga tributária, as famílias, diante da realidade da doença, assumem a maioria das despesas. Quando a família é de baixa renda, a situação se agrava, pois não tem como assumir este custo.

No Brasil existe pouco investimento em saúde em termos financeiros e em termos de preparo humano, contrapondo-se à proposta original do SUS. Tem diminuído o aporte federal e aumentado o empenho dos estados e municípios. Ao mesmo tempo, assiste-se a uma proliferação de planos de saúde privados, acessíveis a uma quarta parte da população (24,43 % da população), o que contribui para configurar a saúde como um “bem de mercado”.

Há preocupação também quanto à destinação e aplicação dos recursos voltados à saúde pública. Recentemente a presidente Dilma efetivou um corte de 5,4 bilhões de reais no orçamento da saúde, indo na contramão da campanha de organizações da sociedade civil exigindo investimento de 10% do PIB no sistema de saúde pública.

A aprovação da Emenda Constitucional 29 (EC 29), no final de 2011, foi positiva por definir o conceito de ações e serviços em saúde, evitando assim as definições oportunistas de gasto em saúde, conhecidas como “maquiagem dos gastos com saúde”. Por outro lado, a EC 29 não deixa explícita a possibilidade de maior responsabilização dos gestores pelo descumprimento e não define a incorporação de novos recursos para investir em saúde pública.

O acesso à saúde pública é garantido como direito universal e assegurado na Constituição Federal, o que compreende o processo contínuo de humanização do atendimento desde as unidades básicas até os atendimentos mais complexos.

Esperamos que os debates provocados pela Campanha da Fraternidade contribuam para que a saúde pública tenha os recursos necessários à sua plena execução, bem como haja melhoria na gestão e no controle social para sua eficaz aplicação (Análise de Conjuntura da CNBB, 03/2012)

Já é tradição em Porto Velho, a Via Sacra durante a Procissão do Senhor Morto na Sexta Feira Santa. Queremos permanecer, nesta Via Sacra, solidários com Jesus e unidos às comunidades e a todos as pessoas que sofrem e lutam pela vida, cremos “em Jesus Cristo que padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado, desceu aos infernos”. Cremos que a morte é a passagem necessária para a plenitude da vida. A última palavra de Jesus para nós não é morte, pois ele entra na morte para vencê-la.

A paixão de Cristo representa a máxima expressão do sofrimento humano, que, nesta entrega do Redentor, recebe uma significação nova e profunda, ao ser associado ao amor. A cruz de Cristo tornou-se uma fonte da qual brotam rios de água viva. Nela e por ela, “Deus amou tanto o mundo que deu o Seu Filho unigênito, para que todo aquele que n’Ele crê, não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16).

Neste tempo particular de Deus, a Semana Santa, deixemos a força pascal do Cristo atingir nossos o coração, iluminar nossas mentes, questionar as contradições humanas. Na Semana Santa, durante oito dias, celebrando o mistério da morte e ressurreição do Senhor, aprendemos em que consiste a liturgia do Filho de Deus que disse: Eu vim para servir e não para ser servido (Mt 20,28) e que afirmou: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos”(Jo 15,13).  E esse jeito de Jesus entender a vida como serviço, nós lembramos e celebramos na liturgia.

Hoje, Dia Nacional da Coleta da Solidariedade; é o Domingo da Paixão de Jesus, do seu sofrimento assumido como expressão de compaixão pela multidão de famintos e da nossa compaixão com todos os trabalhadores e enfermos.

Pela força da cruz estamos reunidos. A cruz lembra-nos o amor e a entrega radical de Jesus para fazer a vontade do Pai e realizar a experiência do Reino de fraternidade e justiça. Dessa entrega de Jesus nasce a Igreja.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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